São Paulo, sábado, 23 de agosto de 1997.



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FUTEBOL
Livro conta que aos 14 anos jogador só pôde entrar num torneio após aceitar que não passaria do meio-campo
Bauru proibiu Pelé de jogar no ataque

WAGNER OLIVEIRA
da Agência Folha, em Bauru

Pelé tinha aos 14 anos um futebol tão superior ao dos garotos de sua idade que a Liga de Futebol Amador de Bauru teve de inventar uma nova regra para que o jogador pudesse disputar um campeonato pelo Radiun, em 1955, sem acabar com as chances das outras equipes.
Depois do primeiro jogo, em que o Radiun goleou por 10 a 0 o time dos Marianos com 8 gols de Pelé, o dirigente da liga, Sérgio Ribeiro, resolveu que o jogador só poderia ficar no gol ou na defesa.
Se optasse pela zaga, não poderia passar do meio-campo, caso contrário seria falta em favor do time adversário. Mesmo jogando na defesa, Pelé ajudou o Radiun a ser campeão.
Essa é uma das passagens do livro "Pelé de Bauru", escrito pelo jornalista Luiz Carlos Cordeiro, que pretende resgatar a infância e adolescência vividas por Pelé em Bauru (345 km a noroeste de São Paulo).
O livro, que será publicado em outubro pela editora DDA, quer mostrar a importância que a cidade de Bauru teve na formação daquele que é considerado o maior jogador da história do futebol, o hoje ministro dos Esportes Edson Arantes do Nascimento.
As amizades, as peladas, as primeiras jogadas, os primeiros gols, os ídolos, os bicos como engraxate, o convívio com parentes e vizinhos, os times de várzea em que jogou foram alvo de dois anos e meio de pesquisa do jornalista.
"Todo mundo fala do Pelé do Santos e de Três Corações (MG), sua cidade natal. Mas esquecem que foi em Bauru que ele se formou", afirma Cordeiro, cujo livro tem prefácio do colunista da Folha Juca Kfouri.
O livro também revela que Pelé era craque no futebol de salão. Em campeonato disputado em 54, o Radiun foi campeão com 47 gols do jogador.
Entre outras coisas, o jornalista descobriu que Pelé torcia para o Corinthians na infância e chegou a receber uma proposta do Bangu (RJ), quase na mesma época em que foi para o Santos.
O jornalista pretende desfazer boatos de que o jogador não foi aceito pelos grandes times de São Paulo, como Corinthians e Palmeiras, por ser negro.
"Isso é uma grande mentira. Pelé nunca chegou a ir a esses clubes. Além do mais, a família era contra ele ir para a cidade grande", afirma Cordeiro, que entrevistou parentes e amigos de infância do ex-jogador em Bauru, e também contou com dados de sua memória, pois era grande amigo de Zoca, irmão de Pelé.
Pelé jogava pelo BAC (Bauru Atlético Clube) quando foi oferecido ao Santos pelo técnico Valdemar de Brito.
Segundo o jornalista, três fatores definiram a ida de Pelé para o Santos: a amizade de Brito com dirigentes santistas, o trabalho de base feito pelo time da Vila Belmiro e a tranquilidade da cidade de Santos, à época com 200 mil habitantes.
Apelido
O livro conta que Pelé ganhou o apelido porque sempre mencionava durante as peladas o nome do goleiro Bilé, do Atlético de Três Corações.
Segundo o autor do livro, o goleiro Bilé fazia grandes defesas e tinha o nome gritado pelos jornalistas da época.
Pelé apreendeu e dizia o mesmo para os goleiros quando chutava a bola. Até que os colegas de pelada passaram a chamá-lo pelo apelido famoso.
A chegada
A família de Dico, apelido pelo qual o jogador era chamado pelos parentes, chegou a Bauru em 15 de setembro de 1945.
João Ramos do Nascimento, o Dondinho, pai de Pelé, havia sido contratado pelo Lusitana F. C., hoje BAC (Bauru Atlético Clube).
Vieram para Bauru a mãe do jogador, Celeste, a avó, Ambrozina, o tio, Jorge Arantes, e os irmãos, Maria Lúcia, e Jair, o Zoca.
Depois de morar no Hotel Estações, a família passou a viver em uma casa na avenida Rodrigues Alves, no centro. Foi num campinho perto de casa que Pelé começou a disputar as primeiras peladas, descalço e sem camisa.
Depois, Pelé passou pelos times amadores Sete de Setembro, Vai-quem-quer, Canto do Rio, Ameriquinha, São Paulinho de Curuçá, Radiun, BAC e pelo infantil do Noroeste.
Um trecho do livro mostra que Pelé já era admirado até mesmo nas peladas. "Já aos 12, 13, 14 anos Pelé levava muita, mas muita gente mesmo para assisti-lo. Sem arquibancada, os próprios torcedores formavam um robusto alambrado em volta das quatro linhas dos campinhos da cidade".
Pelé deixou Bauru pouco antes de completar 16 anos. Por muito tempo, mesmo após ele ganhar fama no Brasil e no exterior, a sua família ainda continuou a morar na cidade.



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