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JUCA KFOURI
O gato. E os ratos
É surpreendente que uma entidade tão rica como a CBF não tenha como fiscalizar a autenticidade das certidões
O CASO do jogador Carlos Alberto, do Figueirense, é
exemplar. E conhecido.
Como ele, tantos outros gatos já
foram descobertos, muitos mais não
foram, e sabe-se lá quantos ainda serão na África brasileira.
Parece pacífico que o atleta deva
ser punido e que o clube nada tenha
a ver com a falsificação.
E que, por mais comovente e convincente que tenha sido a confissão
de Carlos Alberto, não será com um
passar de mão em sua cabeça que a
questão será resolvida, mesmo que
esteja certo ao dizer que o futebol
pode tê-lo impedido de virar ladrão
e foi o meio que encontrou para tirar
sua família da miséria e da fome.
Seria grave precedente.
Até porque, mesmo que sem querer, ele prejudicou alguém que poderia estar em igual situação e que
perdeu a vaga na seleção sub-20.
A tentação de paternalizar o episódio é enorme, e é daqueles que um
repórter sente orgulho de ter feito
por um lado e profunda pena de outro, situação vivida por Sérgio Rangel, desta Folha.
Nada surpreende no caso, a não
ser, talvez, a inexistência até da cidade que aparece no documento
como sendo a do nascimento do jogador. O que pode revelar que a
adulteração não foi feita, como é
regra, por falsificadores profissionais, cúmplices de empresários e
procuradores de um sem-número
de garotos que tentam a sorte no
futebol, um dos únicos meios de
ascensão social neste país.
Porque só há gatos onde há ratos
nos porões do futebol, composto
por clubes que raramente comprovam a autenticidade da documentação que lhe é apresentada e que
mais raramente ainda se preocupam em educar os garotos que recebem, meio mais eficaz para ensiná-los a se defender dos espertalhões e para prepará-los como verdadeiros cidadãos.
Dirão, é claro, que a culpa é da
Lei Pelé, como se antes os gatos
não proliferassem e a falta de preocupação em educar não fosse a
norma, com as exceções de praxe.
Mas salta aos olhos que a rica
CBF, que se gaba de ter os melhores contratos de patrocínio do futebol mundial, mais uma vez tenha
um jogador que defendeu uma de
suas seleções envolvido em tal trapalhada, manchando, de maneira
irreversível, o título mundial sub-20 obtido em 2002.
Que a Fifa deveria puni-la é ainda mais óbvio do que a necessidade
de punir Carlos Alberto.
Só que tem mais: será que a moderna, a competente, a informatizada CBF não tem como fiscalizar
a documentação, ao menos, dos jogadores chamados para servi-la?
Alguém que note, por exemplo,
que não existe nenhum município
de São Matheus no Estado do Rio
de Janeiro, sede da entidade.
Lembremos duas coisinhas.
O Figueirense não teve benefício
com a fraude; ao contrário, tem sob
contrato um profissional cinco
anos mais velho do que imaginava.
Já a CBF se beneficiou, e muito.
Pôs um adulto de 25 anos para enfrentar meninos de menos de 20.
E o que diz a CBF?
Só evasivas e cochichos.
Provavelmente se eximirá de
responsabilidade, dirá que nada fez
e nada sabe, como habitual.
A ponto de, noutro dia mesmo,
por sinal, ter publicado nota oficial
para dizer que não é de sua responsabilidade, ao contrário do que diz
o Estatuto do Torcedor, a publicação das súmulas do Campeonato
Brasileiro, que ela organiza. Com o
que quis se livrar da conivência
com os atrasos das federações estaduais, direito que a lei não lhe dá.
Como a Justiça, registre-se, já resolveu em casos assemelhados.
Neste balaio de caranguejos, há
gatos, ratos e percevejos.
Viva a Copa-2014 no Brasil!
A África somos nós.
blogdojuca@uol.com.br
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