Vim para trabalhar, mas quero ver a seleção jogar seu alegre futebol

NO TREM entre Munique e Dortmund, lembro que vim para a Alemanha com a sensação de que viajava para a Copa da Espanha, em 1982. Veria um time brasileiro que faria o mundo festejar um futebol de sonhos, independentemente do resultado. Mas a sensação mudou. Eu não estava em Munique. Estava em São Francisco, em 1994. Só o resultado interessa. Às favas com o espetáculo, que futebol não é divertimento. É indústria que só valoriza quem ganha. Não importa se com espetáculo feio, porque futebol não é teatro e técnico não é maestro. Músicos não habitam os gramados.
No trem, ouço as Bachianas de Villa-Lobos e Pixinguinha, entre tangos de Piazzola e um pouco dos Beatles. Mistura tão heterogênea como envolvente e emocionante.
Penso na timidez do genial Ronaldinho, no recital argentino diante de Sérvia e Montenegro, no burocrático futebol que os ingleses mostraram até agora. E me pergunto: por que Ronaldinho não se solta, por que Robinho não joga desde o começo, por que Zé Roberto não está no lugar de Roberto Carlos e Juninho no dele? Por que Riquelme, Saviola e Sorín jogaram sorrindo e Messi e Tevez concluíram o show às gargalhadas? Por que Beckham, Lampard, Owen e Gerrard andam tão econômicos? Por que Lúcio aparece mais que Ayala e que Terry, que são muito melhores que ele?
De que têm medo os ingleses e os brasileiros, se os argentinos, mais chegados ao drama que ao samba e à cerveja, bailam na Alemanha, milongueiramente?
Sim, vim para a Alemanha para trabalhar, não para me divertir. Mas é frustrante estar entre 66 mil pessoas no impressionante Estádio de Munique, que mais parece um óvni num cenário futurista cercado de "moinhos" de energia eólica, e não encontrar nenhum Don Quixote dentro de campo que nos permita sonhar o sonho que a globalização, também do futebol, luta para tornar mesmo impossível.
Não faço questão de ir até Los Angeles e nem peço muito. Só quero ver a seleção jogar o alegre futebol brasileiro.