São Paulo, terça-feira, 23 de janeiro de 2007

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precisa-se de clube

No terrão, SP enfrenta o desemprego

Com treinos no parque da Aclimação, sindicato mantém a forma de jogadores sem contrato e tenta recolocá-los no mercado

Entidade, que dá bananas e maçãs para os "contratáveis" e os isenta de taxas, diz que 15% dos sindicalizados do Estado estão sem vínculos

Ricardo Nogueira/Folha Imagem
Jogadores sem contrato com clubes participam de treinamento promovido pelo sindicato dos atletas de SP no parque da Aclimação, na zona sul da capital paulista

LUÍS FERRARI
MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Três vezes por semana, o campo de terra do parque da Aclimação, em São Paulo, é tomado por um grupo que, antes de bater sua bolinha, faz treino físico e trabalha fundamentos. O que parece vadiagem, na verdade, são homens tentando superar o desemprego no futebol.
Gente como Jackson Vieira Santana, 24, que sai de Guarulhos de ônibus, trem e duas linhas de metrô -duas horas ao todo- para chegar lá. Com passagens por União Barbarense, Joseense e Taubaté, ele tenta defender a carreira e o casamento, pretendido para 2007.
"Minha noiva dá apoio, sei que posso conseguir. Sempre há gente disposta a lhe ajudar", diz Jackson, que já viu colegas do terrão irem para o União Leiria (POR) e Nacional de Rolândia, da Série A paranaense.
O que acontece no parque da Aclimação é uma iniciativa do Sindicato dos Atletas Profissionais de SP (Sapesp). O órgão estima que 15% dos sindicalizados estejam sem contrato.
Há um mês, o órgão pôs uma comissão técnica para cuidar dos "contratáveis", sem nenhum custo para os atletas. A exigência para participar é que sejam maiores e sindicalizados.
"Facilitamos a vida dos atletas e dos clubes, que podem contratá-los a custo zero", diz Rinaldo Martorelli, presidente do sindicato, que alentava a idéia desde 1997. "Nós nos preocupamos em arquivar as avaliações físicas, para o jogador levar para o clube que o contratar." O sindicato ressalta que não recebe pelos negócios.
O trabalho é coordenado por José Roberto Portela, técnico e preparador físico com passagens por São Paulo, Fluminense, Portuguesa e Atlético-MG.
"A gente fica sabendo dos garotos, e eles de nós. Fazemos uma avaliação e passamos a aprimorar fundamentos, condicioná-los para que possam jogar assim que possível. Graças a Deus, o número oscila muito, eles logo são contratados."
A idéia é quebrar o círculo vicioso surgido com o fim do passe -que vinculava o atleta a um clube, mesmo depois que ele deixava de ser júnior. Boleiros sem contrato ficam sem atuar, e o desemprego se perpetua.
É o caso de Daniel Evaristo Tenório Cavalcanti, 23. Lateral-esquerdo, ele ficou no Palmeiras B, conheceu Francis e Wendel, mas foi preterido pelo então técnico Marcelo Vilar. Rodou por Osasco e Independente de Limeira. Hoje, espera.
Por isso, o terrão da Aclimação, bastante empoçado pelas chuvas, não chega a ser o fundo do poço. "Já joguei em gramado pior, todo desnivelado, que de grama só tinha uns pedaços."
Ontem, ao menos quatro atletas foram à Aclimação pela primeira vez. É o caso do volante Cleiton Xavier, 19, reprovado no Palmeiras. "Vou tentar até que digam que não levo jeito."
E se não houver talento? Segundo Portela, o trabalho visa a ajudar o mediano. Conta que há no grupo um atleta bom de físico, porém fraco de técnica.
"Tento orientá-lo sobre outras carreiras, mas ele me disse que não quer o Milan, no interior já estaria bom. Então o ajudo a superar as dificuldades."
E elas são muitas. Por ora, na parte alimentar, o sindicato colabora com bananas e maçãs, já que o trabalho começa de manhãzinha (leve-se em conta o tempo de condução) e ultrapassa o meio-dia. Segundo Martorelli, espera-se criar auxílios-transporte e, futuramente, um CT para os desempregados.
Outra preocupação é evitar aproveitadores. O sindicato fica à disposição dos atletas, principalmente na hora de assinar. Mas golpistas não faltam quando se está no desespero.
"Teve um cara se passando pelo Barbieri, ex-goleiro da Ponte", lembra o noivo Jackson. "Pegou R$ 200 de alguns colegas, dizendo que ia nos levar para o Nordeste e precisava para despesas. Por sorte não paguei, porque ele deu o cano."


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