São Paulo, Sexta-feira, 19 de Fevereiro de 1999
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VÔLEI
Times recorrem ao trabalho de profissionais para traçar perfis individuais e instigar espírito de grupo nos atletas
Psicólogas vão à quadra na Superliga

JOSÉ ALAN DIAS
da Reportagem Local

Disseminada no futebol, a ponto de a seleção brasileira incluir uma profissional da área em sua comissão técnica, a psicologia aplicada à área esportiva se expande nas equipes da Superliga de vôlei.
É o retorno do recurso que esteve sob evidência, na modalidade, com a equipe campeã olímpica em Barcelona-92 -orientada pela psicóloga Regina Brandão, hoje prestando serviço ao futebol dos rivais gaúchos Inter e Grêmio.
Olympikus, o líder invicto, Ulbra-Pepsi, campeão da última temporada, Unincor, sexto colocado, e Coop/Santo André, décimo no geral -entre 12 concorrentes- são, no masculino, os que trabalham com o recurso. Leites Nestlé, não com psicólogo, mas via dois consultores empresariais, marca o feminino.
O que norteia essas incursões é a criação ou a ampliação do chamado ""espírito de grupo", indispensável em esportes coletivos.
"Rescaldado" -o termo é usado por Renan dal Zotto- pela campanha fracassada em 98, o técnico do Olympikus trabalha pela primeira vez com uma psicóloga. "Fui atleta e sei que o emocional muitas vezes faz a diferença entre botar a bola no chão ou não", diz.
O treinador não mais esconde que as dificuldades para controlar um grupo de estrelas como Carlão, Nalbert, Milinkovic, Maurício e Giba, no ano passado, foram decisivas para a busca do apoio.
Na preparação para a atual temporada, a psicóloga Paula Almeida aplicou aos 14 atletas, mais comissão técnica, um teste de 180 perguntas -o exame é usual em empresas-, a partir do qual pôde traçar perfis individuais dos atletas.
Com jargões da área, refere-se ao sujeito que perde o controle facilmente (colérico), que se mantém calmo (fleumático) etc.
Depois, com observação de partidas e treinos e de posse dos testes, elabora o perfil do grupo.
""Lidar de forma superficial com uma pessoa no dia-a-dia é uma coisa. Saber até que ponto ela pode chegar está muito distante. Há atletas que, quando erram, aceitam o palavrão bem. Outros, em vez de aumentarem o rendimento, se apagam", diz Almeida.
""O Marcos (Milinkovic, remanescente do antigo elenco) é um exemplo de atleta com o qual você pode ser incisivo. Ele rende bem quando cobrado. Com o Nalbert, o tratamento deve ser outro."

Metodologia
Reuniões e dinâmicas de grupo -nas quais são ""trabalhadas", com ajuda de exercícios, atitudes como concentração e controle da ansiedade- se incorporaram aos times que apelam à psicologia. Mas os profissionais afirmam que a influência não chega ao veto ou à escalação de jogadores.
""Se o relacionamento fora da quadra for bom, tanto melhor, mas não tenho obrigação de ser amigo de todo mundo. Dentro de quadra, sim, temos de nos relacionar o melhor possível", diz Nalbert, capitão do Olympikus e da seleção brasileira.
Há dois meses no Ulbra-Pepsi, Maria Alice Targa, psicóloga com especialização em grupos humanos, preferiu não traçar perfis individuais (""o elenco não precisava, ele é muito coeso"), embora também priorize os chamados ""grupos de sentimentos" -reuniões com atletas e comissão técnica.
"O trabalho não é só de motivação. Nesses encontros, os jogadores apresentam as queixas, discutimos por que determinadas coisas não deram certo", diz Targa.
De acordo com ela, é característico do ser humano, quando acossado ou proibido de se expressar, apresentar reações como o boicote a um parceiro ou ao grupo. Em outros casos, há desvios psicossomáticos (reações orgânicas produzidas por influências psíquicas), como predisposição a contusões.
"Se eu não falo com o guri ao meu lado, dificilmente vou passar a bola para ele", declara Targa.
Inscrito na Superliga somente no dia final do prazo, com 3 vitórias em 14 jogos, o Coop/Santo André retoma nesta semana o acompanhamento iniciado em 98, quando era patrocinado pela Philco.
""O mérito desse trabalho é que os jogadores suportam melhor a pressão. Ficamos sem patrocínio, só recebemos quatro reforços já na quinta rodada, e, mesmo assim, o grupo não rachou", diz o técnico Wagner Coppini, o Wagão.
A equipe mineira do Unincor tem uma psicóloga para a equipe e outra só para o meio-de-rede Bocão -que teve a carreira afetada por envolvimentos com drogas.


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