São Paulo, Sábado, 24 de Julho de 1999
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FUTEBOL
Seleção de Luxemburgo inicia hoje luta pelo bi na Copa das Confederações com equipe 100% negra
Brasil "black power" pega a Alemanha

Ormuzd Alves/Folha Imagem
O atacante Ronaldinho, 19, segura bola durante treino da seleção brasileira em Guadalajara


FÁBIO VICTOR
enviado especial a Guadalajara

Pela primeira vez nos últimos 30 anos, talvez pela primeira vez na história, a seleção brasileira profissional entra em campo hoje com uma equipe titular formada totalmente por jogadores negros.
Ironicamente, o adversário do jogo das 14h (horário de Brasília), na abertura da Copa das Confederações, torneio que reúne os campeões continentais, é a Alemanha, uma das seleções mais "branquelas" do mundo.
Iniciada na Copa América, a tendência "black power" do time nacional foi consolidada pela saída do zagueiro Antônio Carlos, o único branco titular no torneio disputado no Paraguai, mas que pediu para não ser convocado para a competição no México.
Nas 16 Copas do Mundo que disputou, o Brasil jamais atuou com um time 100% negro. No Mundial de 90, na Itália, quando terminou em nono lugar, a pior colocação desde 66, nove brancos figuravam entre os titulares -o maior número em Mundiais.
Na última conquista, em 94, o time tinha seis negros e cinco brancos. No tricampeonato de 70, seis brancos e cinco negros.
Questionado pela Folha sobre a situação, o técnico Wanderley Luxemburgo inicialmente hesitou em responder. "É coincidência. Eu não quero entrar no mérito da discussão, senão você vai levar para a qualidade do negro e do branco. E tem espaço para todo mundo. Pelé, que é negro, foi o melhor do mundo, mas não podemos esquecer de Beckenbauer, Maradona, Zico, Cruyff..."
Depois, comentou as diferenças de desempenho esportivo entre as raças. "Claro que não é igual. Você não vê um nadador negro. Negro geralmente é mais velocista, tem mais força. Branco tem mais resistência. Isso já é da qualidade de cada um", analisou o técnico, ele próprio um mulato que usava cabelo "black power" nos tempos de jogador (hoje é alisado).
O zagueiro Odvan, cuja cor se distingue da dos demais titulares pela intensidade, diz não ter dúvidas de que a situação tem contribuído para a união da atual seleção brasileira.
"É bom a gente ver uma seleção só de escuros. A forte amizade que temos no grupo tem tudo a ver com isso. E é bom para tirar um pouco da discriminação que existe, mostrando que a cor negra ocupa espaço em qualquer lugar."
"Geralmente as pessoas escuras vêm de classe baixa. Conseguindo chegar à seleção, damos motivação para aquele jogador que está começando e vem de uma favela."
O lateral Serginho também mencionou a discriminação racial ao comentar a questão. "É meio chato responder, porque, no nosso país, existe mesmo preconceito. Mas, para mim, ter mais negros ou brancos na seleção é indiferente. Nunca discriminei ninguém", disse.
Morando na Alemanha, onde defende o Bayer Leverkusen, o volante e capitão Émerson disse que nunca teve problemas de discriminação no país, famoso pelos antecedentes históricos de intolerância racial.
Já para o volante Vampeta, recuperado de contusão no ombro direito, a tese da "união negra" defendida por Odvan está errada. Para o corintiano, "não quer dizer que, por todo mundo ser preto, o time é mais unido".
"O César e o Marcos são branquinhos, mas temos a mesma amizade. Aqui não é a Holanda", comparou, referindo-se aos conflitos raciais surgidos nos últimos anos no time europeu.
Dos 20 convocados por Luxemburgo, quatro são brancos: Marcos, César, Athirson e Roni.
Além da Alemanha, o Brasil pega, também em Guadalajara, Nova Zelândia e Estados Unidos, que jogam hoje entre si. No outro grupo, na Cidade do México, estão os anfitriões do torneio, Bolívia, Egito e Arábia Saudita.
Vencedora do último torneio, disputado em 97, na Arábia Saudita, a seleção brasileira luta agora pelo bicampeonato.


Colaborou Paulo Cobos, da Reportagem Local

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