São Paulo, sábado, 22 de março de 2008

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JOSÉ GERALDO COUTO

Feliz aniversário, Ronaldinho


O craque gaúcho chega aos 28 anos em meio a um infundado questionamento de seu futebol prodigioso


RONALDINHO FEZ ontem 28 anos, a idade considerada de apogeu e plenitude de um craque de futebol.
Só para lembrar alguns exemplos: Sócrates, Falcão e Zico tinham 28 anos, pouco mais ou pouco menos, na Copa do Mundo de 1982, na Espanha. Pelé tinha 29 na de 1970, no México. Romário, 28 na de 1994, na dos Estados Unidos.
Ronaldinho, aos 28, está passando pelo momento mais crítico de sua luminosa carreira: na reserva no seu clube (o Barcelona), ignorado na convocação da seleção brasileira, questionado quanto à consistência e eficácia do seu futebol, desprezado pelos que buscam uma nova celebridade a cada semana. Minha vontade é dizer, parafraseando o que Nelson Rodrigues escreveu certa vez sobre Garrincha: "Os que negam Ronaldinho têm a aridez de três desertos".
Sou fã de Ronaldinho desde que ele surgiu como um cometa com aquele golaço contra a Venezuela, lá se vai mais de uma década. Escrevi uma coluna na ocasião, saudando o garoto que havia ressuscitado a nossa capacidade de sonhar.
Muita gente se apressou a broxar a festa, dizendo que aquilo era fogo de palha, sorte de principiante, lance do acaso. O tempo se encarregou de mostrar que o entusiasmo -que não era só meu, mas de todos os que vêem no futebol mais do que um mero esporte- não era assim tão precipitado.
Ronaldinho acabou por conquistar os corações mais empedernidos e há dois anos foi eleito, sem discussão, o melhor futebolista do mundo. Não foi propriamente um caminho suave. Houve percalços e quedas momentâneas nesse percurso. Uma delas -o fracasso nos Jogos Olímpicos de Sydney-2000- eu presenciei de perto. Alex e Ronaldinho, os astros daquela seleção olímpica, suportaram, com o técnico Vanderlei Luxemburgo, o peso maior da derrota.
No clima de desolação e lavagem de roupa suja que se seguiu à desclassificação brasileira, nas quartas-de-final contra Camarões, calhou de eu tomar ao lado de Ronaldinho o elevador do luxuoso hotel onde a seleção estava hospedada, em Gold Coast.
Jornalista sem vocação para o "furo", me vi "tête-à-tête" com um dos personagens centrais do drama, sem nenhum colega ou concorrente para atrapalhar.
Era preciso aproveitar o momento, e sucumbi ao que há de pior no "espírito jornalístico", que é tentar arrancar uma declaração que renda manchete.
Perguntei ao jovem craque, na lata, o que acontecia com o Alex nos momentos decisivos (na secreta esperança de um desabafo que botasse lenha na fogueira daquela seleção em ruínas).
Ronadinho limitou-se a baixar os olhos vermelhos de choro e ficou em silêncio, fazendo ecoar no elevador minhas torpes palavras.
Ele tinha então 20 anos, idade para ser meu filho. Mas deu uma lição de integridade que me encheu de vergonha. O homem ali foi ele, a criança fui eu. Por essa experiência, tanto quanto pelos lances maravilhosos que me proporcionou dentro de campo, tenho por Ronaldinho uma admiração e uma gratidão eternas.

jgcouto@uol.com.br


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