São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 2006

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SONINHA

O tempo, o detalhe e o conjunto


Em um jogo, um detalhe pode fazer a diferença; em um campeonato ou um ano, o que conta é o conjunto


EM UM prazo muito curto, a avaliação de um jogador pode ser completamente equivocada. Nas infames peneiras que oferecem dez minutos em campo para mostrar serviço, pode até ser que o brilho de um aspirante seja tamanho que ele receba a chance merecida, mas é provável que meninos com talento passem completamente despercebidos. E o brilho em meia dúzia de jogos, estamos cansados de saber, pode ser ilusório.
É a médio e longo prazo que se conhece um jogador. Um bom goleiro pode tomar um frango; um goleiro medíocre pode fazer um milagre. Um Romário pode, em péssimo dia, perder um gol feito como o Enilton; Enilton pode fazer um gol de Romário, mas nunca o será. O tempo diz.
A avaliação de um time também não pode ser feita em duas ou três rodadas. Um grupo desconjuntado que parecia caso perdido pode, com o tempo, tomar forma, como o Flamengo e o Botafogo (sem exageros na avaliação positiva, naturalmente). Um conjunto a princípio afiado e promissor às vezes desmorona e naufraga -como o Fluminense, barbada na categoria "expectativa frustrada" em 2006.
Se o objeto da nossa análise for uma partida de futebol, a coisa muda um pouco de figura. Porque ela não é decidida "no conjunto"; não é luta que se vença por pontos. Não adianta jogar bem 90 minutos; se o placar não for favorável, azar. O detalhe, o retrato de um instante, o erro de um e o acerto de outro podem mudar tudo. Essa possibilidade é, para alguns, o maior fascínio do futebol, esporte em que um time jogando mal pode vencer o que jogou bem. E assim passamos tardes e noites discutindo o tema da "justiça" nos resultados...
Um torneio pode até ser decidido nos detalhes, especialmente se for muito curto ou mata-mata. Mas não um de pontos corridos. Com a combinação de centenas de detalhes, já não se fala de acasos e infortúnios, mas do conjunto de uma obra...
Também o trabalho de um técnico só pode ser julgado após semanas, meses ou anos. O contrário do que costumamos fazer por aqui... Treinadores "estouram" e desaparecem, vão de um clube grande para o desemprego e o quase ostracismo para outro clube grande e o desemprego e o sumiço em ritmo vertiginoso; não há a construção de uma carreira, salvo raríssimas exceções -como Muricy Ramalho, campeão estadual por cinco anos seguidos por três times, quase campeão brasileiro em 2005, campeão brasileiro em 2006. Muricy foi subindo até chegar "lá".
Para encerrar esta pequena reflexão sobre detalhes e conjunto, curto e médio prazo, lembro que um clube também precisa ser avaliado ao longo do tempo. Uma administração pode ter resultados espetaculares em um ano e se revelar um desastre logo depois. Não é, evidentemente, o caso do São Paulo. Nos detalhes, nem sempre insignificantes, podem-se apontar defeitos -como o problema crônico da venda de ingressos no Morumbi, entre outros menos visíveis. Mas, no conjunto, a administração do São Paulo é muito melhor que a dos demais, e isso é demonstrado pelas suas conquistas.
Como lembrou a Folha ontem, nos 15 anos sem o título nacional o São Paulo conquistou 11 títulos oficiais internacionais. 11! Esse período foi entrecortado por crises, disputas políticas conturbadas e turbulências de vários tipos, mas o que prevaleceu foi a competência.
É curioso que, ao contrário do que acontece na maioria dos clubes, a presidência é regularmente colocada em disputa e há mudanças de pessoas, mesmo que vença o mesmo grupo político -mas há continuidade na "base", em funções como a do observador técnico Milton Cruz. Pode ser só um detalhe, mas é muito revelador do conjunto. Parabéns aos campeões. Que sirvam de exemplo.

soninha.folha@uol.com.br


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