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FUTEBOL
Oito ou oitocentos
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
A vitória da seleção brasileira sobre a Venezuela (e o
modo como reagimos a ela) traz
farto material para reflexão.
Não se trata tanto de saber se o
Brasil venceu porque finalmente
jogou só com um volante, ou porque marcou por pressão, ou porque tinha um atacante enfiado
na área, ou simplesmente porque
a Venezuela é uma baba.
O que me parece mais interessante é observar a facilidade com
que passamos da depressão à euforia, do complexo de vira-lata ao
sentimento de que somos os
maiorais.
Antes da partida, estávamos todos (jogadores, treinador, torcida,
imprensa) tensos e apreensivos,
escaldados pela pior campanha
da seleção em eliminatórias.
Antes de terminar o primeiro
tempo, a situação já havia mudado radicalmente.
O placar ainda era 2 a 0 (e podia, portanto, ser alterado) quando Edmílson, lançando-se ao ataque, empolgou-se e tentou dar um
passe "de letra".
No segundo tempo, então, com
três gols de vantagem e um jogador a mais -já que um venezuelano tinha sido expulso-, a festa
da seleção foi total.
Edílson, Ronaldinho, Denílson,
Marcelinho Paraíba, todos tiveram seus instantes de brilho em
São Luís, dando chapéus, dribles
"elásticos", toques de calcanhar,
bolas no meio das pernas do adversário. Pareciam querer exibir
todo um arsenal que passou dois
anos escondido.
A torcida gritava "olé", os locutores se empolgavam, os telespectadores-internautas -essa estranha espécie- decretavam que o
Brasil já é o grande favorito para
ganhar a Copa.
Fiquei com a sensação de que
no Brasil, quando se trata de futebol, é sempre tudo ou nada. Ou "a
gente somos inútil" ou "com brasileiro não há quem possa".
Talvez haja um aspecto positivo
nessa volubilidade.
Talvez ela esteja dizendo que,
para nós, o futebol é alegria ou
não é nada.
Só nos empolgamos com aquilo
que nos dá prazer.
Desse ponto de vista, os dribles e
chapéus não são firulas, o "olé"
não é um luxo. Mais que uma necessidade, são a própria razão de
ser do futebol entre nós. Machucados na vida real, cidadãos de
segunda classe no mundo globalizado, só nos redimimos no futebol
quando somos capazes de encantar e humilhar os adversários.
Só no Brasil um vice-campeonato mundial é recebido como
tragédia. Não nos contentamos
em "estar entre" os melhores.
Temos que "ser" os melhores.
Ou não seremos nada.
Pode ser simples falta de maturidade. Dizem que a criança oscila entre o sentimento de onipotência e o complexo de inferioridade. Ou se vê como super-homem ou acha que nunca será capaz de atravessar a rua.
Talvez um dia a gente cresça e
aprenda a ser mortal.
Não sei se isso será bom ou
ruim, pois não estou vendo a coisa de fora, como um cientista sabido. Faço parte do problema.
Li uma vez numa revista francesa que "a Copa do Mundo só
começa de verdade quando a seleção brasileira entra em campo"
-e poucas coisas me alegraram
tanto na vida.
Virar adulto significa, entre outras coisas, dar menos importância a um jogo de futebol do que
aos indicadores sociais que nos
colocam entre os países mais
atrasados e injustos do mundo.
Virar adulto, em suma, não é
nada fácil.
Liga dos amigos
Ao longo do Brasileirão, vários paulistas passaram pelas
primeiras colocações. Agora,
que é a "hora do vamos ver",
só o valente São Caetano já
está garantido na próxima fase. Outros cinco times do Estado (São Paulo, Ponte Preta,
Palmeiras, Santos e Lusa) se
acotovelam para chegar lá. O
curioso é que eles já têm vaga
assegurada na Liga Rio-SP,
da qual o São Caetano foi excluído. E é assim que querem
"moralizar" nosso futebol.
Balança mas não cai
A pergunta que não quer calar: o Flamengo corre perigo
de ser rebaixado? Meu palpite
é que não. O rubro-negro deve conseguir nos últimos jogos os pontinhos salvadores.
Se isso não acontecer, o mais
provável é que se invente de
"começar do zero" o campeonato do ano que vem. De
todo modo, o clube de maior
torcida do país dificilmente
cairá para a "segundona".
E-mail: jgcouto@uol.com.br
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