São Paulo, terça-feira, 25 de junho de 2002

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1954

A Copa que reaparece

Alemanha, Brasil, Coréia do Sul e Turquia, os semifinalistas deste Mundial, repetem hoje muito do que o planeta viu há 48 anos, 12 Copas atrás, na Suíça, antes de surgir Pelé. Foi em 1954, no único Mundial em que os quatro times haviam disputados juntos antes desse. Luiz Felipe Scolari tinha só cinco anos. A Coréia vivia o rescaldo da maior guerra de sua história. O futebol turco engatinhava no segundo ano de sua vida profissional. E a Alemanha dividida enviava pela primeira vez uma seleção ao torneio -o time do lado ocidental.

PAULO COBOS
ROBERTO DIAS
ENVIADOS ESPECIAIS A SEUL

O Brasil de 1954 era um time que carregava o mesmo trauma da equipe de Rivaldo e Ronaldo.
Assim como agora, a derrota na final anterior deixara marcas profundas na seleção. Em um e outro caso, o uniforme simboliza as mudanças após a derrota.
Na derrota de 1950, colocou-se parte da culpa na cor branca da camisa, que teria dado azar. Na Suíça, o Brasil exibiu sua nova vestimenta, amarela.
Na derrota de 1998, o dedo foi apontado para a Nike, fabricante da camisa brasileira, que à época atuava como agente do time, organizando jogos e marcando compromissos publicitários. Antes de ir à Ásia, a seleção refez seu contrato com a empresa, que passou a se limitar ao fornecimento do uniforme.
Aquele Brasil de 1954 era uma equipe marcada por uma novidade, as eliminatórias, que a seleção disputava pela primeira vez. Algo que também é importante para esta seleção atual, para a qual as eliminatórias ficaram marcadas de uma forma bem mais traumática: o time fez a pior campanha de sua história.
Quem também sofreu nas eliminatórias foram os alemães, que só se classificaram na repescagem, de forma a chegarem a esta Copa desacreditados.
Contudo a Alemanha de 1954 sofrera do mesmo mal. Sem ter a confiança da torcida, surpreendeu o mundo ao avançar pela Copa, como este time do técnico Rudi Völler. Na Suíça, ao menos, o final foi feliz: os alemães saíram de lá campeões.
Já para a Turquia, a coincidência entre os protagonistas desta semifinal com o torneio de 1954 é ainda maior: ela teve confrontos diretos com dois deles.
A seleção turca tinha naquela época uma geração de jogadores que desfilavam pelo futebol italiano, o que também ocorre com o atual time, mas seu desempenho ficou longe do que alcançou a equipe que pegará o Brasil.
Sofreu duas goleadas diante da Alemanha: 1 a 4 na estréia e 2 a 7 na terceira e última partida. Entre um e outro revés, os turcos também aplicaram sua maior goleada, 7 a 0 na Coréia do Sul.
Os atuais donos da casa, aliás, têm muitos motivos para comemorar seu desempenho naquele torneio. Contudo na estréia, antes do 7 a 0 diante da Turquia, haviam sofrido outra goleada, ainda pior: 9 a 0 para a Hungria.
Em campo, Ferenc Puskas, o líder do time húngaro -que, coincidentemente, mais de 40 anos iria se tornar um dos apoiadores famosos da candidatura sul-coreana para receber o Mundial deste ano.
Naquele torneio de 1954, independentemente das goleadas, os sul-coreanos cumpriam um feito histórico, assim como agora.
Tornavam-se o primeiro time asiático independente a disputar o Mundial. Em 2002, o ineditismo está no fato de ter dado alguns passos adiante e ter se tornado o primeiro asiático a chegar à semifinal do torneio.
Mas uma história mostra bem a distância que separa esta Coréia de agora, que joga com um pressão gigantesca da torcida a favor, e aquele time de 1954.
A viagem da equipe para a Suíça demorou seis dias. Não havia vôos diretos, e o trecho foi cumprido por terra, trilhos, mar e ar.
Na parte final, alguns jogadores viajaram em um avião militar americano. Segundo relata o Comitê Organizador desta Copa, os assentos eram grandes demais para os pequenos sul-coreanos, e alguns jogadores não conseguiam nem mesmo colocar os pés no chão enquanto estavam sentados. O resultado foi que o time chegou exausto à Suíça, e ainda por cima na véspera de sua estréia na competição.
Ainda tiveram tempo de bater uma bola no jardim do hotel em que se instalaram, para sentirem algo a que não estavam muito acostumados: a grama.



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