São Paulo, sexta, 18 de setembro de 1998

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FUTEBOL
Dirigentes promovem mudanças em estatutos e criam possibilidade de infinitas reeleições para ficar no poder
Clubes consagram "presidente eterno'

PAULO COBOS
JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
da Reportagem Local

Dos 24 clubes que disputam o Brasileiro-98, dez têm presidentes que foram reeleitos pelo menos uma vez ou estão no poder há mais tempo do que o previsto quando de suas eleições. Seis deles já mudaram ou estão tentando alterar os estatutos de seus clubes para ficar mais tempo no poder.
Mudanças na forma de eleição dos conselheiros, decisiva na escolha dos presidentes, e oposição enfraquecida são as principais armas dessas oligarquias para se perpetuarem no poder.
No Corinthians, que realiza sua eleição amanhã, o Conselho Deliberativo, dominado pelo grupo do presidente Alberto Dualib -que havia tomado posse em 1993-, modificou o estatuto em dezembro de 1994, em uma manobra que deu ao dirigente mais quatro anos no poder e criou a chance de um novo mandato por igual período.
Primeiro, a mudança adiou uma eleição que aconteceria em janeiro de 1995 para agosto de 1998.
Depois, aumentou o número de conselheiros de 300 para 400, um artifício para garantir a maioria dos votos para Dualib, que teria direito de nomear 205. Estes, junto dos atuais 95 vitalícios e dos 100 que seriam escolhidos na eleição, elegeriam o presidente.
Alegando que a situação, pelo novo estatuto, nomearia mais de 50% dos conselheiros, assegurando, independente da eleição, a continuidade de Dualib no poder, a oposição contestou na Justiça a mudança feita pelo Conselho.
No dia 15 de agosto passado, uma liminar impediu a realização da eleição pelo novo estatuto e obrigou a diretoria a adiá-la para amanhã, quando valerá o estatuto antigo, que prevê a escolha de 205 novos conselheiros.
Mas não é só Dualib que não quer largar o poder. O Guarani tem o mesmo presidente há 11 anos e o Vasco, há 16 anos -é o caso extremo (leia texto ao lado).
Para conseguirem isso, os dirigentes contaram com a ajuda da Constituição de 1988 e da Lei Zico, publicada em 1993. A Lei Pelé, que regulamente o futebol no Brasil e revogou, neste ano, a Lei Zico, é omissa sobre eleições nos clubes.
A Constituição acabou com o limite de uma reeleição nos clubes e liberou o tempo de mandato.
Já a Lei Zico indicava, e não obrigava, que as eleições deveriam acontecer em anos olímpicos ou no ano da competição mundial mais importante do futebol.
No Corinthians, a Lei Zico foi o recurso usado por Dualib em 1994 para prorrogar seu mandato.
Até em clubes com enormes problemas o desejo de continuar no cargo de presidente aparece.
No Atlético-MG, que tem dívidas superiores a R$ 50 milhões, a gestão de Paulo Cury está sendo investigada pelo Ministério Público de Minas Gerais.
Mesmo assim, Cury, em seu segundo mandato, faz articulações para alterar os estatutos do clube, que só permitem uma reeleição.
Deve conseguir, já que, segundo Manfredo Palhares, líder da oposição, Cury tem a maioria no Conselho, que abriga funcionários do clube indicados pelo presidente.
"Ele usa a máquina do clube para coagir os conselheiros, além de usar o Atlético-MG em causa própria", afirma Palhares.
Mesmo em administrações consideradas boas, como no caso do Palmeiras, a oposição reclama.
No clube paulista não existe um limite para reeleições, graças a mudanças nos estatutos feitas na gestão de Mustafá Contursi, atual presidente e no terceiro mandato.
Contursi também é favorito para as próximas eleições, marcadas para janeiro próximo.
"Logo, o clube não terá mais novas lideranças", afirma Seraphim Del Grande, ex-diretor de futebol do Palmeiras, que chegou a recorrer à Justiça contra as mudanças estatutárias.
Isso já acontece em alguns clubes, nos quais a oposição nem existe mais. No Vitória, que tem Paulo Carneiro como presidente desde 91, as duas últimas eleições realizadas, em 93 e 95, não tiveram chapa de oposição. Essa situação deve se repetir no final do ano, quando Carneiro poderá ser mais uma vez aclamado presidente.
Há casos opostos, em que a sede pelo poder ao menos respeita a rotatividade da presidência, como na maioria dos clubes do Sul do país e do São Paulo. Nesses, os estatutos não sofreram mudanças e só permitem uma reeleição.
"Tive oportunidade para mudar os estatutos no meu segundo mandato, mas acho isso antiético", diz Fernando Casal de Rey, presidente do São Paulo até abril.


Colaborou a Agência Folha, em Salvador



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