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Luiz Zveiter, figura mais influente da Justiça desportiva, pede desculpa por viradas de mesa
A única instância do futebol
Guilherme Pupo/Folha Imagem
![](../images/s2005200301.jpg) |
Luiz Zveiter, presidente do STJD, no centro do gramado da Arena da Baixada, em Curitiba, onde participou do 1º encontro dos tribunais de Justiça desportiva |
Presidente do STJD se diz desgostoso com o jogo e sacode o Brasileiro ao alterar resultado do campo no tapetão e ameaçar indisciplinados com multa pesada
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FERNANDO MELLO
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA
O homem que tem o poder de
decidir campeonatos, de impugnar regulamentos e de calar cartolas, técnicos e atletas se diz desiludido com o esporte que comanda.
Luiz Zveiter, 48, viúvo, não gosta de ir ao estádio. Orienta os quatro filhos a ficarem longe da violência dos campos brasileiros.
Afirma ter saudade de um futebol
com menos interesses comerciais.
Palco de alguns dos maiores escândalos do futebol nacional
-como o caso Ivens Mendes,
que escancarou a corrupção na
arbitragem- e conivente com as
viradas de mesa dos últimos campeonatos, o Superior Tribunal de
Justiça Desportiva, órgão presidido por Zveiter, voltou à cena no
início deste Brasileiro ao mudar
no tapetão resultados do campo.
Com as instâncias estaduais esvaziadas pelo novo calendário e
uma relação simbiótica com a toda-poderosa CBF (negada pelos
dois lados), o STJD segue como
um tipo de foro único do futebol.
A diferença para o passado, segundo Zveiter, é que o tribunal é
outro. O juiz carioca se desculpa
por viradas de mesa e diz que, na
nova ordem do esporte, não há
espaço para ações oportunistas.
Nesta entrevista, Zveiter promete não permitir mudança nas
regras, mesmo que seu Botafogo
não suba para a Série A. Refuta a
fama de proteger times do Rio. E
conta como deixou de ser um magistrado anônimo para agitar o
esporte mais popular do país.
Folha - Como começou a ligação
do senhor com o futebol?
Luiz Zveiter - Era advogado e integrava o tribunal do vôlei. Em 96,
o Ricardo Teixeira me chamou.
Eu não o conhecia, e o Carlos Arthur Nuzman, que presidia a Confederação de Vôlei e era meu
cliente, me indicou.
Folha - O sr. costuma ir a estádio?
Zveiter - Não.
Folha - Deixa seus filhos irem?
Zveiter - Também não. Eu sou
da época em que o futebol era paixão. Chorei muito no Maracanã
quando o Botafogo perdeu para o
Flu, em 1971. O futebol perdeu o
ar desportista. Começaram os interesses financeiros, e eu me desiludi. Tem a questão da violência, a
torcida agride. Fui desabituando.
Folha - Quando foi ao campo pela
última vez?
Zveiter - Há uns dois anos, para
ver Botafogo x Juventude.
Folha - O sr. é mais importante
que muito craque em algumas decisões. Como vê isso?
Zveiter - Os grandes artistas do
futebol são os atletas. Eu, os tribunais, os dirigentes tínhamos que
ficar no anonimato. Somos forçados a intervir. Não sei se fazem
um regulamento ambíguo de
propósito. Sempre colocam umas
cascas de banana para alguém poder se beneficiar. Arrumam brechas na lei, como no Paulista-03.
Folha - A culpa dos holofotes sobre o sr. é dos dirigentes?
Zveiter - Pode ser. Não são os jogadores que tumultuam. Não são
eles que invadem campo. Para
ressurgir, tivemos que ir ao fundo
do poço. E o futebol já foi. Acho
que a nova legislação deve bolar
um regulamento, uma espinha
dorsal para todos os campeonatos. Sempre que muda, gera descrédito. Por que os estádios estão
vazios? O torcedor não acredita.
Folha - Os tribunais esportivos se
reuniram pela primeira vez neste
fim de semana. Em que podem contribuir para melhorar o futebol?
Zveiter - Fizemos um projeto para mudar o CBDF [Código Brasileiro Disciplinar do Futebol].
Abriremos uma cruzada antiviolência, usando imagens de TV para punir. Não é normal que um
atleta entre em campo só para fazer faltas. Faz 20 e fica impune. O
código, de 1985, é arcaico, feito
para atender a alguns setores.
Folha - Muitos apontam que o sr.
tem uma ligação umbilical com a
CBF. O que diz sobre isso?
Zveiter - É uma agressão não só
a mim, mas aos outros auditores.
O doutor Ricardo não é meu amigo. Fui à casa dele uma vez. Tenho
uma relação respeitosa com ele.
Fui indicado pelo doutor Ricardo,
mas não tenho vinculação a ele.
Folha - O tribunal teve participação decisiva em episódios que
mancham o futebol brasileiro. No
Brasileiro-97, Edmundo (Vasco) estava pendurado, tomou amarelo e
foi expulso na primeira final, mas
acabou liberado para pegar o Palmeiras... Não acha que a imagem
do STJD é ruim?
Zveiter - Tem de perguntar aos
auditores do tribunal especial, o
equivalente à atual Comissão Disciplinar. Não chegou ao STJD
porque não houve tempo. Julgaram o caso horas antes da partida.
Folha - Outro exemplo são as
constantes viradas de mesa. A Copa JH foi feita pelos clubes. Em
1999, Fluminense e Bahia não estavam na elite. Não seria natural que
eles disputassem a segunda divisão em 2001, quando o Nacional
voltou para a CBF?
