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Um vice de valor
Skate brasileiro obtém resultados que incomodam os EUA e, com novas ações locais, tenta se aproximar do surfe no país
JOÃO CARLOS BOTELHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um recorrente comentário na
imprensa esportiva brasileira, que
ser vice não tem valor no país, não
se aplica ao skate nacional.
Consolidado como a segunda
força mundial da modalidade, o
Brasil vem obtendo nesta temporada resultados que o credenciam
a rivalizar com os EUA, a principal potência do esporte.
Além disso, em termos de organização, uma antiga deficiência
da modalidade no país, com campeonatos agendados e desmarcados, algumas ações neste ano configuram um início de evolução.
Nesse aspecto, trabalha-se sempre sob a perspectiva de conseguir
se aproximar do que já alcançou o
surfe, o esporte de ação mais bem
estruturado no Brasil.
Nas competições internacionais, representantes do país lideram os rankings das duas categorias da Copa do Mundo de skate,
o circuito anual da modalidade.
Na vertical (em pistas geralmente em forma de ""u"), o primeiro colocado é Bob Burnquist,
que ganhou três das quatro provas disputadas até agora -a
quinta, na Flórida (EUA), tem término programado para amanhã- e possui grande vantagem
sobre o vice-líder. As três vitórias
foram seguidas.
Ex-morador da capital paulista,
Burnquist deu o salto de sua carreira ao se mudar para o Estado
da Califórnia (EUA). Em 1997, se
sagrou vice-campeão mundial e
foi medalha de bronze nos X-Games, do canal norte-americano de
TV paga ESPN.
No ano passado, não se saiu tão
bem, terminando em nono lugar,
mas foi medalha de ouro na estréia dos Gravity Games, o concorrente da rede de TV aberta
NBC para os X-Games.
Mais representativo, porém, é
que o bom desempenho não se resume a Burnquist.
A classificação atual da vertical
tem quatro brasileiros entre os
dez primeiros, mesmo número de
representantes da superpotência
EUA, onde o esporte se originou e
que conquistou, por exemplo, os
últimos três títulos mundiais das
duas categorias.
Além de Burnquist, Sandro Dias
é o quinto, Lincoln Ueda, o nono,
e Cristiano Matheus, o décimo.
A última etapa, em Vancouver,
no Canadá, teve o líder do ranking como o campeão, Dias em
terceiro, Matheus em quinto e
Ueda em sétimo.
""Estamos em alta", resumiu
Burnquist. ""Todo mundo está
preocupado com a gente." Para
ele, no entanto, a explicação disso
é uma coincidência: ""As fases de
todos estão boas".
Na street (em áreas planas com
obstáculos), em que os skatistas
do país costumam ter mais dificuldades para participar das etapas, a liderança também é de um
brasileiro, Carlos de Andrade.
Outro representante local, Rodil
de Araújo Júnior, o Ferrugem, já
foi duas vezes medalha de ouro
nos X-Games e conquistou a prata na estréia dos Gravity Games,
no ano passado.
Em relação a estrutura da modalidade no país, a Confederação
Brasileira de Skate encaminhou
no início de 2000, após ter completado um ano de existência, seu
pedido de filiação ao COB.
Para a primeira etapa do Circuito Nacional deste ano, no último
domingo, foi obtido o patrocínio
de uma marca de fora do mercado
do esporte, a bala Mentos.
Também foi contratada uma
empresa de assessoria de imprensa para realizar a divulgação das
informações sobre as sete provas
da competição e definida uma
parceria com o canal pago Sportv,
para a veiculação de um especial
sobre cada prova.
Dá para se ter a dimensão do
que é obter, num esporte radical
no Brasil, um patrocínio de fora
da sua própria indústria a partir
do exemplo do surfe.
Mesmo com a organização de
seu circuito assumida pela Abril
Eventos e com a veiculação de um
quadro semanal sobre a competição na TV Bandeirantes, de sinal
aberto, a edição deste ano começou sem um apoio de fora do
mercado do surfe.
No geral, porém, a distância entre as duas modalidades ainda é
grande no país. Um exemplo óbvio são os prêmios que os campeões das aberturas dos respectivos circuitos receberam.
Enquanto o surfista Fábio Gouveia embolsou R$ 10 mil por sua
vitória no mês passado, o skatista
Ferrugem faturou um quarto desse valor, R$ 2,5 mil, pelo mesmo
feito, no domingo.
O prestígio internacional para a
organização de eventos também
dá outra amostra. O Brasil recebe
ininterruptamente pelo menos
uma etapa do Circuito Mundial
de surfe desde 1986.
Já a prova nacional da competição similar no skate estreou no
país em 1998, como etapa de demonstração. Apenas no ano passado, passou a valer pontos. Nesta
temporada, volta a encerrar o circuito, em novembro.
""O surfe é uma escola para a
gente", definiu Márcio Tanabi, da
Skateboard Contest, empresa responsável pela organização do Circuito Brasileiro. ""Usamos como
base itens que vão desde o formato das competições até a relação
com as empresas."
Sobre o patrocínio da bala Mentos, Tanabi revelou que deve ser
fechado um contrato para todas
as etapas do circuito, o que seria
algo inédito.
Para o atleta Burnquist, o mercado nacional da modalidade ainda tem muito a evoluir. ""Falta um
melhor relacionamento com as
marcas internacionais", afirmou.
Com isso, ele acredita que os
skatistas de ponta são prejudicados, já que não existem filiais brasileiras das principais empresas
para patrociná-los.
Se estivesse morando hoje no
país e patrocinado por marcas locais, Burnquist acha que não conseguiria a mesma remuneração
que obtém nos EUA. ""Estaria
muito distante", avaliou.
Um último fato importante sobre sua representatividade é o interesse que o skate desperta no
público local. Na abertura do Circuito Brasileiro de 2000, num ginásio de Curitiba, cerca de 3.000
pessoas acompanharam a fase final da prova, sem pagar ingressos.
O vôlei, uma modalidade que já
deu uma medalha de ouro olímpica ao Brasil, levou, em média,
1.000 pessoas por partida aos ginásios na última Superliga Nacional, com uma política que mescla
entrada gratuita e cobrança de
um valor médio de R$ 2,50.
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