São Paulo, segunda-feira, 24 de março de 2008

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Lobby por revisão tem apoio da União e entrave jurídico

Clubes querem alterar Lei Pelé para aumentar poder sobre atletas; governo dá aval, mas há barreiras em normas trabalhistas, da Fifa e pressão do sindicato

A pós dez anos de Lei Pelé, atinge o auge a onda de revisionismo da legislação, impulsionada pelo lobby dos clubes. O sindicato dos jogadores tenta responder com ações na Justiça e uma pressão, bem menos poderosa, sobre o governo federal. Por posição do presidente Lula, o Ministério do Esporte tem comprado, em parte, o discurso dos dirigentes. Ou seja, quer clubes mais fortes.
Mas há barreiras. Da legislação trabalhista a normas da Fifa, órgão máximo do esporte. Estão em discussão questões como a duração máxima dos contratos dos jogadores, o valor máximo da rescisão, a idade mínima para profissionalização dos atletas e seus direitos trabalhistas. Temas já discutidos em duas alterações à lei, em 2000 e 2003. Neste momento, um projeto de lei, já com várias emendas, tramita no Congresso.

DA REPORTAGEM LOCAL

A prerrogativa de poder firmar contratos mais longos e mais cedo com os jogadores. Esse é o principal objetivo de cartolas ouvidos pela Folha. Entre representantes dos atletas, há pressão pelo fim da cláusula penal e pela obtenção de direitos trabalhistas não previstos na legislação atual.
Até o momento, o governo federal escolheu o seu lado no embate. Já fez audiências com cartolas, sem ter ouvido o sindicato, e apóia projeto no Congresso que fortalece os clubes.
"Não dá para ter contrato de trabalho aos 14 anos porque a legislação trabalhista veta. Podemos fazer o vínculo esportivo mais cedo, nessa idade, e reforçá-lo [reajustá-lo]", explica o ministro do Esporte, Orlando Silva Jr., à Folha.
Os clubes querem firmar contratos com atletas de 14 anos -hoje, a regra é para 16 anos. E alguns dos cartolas falam em elevar até para dez anos a duração máxima de acordos com os jogadores -hoje o prazo é de cinco.
Sem essa possibilidade, o ministro diz que apóia o projeto de lei 5.186, no Congresso. Ele prevê primeiro contrato de cinco anos, com renovação automática por mais três. O acordo de mais de cinco anos seria contrário a norma da Fifa.
O projeto prevê que a cláusula penal só vale se o atleta romper com o clube. Caso o time rescinda o acordo, tem de pagar ao jogador, mas um valor menor. Atualmente, a Justiça diz que o valor deve ser igual para as duas partes.
"Vamos usar a mesma determinação que tivemos para a Timemania para alterar a Lei Pelé", diz o presidente do Flamengo, Márcio Braga. Há cartolas, como Eurico Miranda, do Vasco, que defendem proibição de que atletas abaixo de 18 anos saiam do país. Só que essa medida é considerada inconstitucional pelo ministério.
É esse o discurso propalado pelo sindicado dos jogadores.
Em desvantagem junto ao governo, a Federação Nacional dos Atletas (Fenapaf) decidiu entrar com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal contra pelo menos um artigo da Lei Pelé, o que estabelece a cláusula penal. Ou seja, querem que o jogador nem sequer tenha que pagar para romper o contrato unilateralmente.
"Em Portugal, a cláusula penal já caiu na Justiça. Não há equilíbrio na relação. Qualquer trabalhador está sujeito a ter uma proposta de trabalho e pode mudar de emprego", diz Rinaldo Martorelli, da Fenapaf. Essa ação, na verdade, é uma forma de pressionar clubes e governo a fechar um acordo.
Martorelli reclama que o ministro, até agora, só ouviu os clubes. De fato, Silva Jr., que promete abrir espaço ao sindicalista, já recebeu duas propostas prontas de clubes paulistas.
Para manter as condições atuais da Lei Pelé, a Fenapaf aceita abrir mão de mudanças nos direitos trabalhistas, hoje desfavoráveis aos atletas. Mobilizações de jogadores e dossiês estão nos planos.
A discussão vai além das fronteiras brasileiras. A Fifa não permite, por exemplo, contratos superiores a três anos com atletas de 16 anos. Ou seja, a CBF não registra nada acima desse período, apesar da lei.
A norma internacional interfere, como aconteceu na origem da Lei Pelé. "Os clubes reclamam, mas o Brasil teria de se enquadrar de qualquer jeito à Lei Bosman, que deu liberdade ao jogador na Europa", afirma o presidente da Associação Brasileira de Agentes de Futebol (Abaf), Léo Rabello.
Um dos autores do texto da Lei Pelé, o advogado Heraldo Panhoca, que defende clubes e jogadores, vê dificuldades tanto para os pleitos dos cartolas quanto para o sindicato.
Contratos longos podem ser inviáveis pela norma da Fifa. "E não vejo ação possível contra a cláusula penal", diz Panhoca, sobre o sindicato tentar liberar de vez os atletas.0 (LUÍS FERRARI E RODRIGO MATTOS)


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