São Paulo, sábado, 13 de março de 2010

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JOSÉ GERALDO COUTO

Ode à alegria


Num mundo imerso na brutalidade, uma goleada como a do Santos lembra o valor da festa e do prazer


HÁ QUEM VEJA o futebol como guerra e há quem o veja como festa, diversão, poesia. No primeiro caso está, por exemplo, o técnico Dunga. No segundo, os Meninos da Vila, que transformaram a noite da última quarta-feira num momento inesquecível ao derrotar o Naviraiense por 10 a 0.
Ah, dirão os céticos e pragmáticos, mas o Naviraiense é um time de várzea, quero ver contra um clube grande. Eu também quero ver, mas não é essa a questão. O fato é que os garotos do Santos mostraram um prazer de jogar que vai muito além dos interesses mesquinhos de tabela, regulamento, classificação.
No triste futebol de resultados em que estamos imersos, o aparentemente mais sensato seria o Santos, depois de abrir uma vantagem de quatro gols, passar a tocar a bola de lado, se fechar na defesa e "administrar o placar", poupando o elenco para "a sequência das competições".
Mas quem disse que a alegria e o tesão têm a ver com sensatez?
Além do mais, como comentou Sócrates no "Cartão Verde", da TV Cultura, "num jogo como esse a gente não cansa; é como transar com namorada nova".
Sócrates sabia o que estava dizendo. Ele fez quatro dos dez gols que o Corinthians tascou no Tiradentes do Piauí numa goleada histórica, em fevereiro de 1983.
Quem já jogou futebol alguma vez, nem que tenha sido na praia, na rua ou num terreno baldio, sabe que, quando um time chega a um certo patamar de vantagem sobre o adversário, entra-se numa euforia irresistível, numa espécie de febre que impele a tentar fazer mais gols, sempre mais. Diferentes, se possível mais bonitos.
Sei que a turma que vê o futebol como guerra está torcendo por um tropeço do Santos, para poder dizer de boca cheia: "Viu só? Era fogo de palha. Futebol é coisa séria".
Que dizer a essa gente?
Quanto a mim, uma noite como a de quarta-feira, na Vila Belmiro, reaviva o amor por esse esporte que tem sido tão aviltado pela violência, pela burrice e pela falta de imaginação nos últimos tempos.
Para completar o clima de festa, a diretoria santista teve a feliz ideia de cobrar apenas R$ 1 pelo ingresso de mulheres e crianças até 12 anos.
Isso se chama formação de público e, de quebra, um meio de povoar a arquibancada com gente de bem, isolando e inibindo a truculência dos estúpidos.
Por falar em truculência, esta coluna é dedicada ao genial cartunista Glauco e a seu filho Raoni, que ontem de madrugada foram assassinados em Osasco. Não sei para que time eles torciam, mas espero que tenham tido a oportunidade de ver a goleada santista, levando assim uma imagem de beleza e alegria deste mundo tão ignóbil em que, dizem, vivemos.

Grandes gringos
Quem gosta de futebol bonito, independentemente da cor da camisa ou da bandeira, vai se deliciar com o livro "As Melhores Seleções Estrangeiras de Todos os Tempos" (editora Contexto), do colega Mauro Beting.
Estão ali, em riqueza de detalhes e bastidores, esquadrões como a Hungria de 54, a Holanda de 74 e a França de 98.

jgcouto@uol.com.br


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