São Paulo, segunda-feira, 20 de novembro de 2006

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JUCA KFOURI

Muricy Ramalho, o Telezinho


O diminutivo não é para diminui-lo. É apenas uma maneira carinhosa de homenagear um campeão


A COMPARAÇÃO cabe. E não cabe. Explique-se.
Não cabe porque Muricy está no começo de sua carreira como técnico.
Mas cabe por uma porção de outras coisas.
Por exemplo: já houve quem quisesse ver nele o perfil de perdedor, mais essa bobagem importada dos Estados Unidos que divide o mundo entre "winners" e "loosers", vencedores e perdedores.
Telê Santana também provou deste fel, até calar a boca dos coitados, como Abel Braga também os calou na Taça Libertadores.
Há agora quem queira rotular José Roberto Guimarães do mesmo modo, mas aí é mera má fé com o primeiro técnico a levar uma equipe brasileira a ganhar uma medalha de ouro olímpica, para não citar as dezenas de outras conquistas.
Mas, voltemos a Muricy.
Como Telê, ele é avesso à promoção pessoal.
E tem na ponta da língua uma santa indignação, aquela ira dos justos que não suporta meias verdades, pior que muitas mentiras.
Porque as mentiras são fáceis de desmoralizar, enquanto as meias verdades precisam ser explicadas.
Muricy não quer dar aulas de jornalismo aos jornalistas.
Mas dá.
Dá ao dizer que as pessoas, em regra, não sabem nem 10% do que acontece dentro dos clubes.
E isso é verdade não apenas nos clubes, mas em geral.
Nós, jornalistas, em regra, sabemos, no máximo, a ponta do iceberg. E olhe lá.
Já Emerson Leão não sabe nem distinguir os cargos de revisor e de checador dentro de uma redação, mas deita falação.
E ignora que se houvesse um revisor no Corinthians ele nem poderia dar uma simples entrevista.
Já Vanderlei (atenção, revisão, com V, não W), ah, deixa pra lá...
Muricy, campeão pernambucano, gaúcho, paulista e brasileiro, não costuma deixar de cumprir seus contratos, por mais tentadoras que tenham sido as propostas para descumpri-los.
Já..., ah, deixa pra lá...
Muricy Ramalho tem dito que os técnicos são os lobos dos técnicos, sem nenhum pudor para se oferecer quando sentem uma oportunidade. Talvez devesse ter dito que são verdadeiros urubus.
E erra, é claro, numa ou noutra substituição, numa ou noutra escalação, como todos, como nós, até quando achamos que foi ele.
Não é, no entanto, do tipo que vive de criar caso com os atletas. Ao contrário, tem com eles a relação que os boleiros podem até às vezes não gostar, mas que respeitam.
Porque é perfeccionista como Telê, de quem foi auxiliar técnico, e obsessivo como Bernardinho, sempre voltado para o próximo desafio, até incapaz de curtir devidamente uma conquista.
Aliás, eis um cuidado que o técnico precisa adotar, porque tanta exigência consigo acaba por fazer mal e até a intolerância com as coisas erradas precisa de limites porque, em excesso, acabar por envenenar, como ficou demonstrado à exaustão no acidente vascular de Telê.
Muricy precisa aprender a relaxar, a rir dos outros - e de si mesmo.
Este São Paulo tetracampeão deve muito a ele como peça essencial de uma estrutura que já pegou montada e não teve a pretensão de mudar, para dar a sua cara.
E que soube preservar numa hora dramática, como a perda, por detalhes, da Libertadores, em duas partidas memoráveis contra o Inter.
Deve ter sido muito difícil não sucumbir ali, não desmoronar como tantos que, por muito menos, não suportaram a dor de uma derrota.
Só que se há derrotas dignas de orgulho, e como há, são elas também que dão mais gosto às vitórias.

blogdojuca@uol.com.br


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