São Paulo, terça, 16 de dezembro de 1997.



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BASQUETE NO MUNDO
Acústico

MELCHIADES FILHO
Nada eletrifica mais um ginásio do que uma enterrada.
Mas, quando o esporte se profissionalizou, na virada de década 40/50, cravar a bola era um sinal de deselegância.
Bill Russell, pivô que conduziu o Boston a 11 títulos, foi o pioneiro no uso do golpe na NBA. Mas ele apenas largava a bola no aro -não a estufava com força, não grunhia, nem festejava feito doido.
"Era só um jeito seguro de fazer pontos, e não uma expressão de machismo", disse-me em fevereiro, durante reunião de ex-jogadores em Cleveland.
"Não havia vontade de desrespeitar o adversário", concordou, no mesmo salão, outro legendário gigante do basquete, Wilt Chamberlain.
(Foi, aliás, devido ao desinteresse nas enterradas que Wilt criou o "finger roll", arremesso curto e elegante, em que a bola é impulsionada pelos dedos.)
A polidez tinha um incentivo: caso destruísse a tabela, o atleta devia arcar com o reparo.
Em 1966, o circuito universitário dos EUA chegou até a proibir o lance, incomodado com a supremacia dos grandalhões (notadamente o adolescente Kareem Abdul-Jabbar).
Entre os profissionais, a cravada só sairia do "armário" em 1976, quando, farta de ginásios vazios, a NBA absorveu os times e o espírito (viva o espetáculo!) da liga concorrente ABA.
O protagonista dessa transição foi o ala Julius Erving -os treinamentos do Philadelphia enchiam ginásios por causa de suas acrobacias aéreas.
Ao dar nova dimensão ao jogo, Dr. J influenciou uma geração de moleques, entre eles Michael Jordan, que, nos 80 e 90, transformaria a cravada em símbolo internacional da NBA.
Pois não é que cuspiram no prato? Acabo de saber que será extinto o torneio anual de enterradas. Tudo bem que o desafio já não atraía os astros da NBA. Mas quem viu o duelo Jordan x Dominique Wilkins de 85 a 88 há de se entristecer.


NOTAS


Enterrada 1
Não há surpresas no ranking dos que mais enterraram em 96/97 na NBA. Pela ordem: Shaquille O'Neal (quase 30% de suas cestas são cravadas), Chris Webber, Shawn Kemp ("enterrar é melhor do que transar", disse certa vez) e Alonzo Mourning. Afora Webber, os outros têm contratos superiores a US$ 100 milhões.

Enterrada 2
Para estufar a cesta, Gheorghe Muresan, 2,31 m, o mais alto da NBA, do Washington, não precisa nem erguer o pé.

Enterrada 3
Chuck Connors, do Boston, foi o primeiro a quebrar uma tabela da NBA com enterrada -em 5 de novembro de 1946. Na época, os quadrados eram de vidro, e não de resina. Após carreira apagada como atleta, ele virou ator -foi o pai no filme "Flipper", que deu origem à série de TV do golfinho.


melk@uol.com.br



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