São Paulo, domingo, 22 de março de 2009

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Neymar cresceu como astro de um "reality show"

Revelação santista teve a infância esmiuçada pela mídia, sofreu com ciúmes de time e ficou deprimido na Espanha

Protegido pela família, atacante não pode usar brinco para evitar "máscara" e precisa comprovar para a mãe, com notas, o que gasta

Caio Guatelli/Folha Imagem
O atacante Neymar, em seu apartamento em Santos

PAULO COBOS
RICARDO VIEL

ENVIADOS ESPECIAIS A SANTOS

Ciúmes, uma pitada de drama, fama, dinheiro, um vilão e um caso de amor precoce (com a torcida do Santos). Foi assim, como um "reality show", ou uma novela das oito, que o atacante Neymar viveu nos últimos cinco anos, antes de se tornar uma espécie de antídoto para a "Ronaldomania" que tomou conta do futebol paulista.
O garoto de 17 anos, que conseguiu dividir os holofotes com o atacante corintiano (seu rival hoje no Pacaembu) desde que foi içado ao time profissional do Santos, teve uma infância única para um jogador de futebol, em qualquer época.
"Coloquei pressão nele quando tinha nove anos, quando vi que ele tinha talento para se tornar um grande jogador", diz o pai do atacante, que também se chama Neymar e é um ex-jogador profissional com passagens por Coritiba e clubes modestos do interior paulista.
E não foi só com a família, evangélica e bastante unida, que Neymar assumiu responsabilidades muito cedo. O atacante não teve como regra o anonimato nas categorias de base, o que aconteceu, para falar do Santos, com Pelé e Robinho, por exemplo.
Seus passos no clube foram esmiuçados pela mídia desde que ele tinha 12 anos.
O Santos o usou como garoto-propaganda de uniformes quando ele tinha 13. Seu corpo frágil e o rosto de eterno moleque apareceram em programas de TV antes dos 14.
Com 14, já recebia salário de executivo de multinacional -estimados R$ 25 mil mensais (hoje ganha R$ 85 mil, valor não declarado oficialmente).
Tudo isso teve um preço.
"O mais difícil de tudo foi o ciúme. Isso sempre aconteceu. Os pais dos outros jogadores das categorias de base não gostavam de que ele tivesse um salário alto enquanto os filhos deles ganhavam pouco", diz Neymar pai. "Vi num jogo juvenil um companheiro de time impedindo o Neymar de bater uma falta dizendo que ele [o novo camisa 7 santista] pensava que era o dono do time", fala Wagner Ribeiro, o empresário da revelação do clube do litoral.
O sonho de uma transferência precoce para o futebol europeu também não acabou bem. Em 2006, com 14 anos, Neymar e seu pai foram para a Espanha a convite do Real Madrid.
"Logo me ofereceram um apartamento, escolas para os filhos [Neymar tem uma irmã] e um bom dinheiro [ 1 milhão, ou hoje cerca de R$ 3 milhões]. Estava pronto para assinar, mas passou pouco mais de uma semana e o Neymar começou a ficar deprimido, a não comer direito, pois sentia falta do arroz e feijão. Ele já é magro. Achei então que era melhor voltar para o Santos", afirma o pai da revelação santista.
Wagner Ribeiro fez força para Neymar ficar no Real Madrid, mas hoje vê uma vantagem no fato de o garoto ter decidido voltar para o Brasil e feito um acordo para ganhar uma bolada do Santos mesmo sem ainda ser profissional.
"Logo depois daquela viagem, um promotor me acusou de tráfico de menores. Levei o pai e a mãe do Neymar a uma audiência, e a juíza viu que aquilo era absurdo. Se ele tivesse ficado, eu seria um vilão, o que sempre acontece com o empresário", fala Ribeiro, que era o empresário de Robinho quando ele forçou sua saída do Santos, em 2005, e que apostou em Neymar quando ele tinha 12 anos primeiro por superstição. "Ele nasceu em 5 de fevereiro, que é uma data especial para mim por causa de um parente", afirma o empresário.

Máscara
Hoje, Neymar tem só quatro jogos como profissional. E segue sendo diferente da turma.
Muito pelo que já rendeu de dinheiro -seu pai vendeu os 40% da família sobre os direitos do atacante para o grupo Sonda por estimados R$ 7,5 milhões, valor, segundo Ribeiro, parecido ao que o Chelsea oferecia (esse era o negócio que o empresário preferia).
E também porque Neymar tem cuidados raros no futebol de hoje. Em uma entrevista coletiva, ele disse que seu pai o proibia de usar brincos.
Neymar pai explica o motivo. "Ele tem brincos, correntes como as dos garotos da sua idade. Mas não acho bom ele usar isso em campo, nos treinos ou nas entrevistas, senão logo vão falar que ele é mascarado", afirma o pai superprotetor.
Neymar, que mora com a família em um apartamento de classe média a menos de 100 m da Vila Belmiro, também não pode esbanjar o dinheiro que ganha. "Até hoje, quando ele quer um refrigerante, me pede R$ 10. Recentemente, a mãe, que é quem toma conta do dinheiro, deu a ele um cartão de débito, mas ele precisa trazer as notas de onde gastou", conta o pai, que diz que o filho pode ter adiantado as coisas na vida profissional, mas que não vai fazer isso na vida pessoal.
"Para um garoto, você dar um campo, uma bola, é a maior alegria. O Neymar precisa se preocupar só em jogar futebol. Do resto, a gente toma conta."

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