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São Paulo, quinta-feira, 25 de dezembro de 2003

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FUTEBOL

Longe e perto

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

Não é difícil pensar em futebol no Nepal. Em Pokara (a meia hora de vôo ou sete horas de ônibus de Katmandu), há um pedestal com um bola logo depois da saída do aeroporto.
A TV da pousada Nirvana exibe Índia x Nepal (vitória do Nepal nos pênaltis). O cardápio de um restaurante oferece Liverpool x Southampton para as 16h45, antes de uma sessão de "O Senhor dos Anéis".
O relato não é inédito, mas todo viajante atualiza por si mesmo a experiência dos anteriores: futebol é o mais eficiente e simpático passaporte para um brasileiro no exterior.
Conheço dezenas de histórias incríveis sobre momentos difíceis em guerras, alfândegas ou estradas desertas que foram apaziguados com a menção de Pelé, Romário ou Ronaldo (sem falar na famosa trégua na guerra civil da Nigéria para a passagem do Santos nos anos 60).
Na estrada empoeirada que conduzia a um monastério em Parping e às margens do lago Fewa, em Pokara, vi meninos com camisetas estampadas com o rosto de Ronaldo. Na parede de mercearias e joalherias, cartazes escritos em nepali comemoravam a vitória da seleção brasileira na Copa do Mundo de 2002. Um café chique em Tamel exibe fotos dos clientes assistindo à final diante da Alemanha.
Em uma escada de pedra inacreditável que corta dezenas de pequenas propriedades na encosta do pico Sarangkot, despencando entre casas simples e plantações em terraço, tive de dar passagem para um menino de seus 13 anos que tocava um pequeno rebanho morro acima. Ao passar por mim, ele perguntou: "Where from (sic)?". "Bresil." "Ronaldo...", disse ele, sem se deter nem olhar para trás.
Há quem diga que o futebol é uma ruína, uma praga e até um atraso. Que ele cria a discórdia e a violência, o fanatismo, a alienação. Claro que eu não concordo com isso.
Futebol é um traço da nossa cultura, forte e belo.
Somos artistas da bola; somos os bons nessa arte/nesse ofício. Somos simpáticos para o mundo pela felicidade que as nossas seleções já proporcionaram aos torcedores de todo lugar.
Pena que tratamos mal a nossa especialidade.
Comparado com outros países pobres, o Brasil é rico em muitas coisas. Os nossos aeroportos, as nossas avenidas, os nossos museus e shopping centers, os nossos cinemas e governos são luxuosos perto do que há por aí. Mas os nossos estádios são feinhos, pobrinhos, imundos. Alguns são um pouco melhores, mas a regra é a feiúra. Quem diria... No futebol, somos atrasados.
Não se vêem por aqui camisas de clubes brasileiros. Vi do Manchester United e do Real Madrid. Será que um dia conseguiremos transferir esse amor pela seleção brasileira para os nossos times? Com os nossos ídolos internacionais na Europa, talvez não.
Ai, Brasil... Tem um tanto a ensinar, outro tanto a aprender.
Bola para a frente.

Pense bem
Se o atleta recebe proposta para jogar na Europa, deve lembrar casos como o do Deivid. Pelo que dizem, ele não foi feliz na França. Ao que tudo indica, poderia ter fechado o ano no Brasil tão feliz como começou.

Contrastes
Não é difícil mandar uma coluna do Nepal. Há "internet cafés" nos becos mais apertados, a preços baixíssimos. A conexão não é das melhores, mas o serviço é acessível. Em compensação, um jogo oficial entre dois times daqui aconteceu em um campo em que uma das traves era pintada na parede.

Outro mercado
Podemos ter ainda mais filmes, livros e revistas sobre futebol. Histórias não faltam!

E-mail soninha.folha@uol.com.br

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