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FUTEBOL
As lições do Estudiantes
RODRIGO BUENO
DA REPORTAGEM LOCAL
Você já deve ter escutado mil
vezes alguém dizer que tal time deu aula de futebol. Mas pouco deve ter ouvido sobre as aulas
no fim dos anos 60 e começo dos
70 do Estudiantes de La Plata, time chico da Argentina que de novo dá lições na Libertadores.
Anteontem, a limitada e aguerrida equipe do técnico Jorge Burruchaga, carregando a mística
daquela que foi tricampeã continental entre 1968 e 1970, virou jogo contra o Bolívar já nos acréscimos e garantiu passagem para as
oitavas-de-final. A equipe que
protagonizou a mais sensacional
virada do ano (0 a 3 para 4 a 3
diante do Sporting Cristal) também protagonizou a classificação
mais emocionante da temporada.
No 1 a 0 contra o Independiente
Santa Fé e no 2 a 2 com o Sporting
Cristal fora de casa, gols nos últimos minutos deixaram o time vivo na competição que tanto é associada à garra, à camisa, à guerra e ao "vale tudo para ganhar".
Muita dessa aura que ronda a
Libertadores foi dada pelo Estudiantes, cujas aulas, desde os primórdios, quase sempre foram reprovadas pelos superiores. Os fundadores do clube eram estudantes, e grande parte de seus simpatizantes são acadêmicos, alunos
de medicina. Não é à toa que seus
seguidores são chamados de "pincharratas" (o nome deve-se ao fato de os estudantes de medicina
fazerem experiências com ratos).
O temor e o assombro causados
pelo Estudiantes quando esse
venceu o Metropolitano em 1967
serviram na verdade para consagrar uma série de inovações. Sob
o comando do técnico Osvaldo
Zubeldía, o time foi bem mais que
o primeiro pequeno a triunfar na
Argentina. Foi o primeiro de fato
a estudar minuciosamente os adversários, a desenvolver estratégias extracampo para ganhar jogos e estimular um espírito comunitário (escolar mesmo) da equipe. Dois dos contestáveis craques
do time eram Raúl Horacio Madero e Carlos Salvador Bilardo,
dois doutores em campo. Muitos
anos depois, como médico e como
técnico da seleção argentina, respectivamente, os dois ganharam
a Copa de 1986 e teriam "tratado"
até de água batizada no Mundial
de 1990. Nenhum clube personificou tanto o antifutebol ou foi tão
associado a atitudes antiesportivas quanto o Estudiantes. O lendário Zubeldía é visto como gênio
e louco (características que, dizem, se misturam). Rotulado como "homem sem escrúpulos", seria mentor das mais ardilosas artimanhas, mas também pioneiro
do futebol de resultados, precursor de Bilardos, Bianchis, Scolaris,
técnicos capazes de triunfar com
times modestos, experts em usar
coração e malandragem para bater equipes tidas como favoritas.
O Estudiantes de Zubeldía ensinou tanto faltas táticas como, em
aulas particulares a seus atletas, a
usar alfinetes e outras armas em
campo. O atual campo de jogo,
aliás, exibe arame fardado para
""conter" a fanática torcida, o que
ainda o deixa no caminho oposto
do "fair play" visto nos gramados
europeus. O Estudiantes foi o
grande responsável pela ida do
Mundial interclubes para um
campo neutro. Os estudantes,
com rebeldia e vigor, têm muito a
ensinar. Para o bem e para o mal.
As lições da Libertadores
Pancadaria seguida de omissão do juiz, como a vista no duelo Palmeiras x Cerro Porteño, e arbitragens caseiras, como a verificada no
jogo Universidad Católica x Corinthians, contribuem para a impressão de que a Libertadores voltou aos "bons tempos". A revelação
neste ano de que o árbitro uruguaio Gustavo Méndez "fechou" por
US$ 20 mil para favorecer para o River Plate em um jogo da Libertadores passada, potencialmente a primeira das semifinais contra o
São Paulo no Morumbi, dão a certeza de que o jogo sujo que marcou
boa parte da tradicional competição continental atravessou o século.
As lições da Copa dos Campeões
Incrível como analistas vêem um esquema tático diferente para cada
jogo do Barcelona. Não é Ronaldinho mais dez, mas não são táticas.
E-mail rbueno@folhasp.com.br
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