São Paulo, domingo, 19 de junho de 2011

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Pé no chão

Maratona de São Paulo mostra como atletas amadores e de elite pisam diferente nas corridas , o que gera discussão de especialistas

DANIEL BRITO
RODRIGO MATTOS
DE SÃO PAULO

De sapato social preto, Paul Tergat encosta a parte externa do meio de seu pé direito no chão para mostrar como iniciava cada pisada em seu tempo de corredor da elite mundial do atletismo.
"A maioria dos atletas [de alto nível] corre assim. Se você pisar primeiro com o calcanhar, tem que fazer mais esforço e fica cansado", diz o ex-corredor, 42, cinco vezes campeão da São Silvestre.
Em um telão ao seu lado, o ex-recordista da maratona aparece correndo com crianças brasileiras em uma pista de atletismo. Na maioria das fotos, elas usavam o calcanhar para iniciar sua pisada.
A postura é majoritária entre corredores não profissionais no Brasil e no exterior.
A diferença na forma de correr entre atletas de elite e amadores poderá ser vista na Maratona de São Paulo, hoje, a partir das 8h. E tem gerado discussão entre técnicos, médicos e fabricantes de tênis.
Com o lançamento do livro "Nascido para Correr", de Christopher McDougall, de 2009, cresceu o movimento que defende que a forma natural do homem correr é como a dos atletas de elite: pisada com o meio do pé, maior número de passadas e leve inclinação para a frente. A publicação prega que é assim que se corre descalço.
Há um estudo de Harvard que indica que essa postura causa menos impacto no corpo. Mas não há pesquisas científicas que provem se uma das duas formas de correr causa menos lesão.
"Essa pisada com o calcanhar começou no boom da corrida nos anos 70. Aumentou o público, os atletas novatos não tinham instrução e desenvolveram essa corrida meio sentada, como uma marcha", declara Lauter Nogueira, treinador de atletas de elite e amadores.
Segundo ele, os iniciantes queriam mais conforto, o que levou à fabricação de tênis com calcanhares maiores e mais amortecimento, que induzem à corrida "sentado".
"Estudos comprovam que a maioria das lesões nos amadores é por calçado mais alto. O tênis grande demais diminuiu o equilíbrio", afirma o treinador Mário Sérgio Andrade Silva.
Mas essas opiniões não são consenso. Para empresas esportivas, não há provas de que seus produtos mudaram a corrida da população.
O coordenador de biomecânica de educação física da USP, Júlio Serrão, defende a pisada com o calcanhar.
"Corrida de calcanhar gera mais impacto, mas é mais econômica. Dá para ver claramente em estudos que eles [elite] tendem a fazer um contato de retropé [calcanhar]."
Sua tese contraria os atletas. "Claro que eles [atletas] têm uma visão bem simplista", declara Serrão.
"A primeira parte do meu pé que toca o chão durante a corrida é a central", diz Robert Cheruiyot, 32, tetracampeão da Maratona de Boston, que correrá hoje em SP.
Outra polêmica é a corrida descalça. Certos atletas de elite fazem alguns treinos sem tênis para estimular os músculos. E o movimento de descalços nos EUA defende que, ao tirá-los, é mais fácil correr com o meio do pé.
Mas técnicos pregam cautela. Dizem que há músculos atrofiados que podem gerar lesão, perigos nos solos e necessidade de adaptação lenta. Só os acostumados a estar descalços teriam facilidade.
É o caso de Tergat, que começou a correr com tênis, mas, quando jovem, treinava em distâncias curtas descalço. Na carreira, corria, calçado, mais de 100 km semanais e pouco se contundia. "Tinha mais força na perna assim."


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