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São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2003

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Nascido na Barra da Tijuca, Gustavo Lima surpreende Mundial, implode sonho de heptacampeonato e arranha fama de imbatível do brasileiro

Português do Rio dorme no barco, mas afunda Scheidt

Jaro Muñoz/EFE
O iatista Gustavo Lima festeja o título mundial na classe laser


GUILHERME ROSEGUINI
DA REPORTAGEM LOCAL

Enquanto preparava o barco, Gustavo Lima pediu para seu técnico as vitaminas que toma antes de cada regata. Engoliu as cápsulas e seguiu para o mar. Era o líder da classe laser no Mundial de Cádiz, mas o hexacampeão Robert Scheidt estava na sua cola.
Sentiu cansaço e sono durante a etapa. Cochilou. À deriva, o barco esbarrou em uma bóia. O velejador caiu para a 20ª posição, recuperou-se, chegou em oitavo e manteve o primeiro posto.
Na praia, surpreso, foi explicar o mal-estar ao treinador. "Nunca tinha me sentido assim antes", contou. Em seguida, recebeu a explicação de Gonçalo Carvalho. "Já sei o que aconteceu. No lugar das vitaminas, acabei lhe entregando pílulas de calmante."
Lima confirmava o caso em meio a gargalhadas ontem. E tinha motivos para estar alegre. Após uma acirrada disputa, ele havia acabado com a hegemonia de Scheidt na laser, impedido um inédito heptacampeonato do brasileiro e conquistado o primeiro grande título de sua carreira.
"Se tivesse perdido, estaria chorando agora por causa do episódio do calmante [ocorrido na segunda-feira], que certamente teria me prejudicado. Mas tive sorte, e tudo deu certo para mim", afirmou Lima, 26, à Folha.
Ontem, pelo menos, a sorte realmente ficou do seu lado. Após liderar quase todo o torneio, ele deixou Scheidt ultrapassá-lo no penúltimo dia de provas. Na derradeira regata, estava fora do grupo dos cinco primeiros até os 200 m finais. Então, conseguiu pegar uma rajada de vento e completou a prova em terceiro. Scheidt, em 17º, acabou com a prata.
"Ele velejou muito bem. Para ser campeão, também é preciso sorte. Conheço o Gustavo há muito tempo, e o troféu está em boas mãos", disse o brasileiro, que tentava se isolar como o esportista mais premiado do país em mundiais -Guilherme Tâmega tem seis títulos no bodyboarding.
Lima realmente é habitué em torneios realizados no Brasil e mantém uma longo histórico de competições com Scheidt. Mas sua relação com o país vai além.
Ele nasceu no Rio, mais especificamente na Barra da Tijuca, em julho de 1977. Os pais, portugueses, depois de trabalharem em Moçambique, precisaram passar uma temporada no Brasil.
Com três meses, porém, Lima já foi para Portugal -ele não chegou a ser registrado no Brasil. Em Cascais, cidade perto de Lisboa, começou a velejar aos nove anos.
Assim como Scheidt, aprendeu as noções básicas no optimist, barco de 2 m para iniciantes. Com 17, resolveu se aventurar na laser.

Tabu quebrado
"Eu nunca havia vencido o Scheidt em uma competição de alto nível. Ele é muito forte e raramente dá brechas para os rivais. Fui muito bem nas primeiras regatas e abri vantagem. Foi o diferencial", contou Lima.
Após a premiação, sua memória trouxe à tona as lembranças do mundial de 2001. Na oportunidade, Scheidt havia ficado com o ouro, e Lima, com o segundo lugar. "Recordo que o Robert não havia dado chance a ninguém. Naquele dia, achei que ele era imbatível."
Agora, não acha mais. E pretende também atrapalhar as pretensões do brasileiro nos Jogos de Atenas, ano que vem. "Esse campeonato vai me dar muita confiança. Na Olimpíada, vou dar trabalho aos favoritos."
Em Sydney, o português não foi mais do que um espectador. Conseguiu apenas posições intermediárias nas regatas e assistiu à disputa pelo título entre Scheidt e o inglês Ben Ainslie. "Foi minha primeira Olimpíada e consegui um sexto lugar. Já dá para dizer que, em 2004, será diferente."
Atenas também é a prioridade de Scheidt, 30, daqui para a frente. A derrota na última regata do Mundial lembrou a de Sydney, quando o ouro também foi decidido nos momentos finais. Para vencer nos Jogos, ele sabe que não pode titubear. "Claro que isso tudo serviu de alerta, mas o torneio foi bom. Agora, vou levantar a cabeça e seguir em frente."


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