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FUTEBOL
Uma alegria para sempre
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Eu me rendo. A festa haitiana
para a seleção brasileira foi
comovente. Antes do jogo, eu havia colocado em discussão aqui a
utilização do futebol para fins político-diplomáticos, mas o que se
viu em Porto Príncipe transcende
claramente os quadros da política
imediata.
O delírio da população haitiana
que acompanhou o desfile da seleção em carro aberto foi algo tão
impressionante que me vieram à
mente imagens semelhantes de
uma visita de Chaplin à Rússia,
ou da primeira excursão dos Beatles aos Estados Unidos. São momentos em que algum tipo sublime e misterioso de comunicação
humana ultrapassa os limites da
ideologia e do mercado.
Hoje sabemos que a afeição popular pelos ídolos anda muito distorcida e banalizada, em decorrência da criação de celebridades
instantâneas, que desaparecem
com a mesma rapidez com que foram criadas.
Agora mesmo, estou presenciando uma manifestação do fenômeno no Festival de Cinema de
Gramado. Multidões de jovens
entram em histeria ao avistar o
galã da nova novela das seis, ou a
moça que participou do último
Big Brother. Há um curioso nivelamento, para não dizer uma inversão de valores. No mercado
das celebridades, a cotação de
uma Fernanda Montenegro pode
ser eventualmente menor que a
de uma Bárbara Paz, dependendo da novela que uma ou a outra
estiver estrelando.
Mas o que se viu em Porto Príncipe não tem nada a ver com a
mídia, o marketing, a indústria
da celebridade. Foi, até onde nos é
possível perceber, uma manifestação espontânea de afeto e admiração por artistas de verdade.
Para nós, que estamos habituados a acompanhar e até a exigir
um certo nível de excelência futebolística, talvez seja difícil imaginar o que sente um haitiano
diante de um Ronaldo, um Ronaldinho ou um Roberto Carlos.
Como me escreveu um leitor, dá
uma certa alegria pensar que enviamos ao mundo atletas extraordinários, em vez de bombardeiros.
Mesmo os EUA, que semeiam
pelo planeta suas bombas mortíferas e seus ameaçadores porta-aviões, e que inundam os cinemas
e as rádios do mundo com muito
lixo comercial, também nos mandam coisas sublimes, da música
de Miles Davis ao cinema de Orson Welles e Francis Coppola.
Ao fazer a jogada genial do terceiro gol contra o Haiti, Ronaldinho não era só gaúcho, nem só
brasileiro, não estava a serviço de
Lula, nem a serviço da ONU.
Era simplesmente um ser humano mostrando a outros seres
humanos as alturas a que nossa
espécie pode aspirar, quando se
desembaraça das mesquinharias
do dia-a-dia. "Homem comum
tocando o céu", como diz Chico
Buarque numa canção chamada,
apropriadamente, "Futebol".
Um momento de poesia como
aquele pode iluminar muitas vidas sombrias. Pois, para citar outro poeta, o inglês John Keats,
"uma coisa bela é uma alegria
para sempre". Valeu, Ronaldinho, artista do povo.
Disputa acirrada
Algumas surpresas no meio da
semana embolaram mais ainda
a tabela e impediram que o
Santos disparasse na liderança.
Isso é bom para o campeonato,
pois mantém a disputa acirrada. O interessante será observar
o desempenho e o fôlego dos times "médios" (Ponte Preta, Juventude e Goiás) na luta contra
os ex-campeões Santos, São
Paulo, Palmeiras e Atlético-PR.
Novas velhas caras
O jogo contra o Haiti obviamente não serviu como "teste",
mas algumas experiências foram interessantes, como a utilização de Magrão, Pedrinho e
Nilmar. O atacante do Inter foi
muito bem. Mas a melhor notícia da seleção, a meu ver, foi a
convocação de Robinho para o
jogo contra a Bolívia.
E-mail
jgcouto@uol.com.br
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