São Paulo, quarta, 13 de janeiro de 1999

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A exclusividade do técnico para a seleção

ALBERTO HELENA JR.
da Equipe de Articulistas

O nosso futebol, aquele de primeiro time, de Copa do Mundo, é uma diáspora. Estamos espalhados por esse mundão afora, e só o trabalho de colher imagens de nossos craques diante da TV, sem sair de casa, a cada rodada, já justificaria um técnico exclusivo para a seleção.
Pegue-se um domingo desses, em que estamos de férias à espera do Rio-São Paulo, um torneio esquenta-motores. Se o amigo dispuser dos serviços das TVs por assinatura, acabará varando a madrugada, desde a hora do almoço, para assistir tudo o que nos oferecem. E tudo, ou quase tudo, de interesse vital para um treinador da seleção brasileira que queira estar realmente ligado em seu tempo.
Mas só isso não basta. É preciso que o sujeito saia por aí, trocando idéias com outros treinadores de nível internacional, acompanhando de perto os treinamentos deste ou daquele futuro convocável, colhendo informações de cocheira sobre o craque que surge, indo aos estádios, que é onde se vê com maior amplitude os esquemas táticos e a movimentação dos jogadores quando não estão de posse da bola.
Enfim, se o técnico quiser mesmo ser um profissional moderno, dedicado, curioso e eficiente, tem muito trabalho pela frente. Tanto que dividi-lo com a preparação de um time de ponta seria mais do que uma imprudência. Seria burrice.
E Luxemburgo pode ser chamado de muita coisa, menos de burro, né?

Pelo que eu me lembre, o último treinador da seleção brasileira que acumulava a direção de um clube e da seleção foi Cláudio Coutinho, prática herdada de Zagallo e muito comum nos anos 40 e 50, com esta ou aquela exceção.
Coutinho tocava o Flamengo -aquele mesmo Flamengo que viria a ser campeão do mundo, sob o comando de Carpegiani- , além da seleção, logo depois da Copa de 78, quando Giulite Coutinho assumiu a recém- criada CBF, até então CBD. E Giulite queria porque queria cumprir a pauta que a crônica esportiva exigia para moralizar e organizar o futebol brasileiro, conduzido ao caos pelo ex-presidente, o almirante Heleno Nunes, aquele da frase célebre: "Onde a Arena vai mal, um time no Nacional".
Um dos itens era o que falava da necessidade de termos um técnico exclusivo na seleção. Cláudio Coutinho, o profissional de futebol mais inteligente e bem preparado com quem cruzei nestas últimas três décadas (Saldanha era cintilante, mas despreparado emocionalmente), concordava com a tese, mas, na prática, não podia assumi- la. E tinha lá suas razões. Afinal, sofrera a mais intensa e cruel campanha da imprensa quando assumiu no lugar de Brandão, durante as eliminatórias para a Copa da Argentina, sob o forte argumento de que, embora tivesse sido treinador da seleção do Peru e do Olympique de Marselha, jamais havia dirigido um time brasileiro.
"Se eu não for campeão com um time, não vão me deixar em paz. E, com o Flamengo, vou ser campeão do mundo, cara. Depois, fico só na seleção." Foi campeão carioca, brasileiro e da Libertadores, mas a seleção escapou-lhe das mãos muito antes, em nome da coerência.
E a coerência teve um nome: Telê. É preciso ir além?
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Alberto Helena Jr. escreve aos domingos, às segundas e às quartas-feiras



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