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FUTEBOL
Indignação une torcedores
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
Mil campanhas pela paz e
união dos torcedores de todos os times e Estados não seriam
capazes de produzir resultados
tão significativos quanto os obtidos pela proposta da ridícula Copa João Havelange, o torneio
"provisório" que o Clube dos 13
inventou para 2000 e que já está
sendo substituído por outro, menos enrolado, mas igualmente espúrio. É impressionante a quantidade de mensagens enviadas por
torcedores indignados de todo o
Brasil para os jornais e as TVs.
Muitos, desgostosos, propõem um
boicote a todos os jogos (oficiais?)
do segundo semestre.
Acredito que estejam sendo sinceros, mas duvido que aconteça.
Deixar de ir aos estádios é uma
das idéias, mas isso já vem acontecendo há um bom tempo, por
vários motivos diferentes (preço,
horário, insegurança, dificuldade
de acesso etc), e ninguém parece
estar muito preocupado. Não o
suficiente para oferecer condições
melhores, por exemplo.
Às vezes os ingressos são oferecidos a preço melhor, em mais pontos de venda, mas não passa muito disso. Portanto as arquibancadas vazias não devem sensibilizar
muito os organizadores.
Por outro lado, é difícil resistir a
uma transmissão do jogo do seu
time pela televisão. Se ele estiver
jogando muito mal, é mais fácil
mudar de canal ou dar uma volta
na cozinha; se ele estiver jogando
bem, a paixão pelo futebol fala
mais alto (como acontece com as
paixões) e você se esquece dos cartolas, do regulamento, da falta de
sentido na composição das tabelas e torce por mais um gol.
A imprensa vai continuar cobrindo cada rodada, porque não
pode simplesmente ignorar o que
está acontecendo. Espero que ela
não se esqueça de dizer, sempre,
quão ignóbil é o contexto.
Mas corre-se o risco de aborrecer o leitor, que pode achar que
"essa insistência já encheu o saco". Muitas causas importantíssimas são tratadas com desdém
porque as pessoas cansam de ouvir sempre as mesmas coisas, e
um defensor do meio ambiente
vira automaticamente um "ecochato", e assim por diante (eu
continuo militante como um "Capitão Planeta", recolhendo lixo e
levando para reciclar. Cada um é
"chato" de um jeito).
Em todo caso, se o silêncio e o
total desprezo forem inviáveis, é
melhor continuar fazendo barulho. Nós nos sentimos pequenos,
otários e impotentes, mas "a
união faz a força", por mais ridículo que soe. Quantas vezes a Rede Globo já desistiu de ter um casal homossexual nas suas novelas
por causa da pressão dos telespectadores? Vamos reclamar sem parar, vamos deixar de comprar camisas e canecas dos times, vamos
atazanar a vida desses caras. Se
não podemos sozinhos com eles,
unamo-nos contra eles.
Eurico Miranda ameaçou processar o juiz que concedeu uma liminar favorável ao Gama , alegando "perdas e danos", por
"proibir o Vasco da Gama de disputar um campeonato".
O juiz não está proibindo o Vasco de coisa alguma, está garantindo o direito do Gama continuar
jogando. Mas esse argumento,
"perdas e danos", é usado a torto
e direito pelo marreteiro que vende tralha paraguaia contrabandeada, pelo dentista que trabalha
sem diploma, pelo dono de loja
chique que funciona sem alvará...
Todo mundo só quer "trabalhar
honestamente".
É incrível como honestidade é
um conceito que pode ser "flexibilizado", assim como as nossas relações trabalhistas.
A tal da "Copa dos Campeões"
não seria uma má idéia, se os torneios regionais fossem rápidos e
bem montados (ainda não entendo porque Minas Gerais entrou
na "Copa Sul", entre outras coisas
estranhas). Os campeões de cada
região têm o direito de disputar
um atalho para a Libertadores. E
as outras vagas a que o Brasil tem
direito? Ah, isso depende. O Clube
dos 13 e a CBF podem chegar à
conclusão que o mais justo e correto é conceder esse direito ao
quarto e ao sétimo colocados da
Copa União, por exemplo. Não
duvido de mais nada.
O Zé Geraldo Couto reproduziu
uma mensagem divertidíssima de
um leitor, com outras propostas
"brilhantes" para preservar os
grandes clubes. O José Marcelo
Torres Batista, de Salvador, também fez boas sugestões, como batizar a nova taça de "Troféu Boa
Sorte João Alves". Ele compara o
raciocínio aplicado ao futebol ao
que acompanha outras esferas
políticas: "Assim como um time
que "tem tradição" não pode ser
rebaixado, mesmo que perca dentro de campo, um político "de família" (oligarquia, posses, nome,
tradição) também não pode ser
cassado, mesmo que dê motivos
para isso".
Ele está sendo irônico, mas muita gente acredita nisso -ou não
estaríamos desse jeito.
E-mail
soninha.folha@uol.com.br
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