São Paulo, sábado, 20 de julho de 2002

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FUTEBOL

A doce tirania da TV

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Com o imbróglio em torno do Caxias, ainda não sabemos nem quais são os times que participarão do Campeonato Brasileiro deste ano, que começa no próximo dia 10.
Essa pendenga político-jurídica diz muito sobre problemas crônicos dos bastidores desorganizados e desmoralizados do nosso futebol.
Mas o que levanta questões novas e delicadas é a atual discussão sobre o calendário do futebol brasileiro do ano que vem.
Ao que tudo indica, virá finalmente a estrutura de campeonato nacional defendida por nove entre dez comentaristas e amantes do esporte: um torneio longo, com turno e returno, decidido em pontos corridos.
Em vez de fórmulas mirabolantes tiradas do bolso do colete, um sistema simples, de equanimidade indiscutível, que é seguido há décadas com sucesso pelos campeonatos nacionais europeus.
Sou plenamente favorável a um Brasileirão nesses moldes.
Quem gosta de mata-mata continuará contando com a Copa do Brasil, que a meu ver deve também ser fortalecida e saneada de seus resquícios de politicagem e irracionalismo.
Nesse novo calendário, a par do reforço dos dois grandes torneios nacionais, seriam extintas aberrações como a Copa dos Campeões e enxugados os campeonatos estaduais e regionais.
Sou, em princípio, a favor de tudo isso.
Estaria tudo bem, portanto, se não houvesse um "pequeno" problema.
Essas mudanças iminentes não são fruto de um consenso gerado por uma discussão entre todos os interessados (clubes, federações, representantes de torcidas, poder público, TVs), mas sim resultado da decisão unilateral de apenas um desses setores, a televisão. Aliás, de uma única emissora, o que é muito pior.
Pode parecer uma picuinha, uma "birra de eterno descontente", mas não é.
Aceitar comodamente um fato que nos é imposto -só porque, circunstancialmente, essa imposição condiz com o que queremos- significa dar um passo atrás no caminho do amadurecimento, do livre-arbítrio, da participação democrática, da cidadania ou do nome que se queira dar.
Submeter-se à tutela de uma emissora de TV, por mais que essa tutela às vezes pareça benfazeja, é como entregar a um caudilho as prerrogativas de "pai do povo".
Só seremos uma democracia madura quando não admitirmos que ninguém -seja um tirano, um partido ou uma emissora de TV- decida por nós o que devemos fazer, ver, ouvir ou pensar.
Transigir com a doce tirania da Rede Globo, mesmo que seja só "quando ela faz a coisa certa", é um equívoco análogo à velha ilusão da esquerda de que poderia manipular um líder populista (Getúlio, Jango ou equivalente) para fazê-lo tomar as medidas que interessavam ao "povo".
Nessa perspectiva deformada, o velho projeto furado de "tomada do poder" -inspirado no modelo da Revolução Russa de 1917- é substituído pela idéia igualmente falsa de que, se colocarmos "gente boa" na direção da Globo, esta fará o país andar na direção certa.
Ora, dificilmente poderá ser chamado de democracia um país em que uma emissora de TV fabrica e destrói políticos, define os padrões morais, estéticos e de consumo da sociedade e, como arremate, decide sobre o jogo dos nossos times.

Rivaldo e Riquelme
Parece que o Barcelona está discretamente forçando a saída de Rivaldo. A alternativa apresentada ao jogador é sua naturalização espanhola, para dar espaço ao novo estrangeiro contratado, Riquelme. Não dá para saber o que vai acontecer, mas seria muito bom ver Riquelme ao lado de Rivaldo, completando com Saviola e Kluivert uma das linhas de frente mais infernais que se pode imaginar.

Sucesso do Azulão
A chegada espetacular do São Caetano à final da Libertadores traz de volta a velha pergunta sobre as razões do sucesso de um clube tão jovem e relativamente modesto. Muitas dessas razões são imponderáveis: a boa fase de alguns atletas, os inúmeros acasos que cercam cada jogo. Outras são muito claras: salários em dia, política prudente de contratações e treinador há quatro anos no cargo.

E-mail jgcouto@uol.com.br



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