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FUTEBOL
Francês Fontaine, que marcou 13 no Mundial de 58, considera Ronaldinho o mais completo e quer espetáculo
Falta ataque, diz maior goleador de Copas
LUIZ ANTÔNIO RYFF
da Reportagem Local
O francês Just
Fontaine, 64,
não é supersticioso. Ele adora
o número 13.
Foram 13 os gols
marcados em
seis jogos na
Suécia, em 58, que fizeram dele o
maior artilheiro de todas as Copas.
"Há sempre um 13 na minha vida. Minha casa é no número 13 da
rua", brinca.
Seu recorde comemora 40 anos
no próximo ano, e Fontaine pretende fazer uma grande festa no
dia seguinte às semifinais da Copa
da França, com os principais artilheiros dos mundiais.
Ex-técnico do Paris Saint-Germain e da seleção marroquina
-ele nasceu em Marrakech,
quando o país era colônia francesa- e membro do comitê organizador da Copa do Mundo, Fontaine acha que, em 98, a disputa será
equilibrada. E dá um alerta.
"Não se pode mais jogar a Copa
do Mundo achando que existem
jogos fáceis. Isso acabou."
Fontaine conhece bem o futebol
brasileiro. Cita Edmundo. "Dizem quem é um pouco louco, com
um caráter meio complicado, que
briga com juízes."
Pela seleção francesa, Fontaine
atuou 21 vezes e fez 30 gols. "E nenhum de pênalti", frisa. Seu ápice
foi na Copa de 58, quando jogou
com as chuteiras de seu reserva.
"Dois dias antes da Copa, minhas chuteiras arrebentaram. Meu
reserva me emprestou as dele. Foi
com elas que eu marquei os 13 gols.
Depois eu devolvi as chuteiras. Um
verdadeiro artilheiro marca gols
até descalço", diz ele, que se aposentou em 60 e hoje cuida de duas
lojas em Toulouse (sul da França).
Leia abaixo trechos da entrevista
por telefone concedida por Fontaine à Folha.
"Folha? Isso me lembra o Didi e
sua folha seca", brinca.
Folha - O sr. marcou 10% dos
gols da Copa de 58...
Just Fontaine - Eu não sabia
disso. Quer dizer que eu sou o senhor 10%? Pena que eu não tenha
tido comissão de 10% (risos).
Folha - Como explica a marca?
Fontaine - Não há segredo. Eu
jogava em uma equipe ofensiva, e
em 1958 todas as equipes jogavam
de maneira ofensiva.
Eu estava em plena forma. Havia
feito uma operação de meniscos
em dezembro. Antes da Copa, tinha marcado 34 gols em 26 jogos.
Fui o artilheiro do campeonato.
Aquele foi o meu ano.
Folha - Quais são suas lembranças mais fortes de 58?
Fontaine - Lamento ter pegado
o Brasil com dez jogadores apenas.
O nosso beque central (Jonquet) se
machucou, e tivemos que jogar
com dez (na época não eram permitidas substituições) por mais de
uma hora. O jogo estava 1 x 1 (terminou Brasil 5 x 2 França).
Se 11 contra 11 já era duro, com 10
era missão impossível. Se estivéssemos com 11 não sei dizer o que
aconteceria. Provavelmente, o
Brasil ganharia, pois era um grande time, mas menos facilmente.
As melhores lembranças que tenho são de ter sido o primeiro a
marcar um gol contra o Brasil, que
ainda não tinha tomado nenhum,
e ter feito 13 na Copa.
Folha - Muitos acham que Brasil
x França foi o melhor jogo da Copa. Era o melhor ataque (França)
contra a melhor defesa (Brasil).
Fontaine - Enquanto tínhamos
Jonquet, realmente foi um belo jogo. Depois, ficou desequilibrado.
O Brasil tinha uma equipe completa. Tinha uma defesa muito
boa, um bom goleiro, o que nem
sempre foi o caso, em se tratando
do Brasil. Djalma Santos e Nílton
Santos eram qualquer coisa...
O Brasil tinha dois apoiadores
muito técnicos e experientes, pois
Didi era capitão do Botafogo, e Zito era capitão do Santos. Tinha Pelé, que despontou na Suécia, e
Garrincha, na direita, o melhor
ponta que o futebol já teve. Zagallo
era experiente, e Vavá, um grande
artilheiro. Uma equipe completa.
Folha - Superior à equipe de 70?
