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Artilharia de SP vem de roça e de obra
Otacílio Neto, do Noroeste, ex-lavrador, e Pedrão, do Barueri, ex-servente de pedreiro, surgiram da várzea aos 19 anos
Destaques deste Paulista tiveram contato tardio com clubes e contaram com o acaso para dar início a suas carreiras como profissional
PAULO COBOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Esqueça jogadores lapidados
por anos nas categorias de base,
muitos com empresários a tiracolo desde garotos. No caso de
dois dos principais candidatos
a artilheiro do Paulista, o acaso
foi o responsável por eles estarem no futebol profissional.
Otacílio Neto, dez gols pelo
Noroeste, mesmo fora das últimas rodadas por lesão, e Pedrão, 11 tentos pelo Barueri,
eram maiores de idade quando
entraram em campo pela primeira vez para jogar por um time que não fosse de várzea.
O primeiro era um lavrador
nordestino recém-chegado a
São Paulo, e o segundo, um servente de pedreiro em Jaboticabal, no interior paulista, quando o destino driblou a fórmula
atual, em que até garotos de 12
ou 13 já têm vínculos com os
clubes, pequenos ou grandes.
"Cheguei de Orós [sertão
cearense] pouco antes de completar 19 anos. Iria trabalhar
numa pizzaria de Osasco. No final de semana anterior ao início do serviço, um primo meu
chamou um olheiro para um jogo de várzea. Fiz três gols. O rapaz gostou. Me levou na Portuguesa e disseram que lá estava
lotado. Então apareceu o Ituano, onde tudo começou", conta
Otacílio Neto, hoje com 25
anos, sobre como o futebol apareceu na sua vida.
Tudo muito parecido com o
início de Pedrão, do Barueri.
A função de servente de pedreiro em uma cerâmica, onde
trabalhou por quase cinco
anos, era seu sustento até que
um técnico do time profissional de Jaboticabal o viu jogando, quando já tinha 19 anos, em
um campeonato de várzea da
cidade do interior paulista.
"Nunca tive a expectativa de
ser um jogador futebol", diz o
atacante, hoje com 29 anos.
Futebol sempre foi algo secundário na infância dos dois.
"Eu trabalhava na roça. Plantava milho, feijão e arroz num
sítio em Orós. A vida era sofrida, dificuldade atrás de dificuldade. Nunca cheguei a passar
fome, mas chegou a ter domingo que só tinha arroz para comer", conta Otacílio Neto.
Antes do trabalho de servente de pedreiro, Pedrão sofreu
um acidente que "mudou" seu
nome. "Fui atropelado por um
caminhão de gás. Quebrei braço, perna. Como o caminhão
era de uma distribuidora chamada Pedrão, comecei a ser
chamado assim", conta ele, cujo nome de batismo é Cristiano.
A demora para chegar a um
clube profissional causou
transtornos para os dois no início. "Eu cheguei no Ituano e esperava ver o que o pessoal fazia
primeiro para depois copiar.
Todo mundo estranhava, ficava
me olhando. No primeiro treino, atravessei os outros caras.
Todo mundo me pedia calma",
rememora Otacílio Neto.
"É complicado quando você
chega ao profissional. Passa por
muita dificuldade, um monte
de coisa que você não sabe fazer. Tem exercício difícil. E no
meio do futebol qualquer mancada que você dá todo mundo
dá risada", fala Pedrão, que
lembra ainda do fato de jogar
na várzea logo depois de comer
pratos bastante calóricos.
Com pouca vivência em categorias de base -Otacílio Neto
disputou menos de uma temporada pelos juniores do Ituano, e Pedrão foi direto para o
profissional no Jaboticabal-,
eles também fogem de outro
perfil básico do futebol atual.
O atacante do Noroeste tem
como agente o mesmo olheiro
que o descobriu na várzea, há
seis anos. Pedrão é ainda mais
radical. Não tem empresário.
"Eu mesmo sento e converso
sobre os meus contratos. Isso
tem lado bom e ruim. Se tivesse
um empresário bom, já estaria
em um time grande. O lado
bom é que não tenho que dar
comissão para ninguém."
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