São Paulo, sexta-feira, 14 de abril de 2006

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FUTEBOL

Chega de craques e medianos!

XICO SÁ
COLUNISTA DA FOLHA

A migo torcedor, amigo secador, sabe uma coisa que anda em falta: o grosso, o perna-de-pau completo e acabado, aquele que trata a bola com desdém e ignorância, sem essa de ver beleza na maldita redonda, naquela coisa deselegante e esférica que não merece respeito nem do gandula.
Sem essa de comparar a bola a uma mulher amada, sem essa de comparar a bola a uma criança, sem essa de bons tratos, lugar de bola é no mato, que na vida nada é amistoso. Metáfora e futebol-arte, para o grosso, são coisas de veado. Onde andam os grossos de verdade, meu caro Peninha, velho beatnick gremista? Onde andam os beques de fazenda, os volantes Chicões, os Mericas da vida?
E, no ataque, onde estão os novos Beijocas? Onde andam os excluídos das crônicas chorosas do Armando Nogueira?
Ora, para o grosso, comadre Gertrude, uma bola é apenas uma bola, uma bola, uma bola.
Essa obsessão pelo craque ou candidato a craque nos roubou a graça de ver em campo o grosso de fato. A Europa nos leva os fora-de-série, e o nosso futebol fica cada vez mais uma várzea repleta de mais-ou-menos.
O Brasileiro que começa no final de semana é o Brasileiro mais mediano da história. Todo corretinho na fórmula e no número de clubes, mas uma desgraça na qualidade. Não tem supercraque e muito menos grossos.
Você pega os piores times da Série A e não encontra um perna-de-pau completo. Mesmo com toda a decadência, os times cariocas podem ser acusados de tudo, mas nem o Júnior Baiano dos melhores tempos era um grosso autêntico. Fazia lambanças, mas o efeito Telê Santana na sua existência, nos tempos de São Paulo, limou seus melhores defeitos. O mestre Telê, aliás, com os seus pacientes fundamentos, é o maior exterminador de pernas-de-pau do país.
É, o futebol perdeu a graça do grosso de verdade. Quanto tempo faz que não vemos gol de canela? Chega da frieza do gol de jogada ensaiada! Os piores jogos da vida são os tais jogos dos nós táticos!
Prefiro a beleza das peladas.
Os trombadores estão em extinção, que saco, todo mundo volta para armar, para ajudar o meio-campo, haja obediência tática, haja linha burra. Cadê os gols à Dadá Peito-de-Aço? Cadê uma pisada na mão do goleiro à Serginho Chulapa? Cadê o pontinha ciscador e burro que joga de cabeça abaixada feito um touro hábil?
Procura-se um grosso, cartas para esta Folha.
A Série B, que começa amanhã, surge como esperança. Não por um grosso isolado, mas pelos jogos ao estilo vaquejada, vida e morte na Segundona. Assim no futebol como na vida, da medalhinha para cima é canela.
Que a Segundona não se contamine por nós táticos, neurolinguística nas palestras de vestiário, auto-ajuda... Se conversa furada ganhasse jogo, Lair Ribeiro seria o nosso técnico na Copa.
Que nos jogos da Série B esteja escrita, no quadro-negro dos vestiários, no máximo essa frase, meu velho e bom Sérgio Sant"Anna: "Bola pra frente, rapaziada".

Já ganhou
Não há a menor dúvida, ninguém é capaz de esconder, a equipe do São Paulo larga novamente como favoritíssima para faturar mais um campeonato. Somente se der muita zebra e os secadores de plantão funcionarem, o Tricolor não levará para o Morumbi mais um caneco do torneio continental. Desta vez não vai precisar nem de helicóptero.
Alegria do Galvão Que festa brasileira na Libertadores da América, né? Até o Paulista de Jundiaí, que não anda lá essas coisas, conseguiu tirar casquinha nos argentinos. "Sei não, isso não vai acabar bem", cutuca-me aqui o Flobé, o meu papagaio secador, toda vez que ouve a voz do mais patriótico dos nossos locutores da televisão.

E-mail: xico.folha@uol.com.br


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