São Paulo, sexta-feira, 16 de novembro de 2007

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caçada Por justiça, tinha de pegar a Rebeca, diz médico do COB

Teste antidoping que flagrou a nadadora foi feito a pedido de Eduardo de Rose, que já armava cerco para flagrá-la

Amostra foi enviada ao Canadá para análise mais precisa, que não poderia ser feita no Brasil, segundo o chefe de doping dos Jogos


JULIO GOMES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM MADRI

Rebeca Gusmão estava marcada. Enquanto a nadadora se preparava para ganhar medalhas no Pan, um plano estava sendo traçado para que ela nem mesmo participasse dos Jogos.
O plano foi elaborado por Eduardo de Rose, médico do Comitê Olímpico Brasileiro e chefe do antidoping do Pan e da confederação de natação. "Eu tinha de pegar a Rebeca. Não era questão de honra, mas de justiça. Não tenho nada contra ela, mas não acho certo nadar assim", disse ele à Folha, ontem, no Congresso Mundial da Agência Antidoping, em Madri.
Flagrada por uso de testosterona em um exame feito no dia da abertura do Pan e suspeita de fraude em teste realizado durante os Jogos, a nadadora deve perder as medalhas conquistadas no Rio (dois ouros, uma prata e um bronze) e pode até ser excluída do esporte.
O exame que teve resultado positivo não foi feito durante o Pan, mas sim pela Fina (Federação Internacional de Natação), de surpresa, antes de Rebeca cair na água. De Rose revelou que foi ele quem pediu o teste, pois queria que a análise fosse enviada a um laboratório em Montréal, no Canadá.
"Tudo o que a gente ensina aos médicos [sobre uso de testosterona], professores, ali está configurado [no corpo de Rebeca]. Aumento de massa, aumento de performance, tudo está configurado", disse ele.
"Por que pedi exame para a Fina? Porque o laboratório de Montréal é especializado em testosterona, tem o sistema mais sofisticado. Queria ver se evitava que ela nadasse, no Pan, para não ter que dar medalha e, depois, tirar medalha."
Segundo o médico, o Ladetec, laboratório carioca credenciado pelo Comitê Olímpico Internacional, onde foram feitos os testes do Pan, não tinha um equipamento operacional com a mesma capacidade de detecção do canadense. Procurado pela reportagem, Francisco Radler de Aquino, coordenador do Ladetec, disse que não poderia falar sobre o caso nem confirmar se o laboratório estava ou não apto a realizar o mesmo teste de Montréal.
Rebeca Gusmão afirma que sofre de síndrome de ovários policísticos, tendo, assim, uma produção de testosterona acima do normal para mulheres.
Para De Rose, a alegação não é plausível. "O resultado dos dois exames não é que ela tem testosterona alta. Montréal mostrou, sem erro, que tem testosterona exógena, ou seja, não produzida pelo corpo."
Ele se refere ao positivo de julho e a um exame de 2006, um caso controverso envolvendo a atleta -à época, ela não foi suspensa preventivamente como agora. O julgamento deverá ocorrer só em 2008 na Corte de Arbitragem do Esporte.
"Não tinha nada errado em 2006. Eu fiz o exame, deu positivo, foi para a Fina e, não sei por que, ela nunca divulgou o resultado. Posso imaginar que houve alguma divergência entre a CBDA e a Fina, mas não sei qual", afirmou De Rose.
"Eu conheço o laboratório de Montréal como a palma da minha mão, trabalho há 20 anos com eles e nunca vi um erro. Tenho certeza de que não errou nesse caso", completou ele.
O impasse ficou engasgado para o médico. Além de pedir o teste surpresa para a Fina, ele solicitou a análise do DNA das amostras de urina de Rebeca colhidas no Pan. Os exames não apontaram uso de doping.
O resultado apontou dois DNAs diferentes em duas das amostras, o que poderia configurar fraude. "A urina é como impressão digital e, olhando as curvas hormonais dos exames da Rebeca, vi que dois deles tinham um padrão, e outro estava totalmente fora. Por isso, pedi o DNA", disse De Rose.
O médico evita falar, porém, sobre como a nadadora teria burlado o exame. Ele diz que seu trabalho é provar que houve manipulação, e não investigar como ela aconteceu.
"No Pan, muita gente veio me falar sobre a possibilidade de a Rebeca estar dopada. Até meu netinho, de dez anos, me perguntou: "Você está cego?". Expliquei a ele que uma coisa é achar, outra é provar. Mais do que pegar quem ganha ou perde, a prioridade é testar onde você acha que está [o doping]."
"Quando um atleta mostra mudanças radicais no corpo ou no rendimento, a gente bota uma marca. Foi o caso da Rebeca, eu já estava em cima."


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