São Paulo, quinta-feira, 15 de agosto de 2002

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FUTEBOL

A volta da seleção

CARLOS RENNÓ
ESPECIAL PARA A FOLHA

Brasil e Paraguai farão na próxima quarta-feira um jogo que tem uma importância muito especial. Pela primeira, e provavelmente pela última vez, veremos de novo reunidos os mesmos jogadores que se tornaram, e nos tornaram, pentacampeões mundiais. Raramente isso acontece após uma Copa.
Esses atletas causaram o maior sentimento de felicidade coletiva (e quanto de felicidade individual está implícita aqui) experimentado no país desde 70, quando da conquista do tricampeonato. Com a gratidão que se deve aos homens que engrandecem uma nação, a mesma devida aos grandes artistas, deve-se saudar a exibição dessa seleção agora.
Essa felicidade só foi sentida porque o povo reconheceu no time o futebol tradicionalmente identificado como brasileiro, alegre, solto, criativo, ofensivo: e nele se reconheceu. Em 94, a alegria, embora imensa, fora menos intensa; para superar então o trauma de não ganhar fora preciso a seleção ganhar como se ganhou, com muito cuidado e contenção, praticando um jogo amarrado.
Na ocasião, contávamos apenas com um superjogador, Romário, o maior centroavante da história do nosso futebol e o maior responsável em campo pela vitória. Em 2002, ao contrário, tivemos três craques fora-de-série: Rivaldo, Ronaldo e Ronaldinho. E por isso ganhamos como ganhamos.
A mera perspectiva de rever esses jogadores em ação juntos já justifica assistir ao jogo de quarta.
Rivaldo foi, como já tinha sido em 98, o melhor, ao conciliar regularidade e singularidade, individualismo e espírito coletivo.
Seu belo e inesperado gol contra a Bélgica mudou a história de uma partida que foi, na verdade, a mais dura para o Brasil, impondo uma superioridade quando o adversário é que parecia mais próximo de marcar.
A atuação de Ronaldo fez dele definitivamente um mito. Que história incrível! Protagonista do caso estranhíssimo a que ficou associada a derrota na final do Mundial da França, o atacante passa quase quatro anos contundido, volta a jogar três meses antes da Copa da Coréia do Sul e do Japão e vira, para muitos, o comandante do penta, além de artilheiro da competição. Aos 25 anos apenas, Ronaldo já assegurou por várias décadas um lugar no imaginário nacional.
Ronaldinho se tornou o artífice do lance mais inspirado da campanha. Contra a Inglaterra, sua jogada que terminou no passe para o gol de Rivaldo se constituiu numa pintura, mas não se comparou ao seu próprio gol no mesmo jogo. Naquele momento, reinstaurou-se a poesia no futebol. E, arrepiados, vislumbramos a beleza maior por vir, certos de que podíamos apostar na alegria.
O chute de falta, de longe, encobrindo o goleiro inglês adiantado, foi de quem estava em estado diabólico de graça, obra de gênio, lance de "Rei". Equipara-se a três, antológicos, lançados por Pelé em Mundiais: o chapéu no zagueiro sueco, seguido de gol na final de 58; e o tiro do meio-campo contra o arqueiro tcheco e o corta-luz pra ele mesmo diante do perplexo goleiro uruguaio, em 70.
Brasil e Paraguai valerá pela oportunidade do reencontro e pelo rito de passagem que representará. Com o jogo, acabará uma história e começará outra. O começo dessa outra se dá com a escolha de um novo técnico. Mas esta já é outra história.

O ataque de João
Tido por louco -por samba e futebol, ele realmente é-, João Gilberto é, sim, o mais genial de nossos artistas músicos. Pois bem: o Pelé da MPB também não perdoa Luiz Felipe Scolari. Há 12 dias, durante seu show no Tom Brasil, em São Paulo, o cantor retomou o tema da não-convocação ("uma injustiça") de Romário ("um herói") para a Copa, afirmando que "para cinco bilhões [!" de Felipões há um Romário". "Agora andou falando mal de Ronaldo, que lhe deu a Copa", afirmou João Gilberto sobre Felipão. Sobre Ronaldinho, o cantor afirmou que, nas quartas-de-final contra a seleção inglesa, ele "fez aquele gol lindo", mas, "ingênuo, inocente", cometeu a falta feia que acabou lhe causando sua expulsão só para agradar ao técnico da seleção brasileira, um cultor do futebol bruto, sem classe, para o inventor da bossa nova.

E-mail esporte@uol.com.br


Hoje, excepcionalmente, Soninha não escreve nesta coluna



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