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FUTEBOL
O torcedor teleguiado
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Durante a transmissão televisiva de Fluminense 2 x 0
Corinthians, na quarta, uma
imagem extracampo me chamou
a atenção: na arquibancada esvaziada, um jovem torcedor portava um cartaz com os dizeres "Roberto Marinho - Saudade".
O rapaz não levava jeito de parente nem de amigo pessoal do finado magnata da mídia. Provavelmente, assim como todos nós,
só tinha visto Roberto Marinho
recebendo homenagens ou fazendo discursos em reportagens chapa-branca do "Jornal Nacional".
Por que, então, o torcedor sentia
saudade?, fiquei me perguntando. E eu mesmo respondi: ele sentia saudade porque a televisão
mandou.
Sei que, dita assim de chofre, a
frase pode parecer grosseira. Mas
vou tentar explicar.
Os leitores com mais de 40 anos
certamente se lembram do compacto de futebol do antigo "Canal
100", exibido nos cinemas antes
do longa-metragem nas décadas
de 60 e 70.
Entre as belas imagens em câmera lenta das partidas, quase
sempre jogadas no Maracanã,
eram inseridos regularmente flagrantes dos torcedores na arquibancada e na geral. Escolhiam-se
sempre os mais pitorescos e expressivos: o torcedor desdentado,
com o radinho grudado à orelha,
roendo as unhas, rezando, erguendo as mãos para os céus.
Isso tudo fazia parte, é claro, da
construção de uma mitologia do
futebol como elemento de identidade (e integração) nacional, na
época do sinistro "Ame-o ou deixe-o". Mas isso não vem ao caso.
O fato é que os torcedores eram
colhidos em seu comportamento
espontâneo, em geral sem saber
que estavam sendo filmados.
Hoje acontece o contrário. Muitos torcedores vão ao estádio na
esperança de conseguir seus 15 segundos de fama, ou de exposição
na mídia. Nosso ambiente social e
cultural está tão deteriorado que,
para muita gente, a vida só existe
se for mostrada na televisão.
Para atingir o objetivo de ser
captado pela câmera já não basta
uma indumentária extravagante,
uma máscara ou uma bandeira.
O caminho mais garantido para aparecer é portar cartazes com
mensagens diretas à emissora líder de audiência, com referências
a seu locutor esportivo, a seus comentaristas, a seus programas. E,
por que não, a seu fundador e
proprietário. Fazem assim, sem se
dar conta -ou sem se importar,
o que dá no mesmo-, publicidade gratuita para a emissora. São
garotos-propaganda por um dia
ou uma noite.
O mecanismo é simples e perverso: se eu escrever o que a televisão quer mostrar, a televisão me
mostra. E não tem importância
que eu não apareça dizendo o que
quero dizer, e sim o que a televisão quer que eu diga. O importante mesmo é aparecer.
Cada um busca a felicidade como quer ou pode. Mas não deixa
de ser uma ironia ver o torcedor
fazer propaganda de graça para a
mesma emissora que, entre outras coisas, o obriga a ver jogos no
horário desumano das 21h40 para não atrapalhar a novela.
Afinal: saudades de quê?
Primavera curta 1
Parece que este não é mesmo o
ano do Corinthians. Quando o
time, depois da vitória sobre o
Atlético-MG, parecia estar entrando em uma fase de recuperação, fez uma partida pífia
contra o Fluminense, que lhe
custou a eliminação da Copa
Sul-Americana, e ainda perdeu
por várias rodadas, por contusão, um jogador-chave para as
esperanças de reação, o meia
André Luiz.
Primavera curta 2
Depois de Petkovic, de Marques e de Leo Lima, chegou a
vez de Marcelinho trocar o Vasco por um time estrangeiro. Ao
lado do Grêmio, o Vasco foi
possivelmente a equipe que
mais se modificou e desfigurou
desde o início do Brasileirão. O
último que sair apaga a luz de
São Januário.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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