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BASQUETE
Os Germans
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
O torneio era de exibição,
não fazia parte da programação oficial. Mas a diretoria da
Associação Cristã de Moços de
Chicago percebeu o caráter notável do evento e não poupou investimentos. Para fazer jus ao recém-conquistado título nacional, encomendou até um tênis especial,
com cravos no solado. É que, atipicamente, as partidas seriam ao
ar livre, em quadras de saibro.
Por dois meses (um luxo à época), os jogadores treinaram com o
novo calçado, adaptando-se ao
peso e à aderência extras.
Veio o campeonato, e, nas quatro primeiras rodadas, o engenho
funcionou. As equipes de Nova
York, São Francisco e Saint Louis
(duas) escorregaram da terra para o vestiário, humilhadas pelo
adversário mais bem equipado.
Mas, no quinto jogo, justamente o que valia a taça, deu chabu.
Uma tempestade cobriu a cidade e transformou a quadra em lodaçal. A organização não teve alternativa senão transferir a decisão para uma arena indoor.
Aqui, os relatos se confundem.
Uns dizem que os atletas de Chicago atuaram descalços no piso
de madeira do ginásio da Washington University. Outros, que
pediram tênis emprestados aos
mais condoídos espectadores.
Certeza há somente do placar:
39 a 28 para o Buffalo Germans,
que chegou ao Missouri como
azarão, mas que, abençoado pela
chuva, partiu, há exatos cem
anos, como vencedor do primeiro
torneio olímpico de basquete.
O triunfo surpreendente na
Olimpíada de St. Louis-1904 é o
cartão de apresentação do primeiro "Dream Team" americano.
Os Germans haviam surgido
nove anos antes, na zona leste da
gelada cidade industrial no interior do Estado de Nova York.
Fartos do desdém dos nativos,
filhos de imigrantes transformaram a sede da Associação Cristã
de Moços de seu bairro em uma
espécie de centro cultural alemão.
O basquete foi adotado pelos
meninos graças à influência do
diretor do clube. Ex-aluno de James Naismith (o inventor do esporte), Fred Burkhardt assumiu o
treino de um grupo de até 14 anos.
Aos poucos, os sete adolescentes
tomaram de assalto o circuito
amador da região, formado por
universidades, ACMs, quartéis
militares e clubes de campo.
Obedecendo a um curioso rodízio -sempre um garoto ficava de
fora da partida, para não prejudicar seus estudos-, eles colecionaram êxitos até receber o convite
para os Jogos de St. Louis.
Naquele mesmo 1904, uma vez
autodeclarados "campeões mundiais", resolveram se profissionalizar e tentar a América. Ao longo
de 29 anos, acumularam 761 vitórias, contra apenas 85 derrotas.
Chegaram a construir, de 1908 a
1911, uma invencibilidade de 111
partidas, registrando em média
54 pontos ante 18 dos oponentes.
Os "Alemães" mereceram o reconhecimento do Hall da Fama
do basquete -são um dos quatro
times eleitos para o memorial.
Mas jamais conseguiram demolir
a barreira da xenofobia. Buffalo
preferia babar pela equipe municipal de ciclismo, os Ramblers. E
nas outras ACMs da cidade a recreação predileta era o vôlei.
Sempre o vôlei!
St. Louis 1904 1
O German calçava o modelo básico da Spalding (US$ 1 o par, à época) com meiões e vestia camiseta de manga comprida e gola rulê.
St. Louis 1904 2
A primeira Olimpíada fora da Europa havia sido originalmente
agendada para Chicago. Mas o lobby da agroindústria algodoeira
atraiu a bênção do presidente Roosevelt para a efervescente cidade à
margem do rio Mississippi, à época a quarta mais populosa dos EUA.
St. Louis 1904 3
Os Jogos lançaram as medalhas de ouro, prata e bronze. Os EUA conquistaram 77 das 95 provas. Sua grande estrela, o ginasta George Eyser, seis vezes medalhista, tinha a perna esquerda de madeira.
E-mail melk@uol.com.br
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