São Paulo, quinta, 16 de julho de 1998

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DOSSIÊ RONALDINHO
Havia dias com sinais de depressão, atacante brasileiro teve, na verdade, um colapso nervoso
Ronaldinho não sofreu uma convulsão

JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
enviado especial a Paris

Ronaldinho sofreu uma crise nervosa no último domingo, e não um distúrbio neurológico.
Seja pela pressão da mídia, dos patrocinadores e da CBF, seja por problemas pessoais, o atacante teve um colapso no banheiro do quarto 290 do Château de Grande Romaine, em Lésigny, entre as 14h30 e as 15h do último domingo.
O problema não foi novidade para algumas pessoas da seleção. Havia alguns dias, andava absolutamente calado na concentração.
Segundo o lateral Roberto Carlos, seu companheiro de quarto, o atacante tinha dificuldades para pegar no sono e, quase sempre, acordava reclamando de cansaço.
No sábado, Ronaldinho estava visivelmente irritado. Andando de bicicleta pela área do hotel, foi flagrado batendo a roda dianteira contra pedras do jardim, em clara demonstração de descontrole.
No domingo, após o almoço, quando os jogadores dormiam, gritos foram ouvidos no jardim.
Era Roberto Carlos, que berrava da janela do quarto, pedindo por socorro. Ronaldinho tinha tido o colapso no banheiro. Depois de alguns jogadores, entre eles Edmundo, Dunga, Leonardo e César Sampaio, o médico da seleção, Lídio Toledo, chegou ao local.
Tremendo e suando muito, Ronaldinho foi colocado na cama, onde aconteceu o atendimento médico. Temendo que fosse um ataque epilético, o volante César Sampaio segurou a língua do jogador para evitar que enrolasse.
Depois, aconteceu uma discussão entre os jogadores da seleção (leia texto à página 4).
Passaram-se alguns minutos, e Lídio Toledo saiu do quarto. Estava chorando, o que provocou comoção nos funcionários do hotel.
Há versões conflitantes sobre o que ocorreu em seguida. Ronaldinho teria adormecido, mas há quem diga o contrário. Uma hora mais tarde, porém, foi visto no bar do hotel, tomando suco de laranja.
Demonstrava abatimento, calado, olhando para baixo, conforme relatos colhidos pela Folha.
Por volta das 16h30, Ronaldinho sumiu. Sem mesmo o gerente do hotel ter percebido, havia sido levado em um carro do comitê organizador da Copa à Clínica Des Lillas, na periferia Paris, em companhia do médico Joaquim da Matta e de um fisioterapeuta da seleção.
Toledo tomou a decisão de levá-lo à clínica para poder ter certeza de que o jogador não precisava mesmo de algum tipo de tratamento ou medicamento.
Conforme o resultado dos exames, Ronaldinho seria escalado ou não para o jogo. A preocupação com doping já vinha desde a semifinal contra a Holanda, quando surgiu um boato de que o atacante havia sido pego no exame da Fifa.
Joaquim da Matta tinha ficado nervoso com o episódio, indício de que o jogador poderia ter feito infiltrações no joelho, informação não confirmada pela Folha.
O próprio jogador admitiu, no entanto, que havia tomado remédios para a dor no tornozelo até a última sexta-feira. E que havia interrompido o tratamento por instrução da comissão técnica, que receava pelo exame antidoping.
Ronaldinho passou por exames, como tomografia computadorizada e eletroencefalograma, mas nada foi constatado. O jogador jamais foi informado de suspeita de problemas neurológicos.
As convulsões têm sempre origem neurológica, ou seja, são desencadeadas a partir de algum problema já existente no sistema nervoso central, explica o neurologista Getúlio Rabelo, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Mas o jogador pode ter sofrido apenas uma síncope (desmaio) convulsígena, que pode ser causada por uma forte crise nervosa e apresenta sintomas semelhantes ao de uma convulsão (perda de consciência, sudorese, agitação).
Respaldado pelos exames, Joaquim da Matta levou o jogador para o Stade de France, ao qual chegou cerca de 50 minutos antes do jogo. A comissão técnica se reuniu. O técnico Zagallo perguntou: "E aí, dá para jogar?". Ronaldinho respondeu: "Sim, estou inteiro." Zagallo escalou Ronaldinho, e o Brasil perdeu de 3 a 0.


Com a Reportagem Local



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