Zveiter - Se formos rever só os
erros do passado e viver deles, não
vamos progredir. Que tudo tenha
servido de experiência. Os desmandos eram diferentes há cinco
anos. Por que não fez naquela
época? Daqui para a frente, a regra é essa. Se aconteceu, paciência, que sirva de lição. Podemos
nos penitenciar de alguns equívocos, mas estamos procurando
acertar. A prova é que Botafogo e
Palmeiras estão na Série B. Se não
subirem em campo, ficarão lá.
Folha - Muitos dirigentes têm medo de uma repetição neste Nacional do caso Gama, por causa do uso
de uma regra já cassada pela CBF.
Neste caso, o Inter perderia os dois
pontos que ganhou no tapetão,
com a punição à Ponte Preta. O sr.
tem o mesmo temor?
Zveiter - Não tem caso Gama nada. Não temos medo. Até a edição
da Lei Pelé, a CBF tinha poder para modificar alguns artigos do
CBDF por resolução de diretoria.
Até aí a CBF podia tudo. A partir
de 1998, as alterações tinham que
ser feitas pelo Conselho Nacional
do Esporte. Tudo o que existia antes, vale. O que vem depois, não. A
CBF não pode revogar nada. Por
isso o STJD decidiu não punir o
clube que utiliza jogador irregular
com a perda de cinco pontos.
Folha - Mas, se houver brecha, os
times vão ao tapetão...
Zveiter - Tem uns grupinhos de
cartolas que não querem enxergar
uma nova realidade no futebol
brasileiro, com ética, princípio de
moralidade, credibilidade. Esses
podem ir à Justiça comum. Mas
que fiquem advertidos. Se o fizerem, seus clubes serão prejudicados. O tribunal não comporta
mais esse tipo de atitude.
Folha - Os clubes fogem da punição usando laranjas. O que garante
que isso não voltará a ocorrer?
Zveiter - Qualquer pessoa pode
ir à Justiça. O clube se sente prejudicado, vai a um sindicato que o
representa e ganha uma liminar.
Se o clube a utiliza, passa a ser beneficiário, co-autor. A CBF tem a
obrigação de punir com rigor. Se
no passado ela não o fez, não quero julgar questões políticas. Hoje a
CBF está consciente de que não
pode mais se prestar ao papel de
se curvar a quem quer que seja.
Folha - Por que o STJD nunca puniu quem usou laranja? O Gama,
por exemplo, foi ao PFL-DF e se valeu da liminar para ficar na elite.
Zveiter - Quem tem que responder é a CBF. É ela quem tem poder
para oficiar a Fifa e pedir punição.
Folha - O que mudou de 1999 para cá no STJD que o faz ameaçar
com tanta veemência quem for à
Justiça comum?
Zveiter - Eu não estava no tribunal na época. Nós temos instrumentos. Determinaremos à CBF
que ela oficie a Fifa. Se ela não o fizer, afastaremos sua diretoria.
Folha - O sr. já foi acusado de
bairrista e de proteger os times do
Rio. O escritório da família Zveiter
defendeu clubes cariocas, por
exemplo o Vasco no caso Dener.
Não acha isso antiético?
Zveiter - Sou magistrado, o escritório segue atuando. E nunca
atuei em processos do escritório.
É questão de foro íntimo. Não vejo problema. É só ver quantas vezes o Vasco ganhou no tribunal.
Minha vida é aberta.
Folha - Por que Armando Marques, chefe da Comissão de Arbitragem da CBF, não foi punido pela
alteração da súmula de Caxias x Figueirense, pela Série B-2001?
Zveiter - Não tenho base para dizer isso. Estava ausente do país
por motivos particulares. O STJD
julgou e entendeu que não havia
elementos para provar que ele pediu a adulteração da súmula.
Folha - Seu filho Flávio Zveiter
não concluiu a faculdade de direito
e, aos 19 anos, já era auditor do
STJD. Não acha isso antiético?
Zveiter - Não. Ele continua lá e é
um grande auditor. É só perguntar aos clubes de São Paulo. O filho do desembargador Paulo César Salomão também faz um
grande trabalho. Eles têm notável
saber jurídico na área esportiva. É
o que basta para estar na lei. Só tive elogios. Dele e do Paulinho.
Continuam e vão continuar. Tem
uma coisa que tem que ser dita.
Nenhum de nós recebe um tostão.
Folha - A que se deve o ato altruístico de trabalhar de graça?
Zveiter - Eu gosto do esporte.
Acho que todo brasileiro que ama
o esporte gostaria de ter tido a
possibilidade de contribuir para
sua melhoria. Nossa satisfação
não passa pela remuneração.
Folha - O que se faz do dinheiro
das multas impostas pelo STJD?
Zveiter - Vai tudo para a CBF.
Toda a verba destinada a suprir os
funcionários, o material, é pago
pela entidade. Essas multas têm
que ser revistas. Poderiam ser revertidas para o Fome Zero. Vamos aumentar as multas. Se mexer no bolso do atleta, ele vai pensar antes de usar a violência. Multa de R$ 30 é irrisória para quem
ganha R$ 200 mil. Se colocar 50%
do que ele ganha, o governo vai
comprar muito leite.
Folha - O sr. teve o nome envolvido no caso do "vôo da alegria", em
que foi convidado para ver a Copa-98 sem custos. Voltaria a viajar se
fosse convidado?
Zveiter - Fui porque era presidente do tribunal naquela época.
Fui convidado pela Fifa, não pela
CBF. Não recebi favor. Mas não
aceitaria outro convite.
Folha - Pretende ingressar na política, como seu irmão, Sérgio, que
é secretário de Justiça do Rio?
Zveiter - Sou magistrado, não
posso. E não tenho vocação.
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