São Paulo, terça-feira, 22 de outubro de 2002

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FUTEBOL

Vitórias e sanduíches

JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA

Vitórias são sempre iguais. Elas nos deixam mais leves, põem um sorriso nos nossos lábios e, na segunda-feira, fazem de nós os sujeitos mais chatos do mundo, ou seja, daquele tipo que só quer ler cadernos esportivos, só sabe falar de um único assunto e não se cansa de rever o mesmo gol.
Apesar de serem iguais, porém, nem sempre as vitórias compartilham a mesma natureza. Como assim? Explico: um sanduíche é sempre um sanduíche, mas seu recheio pode variar infinitamente. Pode ser queijo, hambúrguer, presunto, ovo, toucinho, alface, tomate, cebola ou tudo isso junto, formando um daqueles sanduíches que fazem a gordura escorrer pela nossa mão. Esse raciocínio, além de me deixar com fome, me faz imaginar que é possível pensar numa tipologia das vitórias.
Elas poderiam ser divididas assim:
1) Pão com manteiga - Como o próprio nome faz supor, essas são as mais comuns. Acontecem quando um time, considerado superior, derrota o adversário mais fraco exatamente da maneira que se esperava. Ele faz os gols, administra o resultado e deixa sua torcida satisfeita, mas não empolgada. Assim foram as conquistas de Vasco e Grêmio.
2) Queijo branco - Estas não têm muito sabor. São conseguidas em jogos cansativos, mornos, cheios de passes errados e que levam ao desespero os responsáveis por editar os melhores momentos. Dessa natureza foram os magros êxitos de Corinthians e Fluminense.
3) Mexicano - Assim como o sanduíche de carne moída, que parece fácil de comer, mas, no final, a gente sempre faz alguma sujeira, há vitórias em que o time joga bem, ataca bastante e parece que vai abrir uma grande vantagem, mas, no fim, acaba tomando sufoco do rival que parecia batido. Dessa forma foram as vitórias do Juventude, do São Paulo e do São Caetano, times que tiveram que suar a camisa para conseguir se manter nas primeiras posições.
4) Mortadela - São vitórias ótimas para matar a fome da torcida. Essas vêm quando o time mais precisa, quando está numa posição desconfortável na tabela e precisa do resultado a qualquer custo para provar à torcida, aos críticos e a si mesmo que tem condições de reagir. Hoje em dia, qualquer vitória do Palmeiras pode se encaixar nessa categoria. Na última rodada, as vitórias de Lusa, Goiás e Flamengo são bons sanduíches de mortadela.
5) Linguiça - São vitórias ardidas, apimentadas, conseguidas sob condições terrivelmente adversas, como jogar fora de casa, sofrer uma forte pressão e ainda ter um jogador expulso, como no caso do Internacional, que conseguiu os três pontos mais inesperados da rodada ao bater o Atlético-PR em plena Arena da Baixada.
6) Leite condensado - São as mais doces. Nem preciso dizer que são aquelas conseguidas diante do maior rival. Nesse caso, não resta a menor dúvida de que o sucesso mais doce do domingo foi o do Atlético-MG diante do Cruzeiro, até porque ele repôs o Galo nas alturas do G-8 e fez da Raposa uma candidata ao rebaixamento.
Muito bem, agora que terminei o texto, só me resta dar um pulo até a padaria da esquina. Não sei qual sanduíche irei comer, se o de linguiça, de mortadela, de carne moída ou um simples pão com manteiga. Seja como for, só me resta uma certeza: a de que, mais uma vez, não conseguirei a mais difícil das vitórias: a vitória contra a balança.

Torcedor retorcido
Qual torcedor acompanha o Brasileiro com mais intensidade? O corintiano, que espera o terceiro grande título do ano? O são-paulino ou o são-caetanense, que estão sempre nas primeiras posições? O santista, que vê uma safra de talentos promissores? Nenhum deles. O torcedor que mais vive o campeonato é o do Palmeiras. Além de acompanhar seu time, ele tem que torcer contra uma dúzia de equipes a cada rodada. O palmeirense lê desde "O Liberal", para descobrir quem tomou cartões amarelos pelo Paysandu, até o "Correio Brasiliense", para saber se o Dimba joga na quarta-feira.

Haicai
E, para mostrar que sou bom perdedor, vai aí um haicai de José Carlos Marques, torcedor da Portuguesa: "Diante desses santos/ (tricolores, alvinegros...),/ sou Lusa "entre-tantos'".

E-mail torero@uol.com.br



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