|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FUTEBOL
Bom exemplo, garoto
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
Mais uma história é revelada, entre muitas que ficam
escondidas: Kléber, jogador do
São Paulo, resolveu contar que
cometeu alguns delitos na adolescência. A uma certa altura, vendo
claramente que a barca era furada, renunciou a essa vida e passou a se dedicar só ao futebol. A
ajuda de uma psicóloga, da família, a confiança na sua igreja e o
fato de ter uma boa opção -a
chance palpável de ser profissional- foram fundamentais para
que tivesse o sucesso na mudança.
Kléber não era rico, mas não
"passava precisão". Por que roubava? O (ainda) garoto foi honesto: por ambição, sonhos de consumo. Ele queria ter mais do que
conseguiria por meios "normais".
Essa praga está na raiz dos nossos males. Quem não quer ter
uma roupa nova, um tênis bacana, um carro da hora, um baita
som e uma TV? Inclusive quem
não tem condições para isso
(quanto mais os adolescentes!). E
somos nós (a mídia e o mundo todo) que vendemos essa idéia nada educativa de que você precisa
ter algumas coisas para ser alguém, para ser respeitado e feliz.
Quantas propagandas ridicularizam o dono do carro velho, o sujeito feioso e mal vestido, a menina gordinha que não faz academia e exaltam o motorista prepotente do carro importado, a mulher mentirosa e insaciável, como
se fossem modelos a se imitar, os
exemplos de gente bem-sucedida?
A rapaziada da periferia pode
não ter o sonho de se realizar em
uma profissão, de viajar e conhecer o mundo, de encontrar alguém especial e ter conforto em
uma casa simples com uma família legal. Muitos adolescentes não
sabem responder o que querem
fazer da vida; às vezes não têm
nem o sonho-chavão de querer
ser artista famoso ou jogador de
futebol. Mas o sonho do consumo
eles têm. Querem ter dinheiro para comprar o que não precisam.
Quem não tem emprego e dificilmente vai ter, quem não teve
infância e nunca terá, quem não
tem boas perspectivas na vida pode fazer bobagens para conseguir
seus prazeres. Adolescentes bem-nascidos e bem-criados o fazem,
imaginem os outros. Com metas
ambiciosas e chances ínfimas de
alcançá-las decentemente, muitos
trocam o salário infame (quando
houver) por uma boa grana para
trabalhar com a bandidagem.
Kléber é um bom exemplo de alguém que abriu mão dos desejos
bestas por algo mais correto, mais
seguro e mais justo. Todo mundo
tem a possibilidade de reagir a
qualquer pressão, sugestão ou influência. Mas, como ele contou,
dos nove garotos que foram levados um dia para um teste no São
Paulo, só ele ficou. E os outros? Será que têm a mesma estrutura e fé
para seguir um caminho correto?
Ele cobra providências das autoridades e tem razão. O governo
deve oferecer educação e os outros
direitos fundamentais e criar condições para geração e redistribuição de renda. E nós? Não devemos
educar, transferir, redistribuir?
Kléber ajuda um time de garotos lá no seu pedaço -conversa,
acompanha os treinos, compra-lhes tênis e bolas. Taí: exemplo
para eles, exemplo para nós.
Adolescentes?
Os resultados do Santos dificilmente dizem o que foi o jogo,
mas sempre condicionam as
análises. Se Robinho e Diego tiverem dez lances geniais e o time não vencer, ninguém se
lembra das jogadas e muitos reclamam: "Não são os mesmos".
Se vencer, os mesmos lances serão festejados como "a volta do
talento e do futebol moleque".
O fato é que o Santos, neste ano
como no ano passado, às vezes
joga mal, mas, quando joga
bem, é uma delícia.
Maduros?
Do Cruzeiro eu já esperava um
grande campeonato. Acho o
elenco melhor do que as pessoas dizem ("o time é só o
Alex"). Mas o Galo está me surpreendendo com o futebol legal
e uma campanha espetacular.
E-mail
soninha.folha@uol.com.br
Texto Anterior: Ação - Carlos Sarli: Cabeça quente Próximo Texto: Futebol: Gols voltam a coroar "Ronaldo de ferro" Índice
|