São Paulo, domingo, 24 de fevereiro de 2008

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Sabará, 44 anos depois, faz tributo a Noventa

No Siderúrgica, clube da cidade mineira, meia-atacante foi campeão estadual em 64

Ignorado por Nike e Google, ex-jogador aparece em fotos, tem gravações de seus gols em CD e ganha medalha por mérito

DO ENVIADO A SABARÁ

A Nike recorreu a pesquisa no Google para saber quem é Noventa. Em Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, isso não é necessário.
Na cidade histórica mineira, é fácil comprar um CD com a narração dos gols de Noventa pela rádio Itatiaia, a mais importante do Estado. Ou outro DVD, com dezenas de fotos digitalizadas do meia-atacante.
No fim do ano passado, Noventa foi homenageado com outros atletas pela Prefeitura -a medalha de honra ao mérito esportivo está guardada, esperando que ele volte dos EUA.
Isso porque Sabará tem na memória o que Noventa fez pelo Siderúrgica, o clube do município que peitava as equipes grandes de Belo Horizonte no período em que foi bancado pela Belgo Mineira, uma grande empresa do ramo de aço.
Foram 12 gols, pelas contas do próprio Noventa, no título mineiro de 1964 -foram necessários 38 anos para que outro time de fora de Belo Horizonte vencesse o Estadual. Mais prestígio técnico do que ele no clube, só o atacante Silvestre.
"Não importa o que a Nike acha. Mas o Noventa, assim como os outros jogadores que defenderam o Siderúrgica, para nós representa mais do que qualquer coisa", diz o prefeito de Sabará, Sérgio Luiz de Freitas, que em seu gabinete, num casarão do século 18, tem uma foto emoldurada do time.
Noventa chegou ao Siderúrgica depois de revelado pelo América-MG. O clube de Sabará se aproveitava da fartura do dinheiro da Belgo Mineira-a verba repassada pela empresa para o clube cobria a folha de pagamento e ainda sobrava mais da metade para investimentos e a realização de amistosos contra times grandes de outros Estados, como o Vasco.
No Siderúrgica, Noventa repetiu seu bom desempenho. Tanto que de lá saiu para o Atlético-MG. No alvinegro da capital mineira, lesões fizeram sua carreira no Brasil entrar em declínio, o que o motivou a tentar a sorte no então incipiente futebol dos Estados Unidos.
Em Sabará, teve como guru Yustrich, treinador com jeito durão que ganhou bastante fama por ter sido ameaçado por João Saldanha, a quem havia criticado, com um revólver em punho em 1969.
"O Noventa foi muito bem no Siderúrgica por causa do Yustrich. Ele ensinava os pontos fracos dos adversários para o Noventa, que se adaptou muito bem ao esquema tático", diz o goleiro Dejair, que, com 1,68 m, foi outro destaque dos bons tempos do time mineiro.
"Até hoje a cidade me trata bem. Os mais velhos contam para os mais novos o que aconteceu na década de 60", diz Dejair, que aponta a fama do clube como um facilitador para arrumar namoradas em Sabará.
Não era, segundo ele, o caso de Noventa, que só fugia da concentração para ver a "namorada firme" que tinha.
Yustrich, que mandava Noventa e seus colegas de Siderúrgica empurrarem carrinhos de obra cheio de serragem para tampar buracos do gramado como treino físico, esteve envolvido em outro evento que fez Noventa ganhar fama.
Num confronto contra o Atlético-MG, no estádio Independência, em 1964, Noventa machucou com gravidade o braço e ameaçou deixar o gramado quando o Siderúrgica vencia por 2 a 1.
Aos gritos, o treinador ordenou sua volta ao jogo. Com o braço "colado" no corpo, Noventa fez o terceiro gol da vitória de sua equipe.
"Quando o jogo acabou, o Yustrich me abraçou e me carregou até o vestiário", diz Noventa sobre o episódio, que aparece em alguns sites.
O Siderúrgica deixou de ser uma potência quando a Belgo Mineira parou de bancá-lo, já na segunda metade da década de 60. O clube logo se licenciou. Tentou voltar na década de 90, e não conseguiu. Agora tenta novo recomeço -disputou no ano passado a terceira divisão do Campeonato Mineiro.
Segundo o goleiro Dejair, a Belgo sempre pagou o salário no dia certo. Queixas, só pela promessa não cumprida do bicho pelo título de 1964.
"Disseram que cada um iria receber uma quantidade de ferro, mas isso deve estar enferrujando, porque eu nunca recebi a minha". (PAULO COBOS)


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