São Paulo, sexta, 13 de fevereiro de 1998

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OLIMPÍADA
Canadense cujo antidoping apontou maconha recorre e tem sucesso; especialista duvida de versão do atleta
Acusado de doping recupera ouro

e das agências internacionais

O canadense Ross Rebagliati recuperou ontem a medalha de ouro do snowboarding gigante, conquistada no domingo em disputa dos Jogos Olímpicos de Inverno, realizados em Nagano (Japão).
A medalha lhe havia sido retirada pelo COI (Comitê Olímpico Internacional) anteontem, após teste antidoping do competidor dar positivo para maconha.
Foram encontradas 17,8 nanogramas de maconha por mililitro de urina do atleta. O limite permitido pela FIS (Federação Internacional de Esqui) é de 15 nanogramas por mililitro.
O nanograma é a milésima parte do micrograma, que é a milésima parte do miligrama, que é a milésima parte do grama.
Ontem, o Tribunal Arbitral de Esportes, após apelação de Rebagliati, afirmou que o COI não tem competência para julgar o assunto, acrescentando ainda que não há nenhum acordo formal entre o COI e a FIS relativo à utilização de maconha.
A medalha do canadense foi a primeira de ouro conquistada no snowboarding, modalidade que leva fama de "rebelde" e que é estreante em Jogos Olímpicos.
Rebagliati afirmou que não consome a droga desde abril do ano passado e que o teste deve ter dado positivo devido à presença dele em uma festa no Canadá dez dias antes do início dos Jogos de Inverno.
Naquela festa, os convidados teriam fumado maconha, e o atleta, apenas aspirado a fumaça.
De acordo com Ovandir Alves Silva, 55, chefe do laboratório de análises toxicológicas da USP (Universidade de São Paulo), a versão apresentada pelo canadense não é aceitável.
Em sua opinião, não pode ser verídica a afirmação do esportista de que não consome maconha desde abril de 97.
""A eliminação da maconha do organismo das pessoas varia muito, conforme a qualidade da droga. Se for mais forte, leva mais tempo", diz o especialista em toxicologia. "Dura alguns dias, dificilmente meses. Então, seria impossível levar quase um ano."
Alves Silva também rejeita a possibilidade de Rebagliati se ter intoxicado em uma festa no Canadá dez dias antes de competir.
""Não aceito a afirmativa de fumante passivo. Essa quantidade (17,8 nanogramas da droga por mililitro) só poderia aparecer na urina de um fumante passivo se ele estivesse em um recinto pequeno e com muita gente", afirmou.
""Para ter essa concentração como fumante passivo", acrescentou ele, "teria que ser uma coisa muito recente, em um recinto fechado, como um carro, e com três ou quatro pessoas fumando dentro. Em uma festa, é difícil haver lugares tão pequenos e fechados."
Para Alves Silva, que trabalha com análise de doping na USP há 20 anos, Rebagliati, ao citar o caso da festa, "procurou justificativa (para não perder a medalha ), e aceitaram".
Ele afirma que, por ser uma droga ilícita no Brasil, "não há estudos precisos sobre o efeito da maconha no esporte. Mas ela altera a conduta do indivíduo, o que traz riscos em qualquer ocasião. Pode não afetar o rendimento mas afeta a saúde, e é doping."
O laboratório da USP, a serviço da FPF (Federação Paulista de Futebol), realiza análises de testes de doping no Campeonato Paulista.
"Mas não houve nenhum problema até agora", disse Alves Silva.



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