São Paulo, domingo, 25 de junho de 2006

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Pátria de chuteiras começou em 1938, diz pesquisador

Era Vargas elevou o futebol a referência na identidade do Brasil, auxiliada pela seleção que no primeiro Mundial na França avançou até as semifinais

TALITA FIGUEIREDO
DA SUCURSAL DO RIO

Um dos maiores símbolos nacionais, a seleção brasileira começou a se tornar referência na identidade do país a partir de 1938. Em "A Invenção da Nação Canarinho", o pesquisador da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Carlos Eduardo Sarmento defende que a construção dessa referência se deu a partir de investimento do governo de Getúlio Vargas (1882-1954), no Estado Novo.
Segundo Sarmento, de 1914, com o primeiro jogo da seleção, até a Copa de 1938, não havia a caracterização da nacionalidade, por fatores como a disputa política no comando formal do futebol, entre cariocas e paulistas. Nessa época, também não estavam presentes jogadores mestiços ou negros.
"No início, o futebol era um esporte de elite, com times locais repletos de imigrantes europeus. Até havia negros e mulatos, mas eles não eram convocados, à exceção de Arthur Friedenreich, filho de alemão, mas que era mulato. No entanto ele disfarçava as características étnicas, alisando o cabelo e evitando tomar sol", disse.
Em sua pesquisa, Sarmento analisa a construção de um estado nacionalista na era Vargas.
"Essa política está diretamente ligada à construção do homem brasileiro, com um discurso de que a miscigenação é um fator positivo, que distingue o homem brasileiro dos outros. Além disso, o esporte é um fator de construção do homem novo. E o futebol começa a ganhar um contorno nítido de ser um esporte de massa, com muito apelo popular", falou ele.
É nessa época que negros começam a ser escalados, como Leônidas e Domingos da Guia, o que serve para atrair um contingente da população que antes via o futebol como meramente elitista. A partir daí, para o pesquisador, o futebol vira um canal de repercussão de discursos políticos e é eficaz para transmitir as mensagens.
Uma das primeiras e mais fortes atitudes do governo federal no controle da gestão do esporte, segundo Sarmento, é a ida de Luiz Aranha (irmão de Oswaldo Aranha, então ministro da Justiça) para a presidência da CBD (Confederação Brasileira de Desportos), em 1936, com interferência do governo.
Sem experiência prévia, ele era advogado e estava na vida política havia anos. Mas se tornou peça-chave de muitas das articulações que definiram a vida política da cidade do Rio de Janeiro nos anos 1930.
A filha de Getúlio Vargas, Alzira, torna-se então madrinha da seleção, tira foto com os jogadores. "Essa é uma demonstração de que o que está em jogo é o Estado brasileiro, e a imprensa passa a repercutir isso."
Essas decisões acabam por serem publicadas pela imprensa, e o governo federal paga para um locutor oficial transmitir os jogos em cadeia nacional. É feito, então, um investimento oficial pela primeira vez.
O Brasil ter chegado à semifinal em 1938 colaborou para que a seleção fosse identificada como símbolo nacional e consolidou o esforço feito pelo governo. O time acabou em terceiro lugar naquele Mundial.
Seguido de um longo período sem Copas, em 1950 o Brasil organiza e sedia o campeonato. "Nessa época, houve uma manipulação muito grande de forças políticas para se aproveitar do que representava a seleção. Na preparação da Copa, os políticos passam a freqüentar a concentração dos jogadores e a convidá-los para diversos compromissos sociais. Ali, a seleção já era uma marca", afirmou.


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