São Paulo, sexta-feira, 26 de maio de 2006

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XICO SÁ

"Desafio ao Galo" globalizado

De acordo com o manual do secador na Copa, argentinos, ingleses, italianos, alemães e até brasileiros que se cuidem

AMIGO TORCEDOR, amigo secador, acaba de sair o nosso manual de procedimento e conduta para a Copa do Mundo. Uma vez que essa espécie de "Desafio ao Galo" globalizado -com o devido perdão aos bravos senhores que organizam o tradicional torneio varzeano de SP- é inevitável, inevitável mesmo, só nos resta preparar os nossos vodus e afinar o nosso coro dos contrários. Como ficaremos mesmo sem os belos jogos da aldeia, estes embates que tornam os nossos espíritos mais livres e universais, que sequemos as grandes potências. Desde a noite de terça-feira, quando viu o belo 0 a 0 de Remo x Náutico, o meu corvo Edgar, mais novo e estimado pestilento lá de casa, começou a guardar as suas forças para a partida Alemanha x Costa Rica, já na abertura da festa no Estádio Olímpico. Secar os donos da casa é o primeiro dos nossos mandamentos na Copa do Mundo. Mas o melhor dos gozos de um secador tarado seria ver o 1 a 0, com gol de mão aos 49 minutos do segundo tempo, de Trinidad Tobago sobre a Inglaterra. Danem-se seus hooligans! No mesmo Grupo B, embora não seja propriamente uma zebra, torcemos pelo triunfo dos irmãos paraguaios. Secador que é secador devota-se à pátria que o embriaga com os mais animadores dos uísques falsos. A Costa do Marfim batendo a empáfia Argentina também seria uma beleza. Sonha macaco, diriam eles para nosotros. No Grupo D, o nosso código de etiqueta recomenda Angola, claro, afinal de contas chegou a hora de um africano levantar a taça. E que Portugal e Felipão voltem chorando as pitangas por mares nunca dantes navegados. Outro jogão que o corvo Edgar mira ao longe, avistando nuvens de agouro sobre as tradicionais cantinas de São Paulo, é Itália x Gana. "Se liga nesta parada, meu amado dono", grasna o desgraçado, com a sua prosódia de mano corintiano. Com o seu bico afiado de rapina, Edgar aponta na tabelinha colada na geladeira o dia 13 de junho do ano da graça de 2006: Brasil x Croácia, 16 horas. "Chupa, Zagallo", corveja o malcriado. Mas Edgar não é tão antipatriótico assim, afinal de contas não passa de um brasileiríssimo urubu da caatinga, que se autodenomina corvo por gostar de Edgar A. Poe e suas histórias extraordinárias, coisas que leio para niná-lo nas piores noites de pânico em São Paulo. Ele não engole é o Zagallo e as superstições babacas. Tolera o Carlos Alberto Parreira até os cinco minutos do segundo tempo... mas, quando vê que a teimosia burra se repete, esquece, torce contra mesmo, até pelos argentinos. Ainda mais agora, que morre de amores pelo Carlitos Tevez. O corvo teme que o Brasil não passe da primeira fase, vê se pode uma previsão tão funesta! Ele narra um pesadelo para os canarinhos: a seleção entrará em campo carecendo de uma vitória simples contra os japoneses. Aí caberá ao destino, ah, o destino, fazer de Zico novamente o "culpado" por uma tragédia. O time asiático treinado pelo Galinho arrancará um empate histórico e irá tirar da Copa os "mercenários", como a minha ave agourenta trata os possíveis heróis do hexa. E no Grupo H, Edgar? O nosso quixotesco recomenda a Tunísia. E que os espanhóis percam até o rumo de casa e nunca mais acertem sequer o caminho de Santiago.

@ - xico.folha@uol.com.br


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