Fontaine - Era mais equilibrada. Em 70 havia uma bela equipe,
principalmente na frente. A defesa
não era boa. Félix era inferior a
Gilmar, e, tirando o Carlos Alberto, a defesa não era lá essas coisas.
Folha - Como foi enfrentar Pelé
em 58?
Fontaine - Pelé foi o melhor do
mundo. Está no cume do futebol.
Logo abaixo está (o argentino) Di
Stéfano, que não teve a sorte de jogar uma Copa. E mais abaixo estão
os outros, Cruyff, Maradona, Beckenbauer, Platini, Kopa... E existe
um lugar à parte para Garrincha.
Foi o mais impressionante ponta-direita que já vi jogar.
Folha - O sr. jogou contra Zagallo. O que acha dele como jogador?
Fontaine - Era um jogador inteligente, pois não tinha grande força física e estava sempre bem posicionado. E tinha boa técnica.
Folha - E como técnico?
Fontaine - Ele conseguiu bons
resultados. Foi o treinador de 1970
e, em 94, ganhou a Copa do Mundo, como auxiliar do técnico.
Folha - No Brasil, ele recebe algumas críticas...
Fontaine - O problema é que o
Brasil tem tantos bons jogadores
que fica difícil escolher e agradar a
todos. Além disso, todo mundo
por aí é treinador.
Em 94, o Brasil era a melhor
equipe, mas não produzia um espetáculo tão bom quanto o time de
58 ou 70, ou mesmo o de 82. Há
vários jogadores que atuaram em
94 que não entrariam em seleções
brasileiras de outras épocas.
Folha - Em 58, a seleção francesa
jogava no ataque. Hoje...
Fontaine - Não é o caso (ri). A
França tem jogadores bons para
ser campeã, mas, se jogar só com
um atacante, não tem chance.
Folha - O sr. acredita na França?
Fontaine - Claro. Se jogarmos
com dois atacantes enfiados. Mas
acho que isso não acontecerá.
Folha - Marrocos se classificou
para a Copa (dirigido por Henri Michel, que treinava a França quando ela desclassificou o Brasil em
86). O sr. torce por Marrocos?
Fontaine - Eu sou francês. Tenho simpatias por Marrocos. É a
minha segunda equipe. Mas eu
torço também pelo Brasil. Acima
de tudo eu gosto de bom futebol.
Folha - O sr. acredita que as equipes africanas têm chance na Copa?
Fontaine - Sim. As chances aumentam com o tempo. Agora eles
têm bons jogadores, que atuam no
exterior e, se treinarem e se alimentarem como os europeus ou
brasileiros, podem se impor. Não
há raça superior no futebol.
Folha - Quais os favoritos?
Fontaine - É difícil fazer essas
previsões seis meses antes. É preciso ver as equipe após o início da
competição. Por isso, aponto os
mesmos de sempre: Brasil, Alemanha, Itália, Inglaterra e, talvez, a
Argentina. Talvez haja alguma
surpresa. A Nigéria ou outra equipe africana, ou a Colômbia. Não se
pode mais jogar a Copa achando
que existem jogos fáceis. Acabou.
Folha - O sr. acredita que hoje é
mais difícil fazer gols?
Fontaine - Ao contrário. Quando um jogador corre sozinho em
direção ao gol e é derrubado, o adversário ganha cartão vermelho.
Antes, podiam bater à vontade.
Hoje, existe uma série de argumentos que deveriam dar aos treinadores o desejo de jogar para a
frente. Eles preferem a prudência.
Se um treinador se lixa para o espetáculo porque quer ganhar, eu
estou de acordo -se as pessoas
não tiverem que pagar por isso.
Se não existem espectadores, que
joguem como quiserem. Se há público, é preciso oferecer um espetáculo. Mas sempre buscando a vitória. Não é porque se joga bem
que não é preciso ganhar.
Folha - O sr. acha que hoje é mais
difícil superar sua marca?
Fontaine - Não. O problema é
que se joga com cada vez menos
atacantes. E, quando estabeleci o
recorde, não pensava em fazê-lo.
Se alguém ficar pensando nisso
não vai conseguir fazer.
Folha - Qual é o atacante mais
completo hoje?
Fontaine - É o Ronaldinho. Ele
tem uma grande qualidade em relação aos outros. Nasceu no mesmo dia da minha mulher (22 de setembro). É o único que me dá medo, pois minha mulher é a única
pessoa com quem eu baixo a voz,
que eu deixo me dominar.
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