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FUTEBOL
Substituições
JOSÉ ROBERTO TORERO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Intocável leitor, introcável
leitora, dou-lhes meus pêsames. E faço isso porque certamente hoje você pensava que iria ler
neste espaço as saborosas palavras de Tostão, mas, para sua triste surpresa, eis que hoje ele não
pôde escrever e foi substituído por
este reles palpiteiro ludopédico.
Mas será apenas hoje. Na próxima partida, ou melhor, coluna, o
titular já estará de volta.
De qualquer modo, como tivemos esta substituição, falemos delas, as substituições.
Só na segunda metade do século
passado é que elas foram permitidas. Antes, se alguém se machucasse ou estivesse jogando mal,
azar de seu time.
Atualmente, porém, temos o
banco de reservas, espaço mitológico que às vezes se assemelha a
um céu e outras, ao inferno. Inferno para os que lá tem que ficar.
Céu para o torcedor, quando sai
de lá algum anjo que marca o gol
da vitória.
E a palavra banco é ambígua
por natureza. Pode ser o banco
dos banqueiros ou o banco dos
mendigos. Pode ser o Central ou o
dos réus.
Mas, no futebol, banco é mesmo
o lugar dos reservas, aqueles pobres expectadores que assistem ao
jogo de uma posição rente ao gramado, de onde só vêem tufos de
grama e pernas cabeludas.
E há alguns célebres, como o goleiro Toinho, excelente reserva de
Valdir Peres. Toinho deve ter perdido a conta das vezes que voltou
para casa com a camisa lisinha e
sem manchas de suor.
Adãozinho, Ferreti, Jair Gonçalves, Guinei, Dinei, Leto e Marcelo Passos também foram habilidosos jogadores que freqüentaram os bancos de seus clubes.
Mas o mais famoso dos gerentes
de banco foi Escurinho, astro daquele supertime do Internacional
da década de 70. Sua entrada era
quase sempre certeza de gol. Sua
entrada incendiava o time e enchia o torcedor colorado de esperança. Tornou-se ídolo jogando
apenas um tempo por partida.
Tratava-se de um grande jogador, porém, estranhamente, parecia jogar melhor quando entrava
nos minutos finais.
Atualmente, talvez o jogador
que mais se aproxime do fenômeno Escurinho seja Basílio, do Santos. Mesmo sendo reserva, ele já
tem 11 gols no Campeonato Brasileiro. Mas o seu caso é mais facilmente explicável. É que Basílio
tem como principal característica
a velocidade, e, assim, entrando
com os outros jogadores já um
tanto cansados, ultrapassa-os
com mais facilidade. Trata-se de
um velocista, não de um fundista,
e um bom técnico tem que saber
usar essa característica.
Aliás, as substituições ficaram
tão importantes que podem ser
consideradas um ramo do saber
desportivo. E, como qualquer ramo do saber, elas precisam ser
classificadas e divididas em categorias. Vamos a elas.
A eterna esperança: É aquela
substituição dada como certa e,
de certa forma, até esperada pelos
torcedores. O jogador, normalmente um atacante, costuma entrar no segundo tempo e deixar a
sua marca. Aí o técnico passa a
ser chamado de gênio, e o jogador
ganha fama de salvador. É o caso
dos já citados Escurinho e Basílio.
A grata surpresa: É aquela
substituição que ninguém espera,
mas que acaba rendendo mais do
que se imaginava. Por exemplo,
graças à contusão de Emerson, às
vésperas da Copa de 2002, vimos
o bom futebol de Kléberson. A comissão técnica deve ter derramado lágrimas quando viu que seu
titular não tinha mais condições
de participar da competição. Mas
Kléberson nos rendeu boas jogadas e até participou de gols decisivos, mostrando que ninguém é insubstituível.
Seis por meia dúzia: Infelizmente é a substituição mais freqüente no futebol dos nossos tempos. Um jogador é substituído por
um clone. Sai um zagueiro violento, entra um violento zagueiro.
Resultado? O jogo continua desinteressante, e nós mudamos de
canal.
Decepção certa: E, finalmente,
existe aquela substituição que,
mal vemos a placa nas mãos do
auxiliar, temos vontade de deixar
a arquibancada e voltar para casa. É aquela troca em que sabemos que o jogador reserva, por
mais que sue a camisa, nunca estará à altura do titular. Em geral
esta acontece quando o craque do
time se machuca, e aí o treinador
tenta segurar o resultado colocando aquele volante sem habilidade, mas voluntarioso. Tentei
pensar em algum atleta para
exemplificar essa situação, mas
nenhuma comparação me pareceu tão boa quanto esta aqui
mesmo. Ou seja, estar eu escrevendo no lugar do Tostão.
José Roberto Torero, 40, é jornalista,
escritor e cineasta
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