São Paulo, quinta, 13 de maio de 1999

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Carpegiani hoje é a vanguarda no Brasil

MATINAS SUZUKI JR.
da Equipe de Articulistas

Paulo César Carpegiani vem sendo criticado pelo excesso de mudanças táticas que faz. As críticas não deixam de ter seu fundamento e partem de pessoas mais insuspeitas, a exemplo de meu novo colega de Folha Tostão e de meu ex-colega de Folha José Trajano.
Afinal de contas, o São Paulo corre o risco de, com tantas opções de posicionamento e movimentação, não ter, na verdade, nenhum esquema consistente. Alguns chegam mesmo a enxergar nas derrotas decisivas do tricolor um importante elemento crítico na estratégia de não ter estratégia do técnico.
Vou ousar, modestamente, discordar dessas críticas. Acho extremamente salutar para o São Paulo e para o futebol, de uma maneira geral, o laboratório de experimentações táticas do dr. Carpegiani.
O futebol está vivendo um processo intenso de modificações táticas, agora que não há mais modelo tático hegemônico (4-4-2 ou 3-5-2, dominantes nos últimos 15 anos, são cada vez menos usados em suas formas puras). Sob esse aspecto, o futebol, assim como a política e a economia na formulação clássica de Hobsbawn, também vive sua era das incertezas.
Não ter um esquema tático definido previamente é uma atitude moderna. Está em linha com o que perseguem, por exemplo, as empresas em suas formas mais avançadas de negociações, em um mundo cada vez mais complexo e competitivo -como cada vez mais complexas e competitivas se tornam as arenas esportivas, goste desse processo ou não.
Primeiro, esse comportamento dificulta a preparação dos rivais -que não saberão jamais, de antemão, que formação tática enfrentarão.
Segundo, a variação, pelo que tenho visto, procura valorizar o potencial de cada jogador em suas habilidades mais vantajosas (dar liberdade para o arranque e a finalização de Serginho, por exemplo, sem perder o poder de finalização de Marcelinho, aproveitar a regularidade de Jorginho, mantendo a mobilidade de Edmílson, e por aí vai), estratégia, para dizer o mínimo, inteligente.
Terceiro, Carpegiani teve a coragem de mostrar para o futebol brasileiro -quase sempre conservador, quando não covarde na arrumação defensiva- que é, sim, possível formatar sistemas defensivos sem os tradicionais e ultrapassados quatro zagueiros.
E, por fim, as modificações táticas de Carpegiani procuram sempre valorizar o lado estético e lúdico que está na origem do jogo. E isso é simplesmente "bonito, pois, pois", como diria o dono do hotel do poema de Manuel Bandeira.
Carpegiani é hoje a vanguarda brasileira.
Por razões parecidas, discordo da crítica ao deixar passar batido o fato de Wanderley Luxemburgo ter colocado, em uma mesma formação, Amoroso, Ronaldinho, Rivaldo e Romário. A maioria ficou discutindo a desnecessidade do jogo contra o Barcelona, o que é verdade, mas não se deu o destaque devido para o gesto revolucionário do técnico da seleção.
Se esses quatro jogadores tiverem tempo para treinar e jogar juntos, o futebol brasileiro poderá estar gerando um fato cultural novo da maior importância para o país -que, aliás, está necessitando imensamente de um fato cultural novo.
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Matinas Suzuki Jr. escreve às quintas e é diretor editorial-adjunto da Abril S/A



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