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A diáspora de Gana
De Israel à Alemanha, da Turquia à Suécia, adversário do Brasil nas oitavas reúne jogadores que atuam por 11 países, um recorde
FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A WÜRZBURG
O Brasil chegou a pensar que
pegaria nas oitavas-de-final da
Copa a Itália, uma das únicas
seleções 100% nacionais do
torneio, em que os 23 convocados atuam no próprio país (a
outra é a Arábia Saudita). Enfrentará o extremo oposto.
Gana, rival do jogo da próxima terça, é, entre as 32 participantes, a que tem o elenco mais
espalhado pelo mundo. Os seus
jogadores estão dispersos por
12 diferentes países, incluindo
o natal. Fora os quatro que
atuam em Gana, os "Estrelas
Negras" assim se dividem: três
na Alemanha, três na Itália, três
em Israel, dois na Turquia, dois
na Dinamarca e um em Suíça,
França, Suécia, Holanda, Inglaterra e Sérvia e Montenegro.
A presença estranha em Israel, o que tem menos tradição
no futebol, pode ser explicada
pelas boas relações diplomáticas entre os dois países.
Na vitória sobre a República
Tcheca, o lateral Pantsil comemorou os gols de Gana exibindo uma bandeira de Israel, o
que causou revolta no mundo
árabe e gerou um pedido de
desculpas da federação ganesa.
Pantsil, um dos ganenses que
atuam no Oriente Médio, disse
que quis agradecer o apoio que
recebe dos israelenses.
Em Gana, utiliza-se a expressão "green pasture" para sintetizar os motivos de tamanho
êxodo. "Pasto verde". É um trocadilho envolvendo a erva que
alimenta o gado e a cor do dinheiro. Num país miserável,
com expectativa de vida de 58,8
anos e mais de 30% da população vivendo abaixo da linha de
pobreza, o futebol é uma das
poucas vias de ascensão social.
"Todos sabem que Gana está
cheia de talentos, e vão lá buscá-los. Os garotos, sem perspectiva nenhuma, ficam encantados e vão na mesma hora", diz
Robert Sackey, olheiro da seleção. "Se Freddy Adu recebe
US$ 1 milhão, você acha que ele
vai querer defender Gana só
por amor à camisa?", questiona, referindo-se àquele que é o
maior símbolo da diáspora.
O meia-atacante Adu impressionou o mundo ao assinar,
aos 13 anos, um contrato de
US$ 1 milhão com a Nike. Em
1997, ainda criança, ele deixou
Gana com a mãe e aterrissou
nos EUA. Hoje, é cidadão americano e defende a seleção do
país -mas, ainda com 16 anos
na época da convocação, ficou
fora do grupo que foi à Copa,
ironicamente eliminado na primeira fase pelos ganenses.
"Se o dinheiro for bom, eles
vão embora, não importa para
onde. Cara, eles vivem em Gana. Se oferecerem um bom salário para ir jogar na Lua, eles
nem pensam duas vezes", afirmou o torcedor Kwabena Adjei, ganense que vive nos EUA e
fazia plantão ontem no hotel e
que o time está em Würzburg.
A fuga em massa de jogadores de ponta não pode ser vista
simplesmente como efeito do
futebol quase amador de Gana.
Basta notar que, apesar do
fosso que os separa em termos
financeiros, Gana não está tão
distante assim da seleção, também ela uma reunião de craques que deixaram o país em
busca de mais dinheiro.
O Brasil de hoje é o mais "estrangeiro" da história das Copas -só 3 dos 23 jogadores
atuam no futebol do país.
Colaborou RODRIGO MATTOS ,
da Reportagem Local
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