São Paulo, sábado, 26 de março de 2005

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MOTOR

Farofa de borracha

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Sábado passado. Barrichello acabara de ficar em 14º no primeiro treino classificatório em Sepang. Pergunto qual havia sido a influência dos pneus naquele resultado. O brasileiro responde.
Anteontem. Abro a "Austosport", uma entrevista com Schumacher. O repórter começa perguntando se os pneus foram os responsáveis pela prova apagada na Malásia. O alemão responde.
"Seria errado procurar um culpado agora. Quando ganhamos, ganhamos juntos. Quando perdemos, perdemos juntos. Não existe um problema específico", foi a resposta de Barrichello, acabo de buscar na gravação. Foi essa, também, a réplica do heptacampeão, constato na revista que está nas minhas mãos. Mudam uma palavra ou outra, fica a essência.
Esta coluna já discorreu sobre a chatice das entrevistas da F-1 em tempos de megacorporações. Para evitar melindres, para prevenir que críticas cheguem a sensíveis ouvidos de um CEO do outro lado do mundo, a categoria vem, mais e mais, adotando discursos insossos, padronizados, pasteurizados.
Mas a sintonia das aspas de Barrichello e Schumacher, com mais de 24 horas de diferença, é de espantar. Fico imaginando a reunião com Todt após os primeiros treinos livres na Malásia.
"Bien, bien... Vamos dançar neste fim de semana, não vai ter jeito, os pneus estão une merde nesse calor. Mas não saiam falando isso. Vamos dizer o seguinte..."
Depois de decorar a cantilena, a dupla de pilotos saiu, destemida, para enfrentar os microfones.
Brincadeiras à parte, não deve ter fugido muito disso. Que houve um orientação, é óbvio ululante.
O porquê de todo esse cuidado? Porque, além do dinheiro pesado que une as duas marcas, a Ferrari sabe que vai depender muito da Bridgestone, mais do que nunca, para se reabilitar no campeonato. E porque admitir erros é algo que também não existe mais na F-1.
A escuderia assumiu um risco grande quando decidiu ficar com os japoneses apesar da debandada geral em direção à Michelin.
Agora, pode quebrar acordos de cavalheiros, pode instalar refletores em Fiorano e Mugello, varar noites testando que não conseguirá se aproximar da quilometragem que os franceses acumulam com Williams mais McLaren mais Renault mais BAR mais Red Bull mais Toyota mais Sauber.
É um princípio do automobilismo: de nada adianta um motor fantástico se os pneus não transferirem potência para o asfalto. No caso de Sepang, os cavalos italianos viraram farofa de borracha, enquanto os concorrentes galoparam para um dia de glória.
Dizem que, no F2005, esses mesmos compostos fazem maravilhas. Não duvido, a Bridgestone tem crédito, esperemos o Bahrein.
Mas e se as maravilhas não forem suficientes para descontar os 2s2 que Barrichello levou do Alonso no domingo de manhã?
Aí é que mora a diferença para 2003, quando a Ferrari também perdeu os primeiros GPs: agora, o isolamento com a Bridgestone parece ter chegado ao limite.
Organizada às pressas, a padronização dos discursos indica que a Ferrari não estava preparada para cair. Mas a queda começou.

Picadinho
Os bancos aceitaram sentar com Ecclestone, fora da Corte, para negociar. É bem capaz que comprem os 25% restantes da F-1 e que saiam da reunião sorrindo com a simpatia do novo parceiro.

Mexido
Stewart chegou à Williams como relações-públicas do Royal Bank of Scotland, mas pouco a pouco vem sendo chamado para dar pitacos na equipe. Os resultados não vão demorar a aparecer...

Pepino
Anote para cobrar depois: Villeneuve não chega ao meio da temporada. Se entrar no cockpit, Wurz, 1,86 m, será seu substituto. O desempenho do canadense, até agora, é indefensável. E inexplicável.

E-mail fseixas@folhasp.com.br


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