São Paulo, domingo, 15 de novembro de 2009

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JUCA KFOURI

Cumpre-se. E discute-se


É típico do pensamento servil afirmar que decisão da Justiça é para ser cumprida, mas não para ser discutida

EM NOVEMBRO de 1999, neste espaço, a propósito da dispensa de Edílson da seleção brasileira, porque fez embaixadinhas diante do Palmeiras na decisão do Paulistinha, fiz uma ironia sobre a punição juntando o técnico de então, Vanderlei Luxemburgo, e o comando da CBF, todos encalacrados na CPI da CBF.
Sentindo-se ofendido, Ricardo Teixeira me processou.
Perdeu em primeira instância, mas ganhou, em seguida, no Tribunal de Justiça do Rio, em acórdão relatado pelo desembargador Sérgio Lúcio de Oliveira e Cruz, da 15ª Câmara Cível.
Em dezembro de 1999, no diário "Lance!", escrevi que "o jornalista Carlos Maranhão fez quase todas as perguntas que devia ao presidente da CBF na entrevista da "Playboy" deste mês. E, como sempre, o cartola respondeu sem nenhuma preocupação com a ética ou com a verdade. Merece ser lida, até porque os destaques na edição da entrevista são suficientemente maliciosos para bons entendedores. Aliás, você só acredita se quiser.
E tem um furo: Ricardo Teixeira ganha, de salário, R$ 17 mil na CBF.
É pouco".
Teixeira me processou de novo.
Perdeu em primeira instância e ganhou no Tribunal de Justiça do Rio, em acórdão relatado pelo desembargador Sérgio Lúcio de Oliveira e Cruz, da 15ª Câmara Cível.
Um dos acórdãos teve a data de 21 de novembro de 2002 e o outro a de 18 de dezembro de 2002, menos de um mês portanto entre um e outro e, para espanto maior dos especialistas, na mesma Câmara! Diante de pena anterior que determinou pagamento de 150 salários mínimos, o magistrado dobrou o valor da segunda, com uma "reprimenda maior" por escrito na sentença, ao dizer que o jornalista "parece que não se corrigiu".
Eis que, na última quarta-feira, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, corrigiu. Ou melhor, reformou a sentença.
E de maneira que extrapola uma questão entre um jornalista, um notório cartola e a Justiça. Porque a decisão do ministro é daquelas que merecem ir para um quadro, em defesa das liberdades democráticas.
Escolho trechos: "Longe de evidenciar prática ilícita contra a honra subjetiva do suposto ofendido, traduz, na realidade, o exercício concreto, por esse profissional da imprensa, da liberdade de expressão, cujo fundamento reside no próprio texto da Constituição da República, que assegura, ao jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e mesmo que em tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades", sentenciou o magistrado.
E mais: "É preciso advertir, bem por isso, notadamente quando se busca promover, como no caso, a repressão à crítica jornalística, mediante condenação judicial ao pagamento de indenização civil, que o Estado -inclusive o Judiciário- não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as ideias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais dos meios de comunicação social."
Mais claro, mais firme, mais didático, mais digno, impossível.
"Nem o Estado, nem o Judiciário", brada Celso de Mello.

blogdojuca@uol.com.br


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