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FUTEBOL
O direito de xingar
MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA
No fundo , o tribunal que se
reúne hoje à tarde na rua da
Ajuda, Centro do Rio, não vai se
pronunciar sobre as expressões
"puta que lo pariu" e "concha tu
madre". A Quarta Comissão Disciplinar do STJD vai responder, a
rigor, se o jogador mais caçado
pelos botinudos do país tem o direito de se defender.
O acusado é o corintiano Carlos
Tevez. Conforme a súmula assinada por Anselmo da Costa, o
atacante foi o autor dos palavrões
na derrota para o São Caetano.
Eventual condenação dá gancho
de duas a seis partidas.
A punição de Tevez seria a vitória dos trogloditas que o agarram,
socam e chutam. Consagraria os
árbitros que permitem aos truculentos fazer do argentino um saco
de pancadas. À impunidade dos
agressores, se somaria a punição
do agredido. Quem é vítima já virou réu. Só falta ser condenado.
Tevez foi expulso ao se revoltar
contra o que considerou mais
uma falta não marcada. Segundo
o árbitro, disse (em portunhol)
"puta que lo pariu". Recebeu o
vermelho. Poderia ser um desabafo sem destinatário -a súmula
não informa se o atacante se dirigiu a Anselmo da Costa.
Posto na rua, soltou o "concha
tu madre". O apitador relata as
três palavras, mas não a frase na
qual estariam incluídas. Um jogador do Azulão contou que Tevez se referiu à mãe de Da Costa
como "piranha", o que não consta da súmula.
O atacante confirma que xingou, mas sustenta que foi xingado
primeiro. Um cartola do Corinthians pediu ao quarto árbitro
que registrasse a acusação de Tevez. O registro não foi feito. Árbitro que xinga jogador pode reprimir jogador que o xinga? E querem que Tevez dê a outra face...
O sábio dominicano São Tomás
de Aquino reconheceu como legítimo o direito à violência. Admitiu o tiranicídio. A autodefesa é
prerrogativa dos povos. A Carta
das Nações Unidas sacramentou
"o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva no caso de ocorrer um ataque armado".
No futebol, "ataques armados"
são os carrinhos, cotoveladas e
pontapés criminosos. Tevez pouco
reage. Explodiu no Pacaembu.
Outros teriam explodido antes.
Um palavrão é mais civilizado
do que um "puñetazo". Como indagou Nelson Rodrigues: "Como
jogar ou como torcer se não podemos xingar ninguém?". O racismo é exceção, caso de polícia dentro e fora do campo. Não se trata
disso.
A inveja, esse mal nacional, fez
de Tevez o alvo número 1 do rancor nos gramados. Repito: ele
apanha porque é craque, porque
joga com garra, porque é argentino e porque ganha bem. Também
paga por ter vindo no barco nebuloso da MSI. Nada tem a ver com
as tenebrosas transações.
É a garantia de brilho no Brasileiro sem Robinho. Não é por isso
que merece absolvição. Mas porque a lei não deve ser lida formalmente, e sim interpretada. Ela foi
redigida com o propósito de impedir a barbárie no futebol. Tevez
é vítima, não algoz. Sua condenação seria o triunfo do mal.
Homens do apito 1
É possível que a conferência de
Armando Marques para os árbitros tenha sido mesmo útil.
Só não consigo entender o motivo para transformar uma palestra técnica em (mais) uma
egotrip de caras e bocas.
Homens do apito 2
Na volta à Federação do Rio,
Eduardo Viana pôs Daniel Pomeroy na chefia dos árbitros.
Trata-se de um dos envolvidos
no escândalo da arbitragem fluminense há uma década. O denunciante, então, foi o agora
demitido Cláudio Cerdeira.
Passaporte
Posso estar enganado, mas a
única utilidade do amistoso da
seleção na Croácia parece ter sido assegurar uma vaga para Ricardinho na Copa.
E-mail
mario.magalhaes@uol.com.br
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