São Paulo, quarta-feira, 13 de setembro de 2000

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BASTIDORES
Shinyashiki passa de guru a "supertécnico" do COB


Consultor que fez atletas pisarem em brasas e diz inexistir o impossível supera limite do cargo e ganha livre acesso ao trabalho dos técnicos


FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A CANBERRA

JOSÉ ALBERTO BOMBIG
DO PAINEL FC

A expressão "no limite" não existe para Roberto Shinyashiki. O psiquiatra, dublê de psicólogo, escritor e consultor organizacional -charlatão para os inimigos- do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) acredita que sempre é possível ir mais além. Ele foi. De "motivador" dos atletas passou a ser um dos homens mais importantes do Brasil em Sydney.
Responsável pelos nervos dos brasileiros nos Jogos, ele vai dividir espaço com os treinadores e tem carta branca do presidente do COB, Carlos Arthur Nuzman, para circular por todos os cantos da Vila Olímpica, opinando sobre o que lhe convir.
"Posso ir para onde eu quiser. Posso entrar em qualquer lugar. A idéia é que eu esteja nos ginásios, nos estádios, junto com eles (técnicos)", diz o psiquiatra, exibindo sua credencial administrativa.
Daí, segundo ele, surgiu a idéia de prestar atendimento instantâneo, in loco, às equipes que precisarem de seus serviços.
Questionado se planeja interferir, por exemplo, em uma preleção ou até mesmo numa bronca de um técnico a seus atletas, o psiquiatra nega. Mas é pouco conclusivo em sua resposta. "Não sei ainda se eu vou interferir. Acho que não", disse.
A influência do psiquiatra junto a Nuzman é tanta que ele teve carta branca para colocar os preciosos pés dos atletas brasileiros sobre um caminho de brasas.
Descalços, atletas e dirigentes esportivos pisavam nas brasas e gritavam frases como "Brasil, eu posso! Raça!".
A "vivência" foi colocada em prática antes de a delegação embarcar para a Austrália e é um dos pontos altos dos métodos do psiquiatra para motivar atletas.
Ela foi a gota que faltava para que o Conselho Federal de Psicologia, melindrado por não ter emplacado um psicólogo na delegação brasileira, criticasse publicamente Shinyashiki e o presidente do COB.
"Ele passa uma idéia de um trabalho meio mágico, e a gente vem batalhando para que essa idéia não seja vinculada à psicologia do esporte", afirmou Ana Bock, presidente do conselho.
Sucesso editorial com livros de auto-ajuda, entre eles o best seller "O Sucesso É Ser Feliz" (editora Gente), Shinyashiki faz palestras para profissionais de diversas áreas e possui um eficiente marketing pessoal.
Eclético, seu método mistura neurolinguística, filosofia oriental e técnicas norte-americanas de motivação. Na definição -um tanto vaga- do próprio, "é um trabalho de preparação mental".
Shinyashiki se escora em sua origem oriental para escapar ao fogo cruzado. Quase sempre se esquiva do assunto, utilizando um silêncio enigmático.
Às vezes contra-ataca: "É um grupo que peca pela ignorância, que não vê o que está acontecendo no mundo. O conselho está protegendo seu mercado de trabalho, seus membros".
Segundo ele, a vivência é fundamental para ensinar os atletas a acreditar no impossível.
No ano passado, trabalhou com a seleção masculina de basquete do Brasil, dirigida pelo técnico Hélio Rubens. O resultado não foi o esperado. Os atletas brasileiros não conseguiram vaga nos Jogos de Sydney.
Mas, no início deste ano, apesar do desempenho controverso, carimbou seu passaporte com o aval de Nuzman.
Desde então, sua relação com o presidente do COB se estreitou. Nem as críticas dos conselhos de psicologia foram capazes de frear a ascensão do psiquiatra.
Nem o COB nem o psiquiatra revelam os valores do contrato entre as duas partes.
Shinyashiki cobra por palestra, em média, R$ 10 mil. Sua agenda foi suspensa por 40 dias para que ele estivesse em Sydney. Em caso de sucesso do Brasil nos Jogos, esse valor deverá ser aumentado.
Nuzman, impressionado com a performance do psiquiatra, recomendou o trabalho dele ao Comitê Paraolímpico Brasileiro, que tem boa relação com o COB.
No final de agosto, Shinyashiki iniciou seu trabalho com os atletas paraolímpicos. "Tenho muito o que aprender com eles", diz.
O técnico da seleção brasileira masculina de vôlei, Radamés Lattari, diz que acha "ótimo" o trabalho de Shinyashiki e que não sente sua área de atuação ser invadido pelo psiquiatra.
"Na Copa América, ele ia até no nosso ônibus, para motivar ainda mais a equipe", afirma Lattari.
Na Austrália, Shinyashiki só não vai trabalhar, pelo menos segundo o COB, com a seleção masculina de futebol, que está sob os cuidados da psicóloga Suzy Fleury, colega do psiquiatra no instituto e editora Gente e que também trabalha com motivação.


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