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FUTEBOL
Buenos Aires vê tragicomédia sobre carreira de astro
Maradona se torna vítima de seu talento em musical na Argentina
CAROLINA VILA-NOVA
DE BUENOS AIRES
É festa em Villa Fiorito: nasceu
"Pelusa". Em meio a casebres humildes, os moradores dançam e
cantam os feitos futuros do recém-nascido, com frases como
"dará alegrias a tanta gente de
barriga vazia" e "suas palavras
sem medo derrubarão mentiras".
"Pelusa" nada mais é que Diego
Armando Maradona e a cena faz
parte de "O Dez, entre o céu e o inferno", a auto-intitulada tragicomédia musical sobre a vida do ex-jogador de futebol argentino, que
estreou na última semana em
Buenos Aires.
"É a história de um menino cuja
única felicidade era jogar bola,
mas que comete o pecado de ser o
melhor", resumiu o jornalista Daniel Dátola, um dos autores da
obra e amigo de Maradona há
mais de 20 anos.
É também um projeto ambicioso. "A idéia foi estrear a peça na
Argentina e daí mostrá-la ao redor do mundo", explicou o produtor do espetáculo, Martin
Fried. Segundo ele, o musical custou US$ 500 mil.
O ex-jogador é sócio do projeto
e, segundo Fried, tem uma participação "importante" nos lucros
obtidos com a peça.
A história começa em 2042,
quando Diego Velho (o chileno
Franklin Caicedo), sozinho e
amargurado, assiste pela televisão
à cerimônia de abertura da Copa.
A partir daí, passa a correr sua
história -do Diego Menino
(Leandro Pereira), que chuta uma
bola ao céu para derrubar uma estrela para a mãe, ao astro do futebol, que coloca empresários em
apuros com exigências desmedidas para fechar contratos.
Num dos trechos mais aplaudidos pela platéia, um Maradona
descontente com a fama pede a
Deus -a quem chama de "Barbudo"- que o ajude a "voltar a
ser menino". "Me dizem que sou
o melhor do mundo, que sei eu?
Sempre pensei que os melhores
seriam felizes", lamenta, tirando
lágrimas da platéia.
O problema do ex-jogador com
a cocaína é abordado de maneira
metafórica. No quadro chamado
"Pesadelo", Maradona se vê preso
nos braços de monstros dos quais
não consegue se livrar.
O musical termina com um julgamento em que Maradona é
acusado "de dar alegria sem permissão aos corações submissos,
de praticar magia e enfeitiçar todo
um povo". Já os fãs são acusados
de "roubar o coração" do ídolo
"para colecioná-lo".
"Foi bárbaro. Amamos o Maradona. Realmente, para nós, argentinos, ele é uma parte de
Deus", disse a aposentada Lídia
Quiroga ao final do espetáculo.
"A parte de que mais gostei é a
que o acusam, dizendo coisas que
ele nunca disse. Ele nasceu numa
villa, teve pouco estudo, mas esteve contra a corrupção, contra tudo", disse ela.
"Não creio que seja uma obra
complacente", comentou Dátola.
"Diego exibiu seus erros e alguns
desses erros são os que foram usados na obra para podermos dramatizar parte dela."
Questionado se a obra apresenta Maradona como vítima, Emilio
Bardi, que faz o jogador na fase
adulta, devolveu a pergunta.
"A você não parece que é uma
vítima? Maradona foi vítima dele
próprio, vítima de seu talento, vítima de ser um tipo que diz e faz
tudo o que vem na telha", disse,
ao fim da apresentação, ainda
vestindo a camisa dez.
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