São Paulo, quinta-feira, 26 de agosto de 2004

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Corrente migratória

Quadro de medalhas comprova que importar atleta às vezes é vantagem

MARCELO DIEGO
ENVIADO ESPECIAL A ATENAS

A australiana Loretta Harrop liderou a prova de triatlo até quase o final, ontem, mas foi ultrapassada de forma impressionante pela sua compatriota Kate Allen nos metros derradeiros. Não só a atleta perdia o ouro, mas também seu país. Motivo: Allen ficou com o primeiro lugar defendendo as cores da bandeira austríaca.
A campeã nasceu em Geelong (Austrália) em 70, casou-se com um austríaco, adquiriu nova cidadania e passou a competir em 96. Ontem, cumpriu 1.500 m de natação, 40 km de ciclismo e 10 km de corrida menos de sete segundos à frente de Harrop. Foi o primeiro ouro austríaco em Atenas-2004.
O fenômeno não é inédito, em uma Olimpíada recheada de casos de atletas nascidos em um país competindo (e ganhando medalhas) por outro.
Amanhã, o Brasil estará representado no pentatlo moderno por Samantha Harvey, que nasceu em Nova York e representou os EUA no Pan-99. Logo depois, ela se casou com um brasileiro, adquiriu nova cidadania e faz parte da delegação nacional na Olimpíada.
"Agradeço ao Brasil por me dar a oportunidade. Ganhar uma medalha em um evento internacional é meu maior sonho, e essa foi uma chance que meu próprio país [os EUA] me negou", diz Harvey.
No Centro Olímpico de Schinias, hoje, a canoagem brasileira estará representada nas semifinais da K2 500 m com Sebastián Cuattrin (nascido na Argentina) e Sebastian Szubski (nascido na Polônia). Cuattrin mora no Brasil desde os cinco anos.
Já Szubski viveu ainda por seis anos em Portugal antes de desembarcar em solo brasileiro.
Pelas regras do Comitê Olímpico Internacional, para um atleta trocar de bandeira ele precisa ter a nova cidadania reconhecida e passar por um "pedágio" de três anos sem disputar eventos no exterior. Mas há casos como o de Israel, que mandou uma delegação de 36 atletas para a Grécia -45% deles nascidos em outras partes do mundo.
Mas todos os esportistas se mudaram para o país ainda adolescentes e desenvolveram habilidades esportivas lá, diz o chefe de delegação israelense, Efraim Zinger. "Em Israel, nós lidamos com algumas questões sobre nosso passado e nossa existência. O esporte é uma ótima chance de reunir nosso povo."
Em sentido oposto vai Rami Zur, que nasceu em Israel, mas também tem cidadania americana. Em Sydney, ele defendeu cores israelenses. Hoje, atuará pelos EUA na semifinal da canoagem. "São os países que mais amo."
No caso de Francis Obikwelu, que defendeu seu país de origem em Sydney, a causa para trocar de nacionalidade foi o desamparo. Ele não aprovou a forma (negligente, diz ele) com que o comitê nigeriano tratou de uma contusão sua. Morando e treinando em Lisboa, adotou as cores de Portugal.
Conquistou, pelo novo país, a prata nos 100 m rasos e hoje disputa a final nos 200 m rasos.
A Suécia ganhou uma prata ontem pelas mãos de um armênio. Ara Abrahamian foi o primeiro na luta greco-romana, categoria 84 kg. Ele competiu pela Armênia até 98, quando trocou de cidadania. Sua motivação foi financeira.
A atração pelo dinheiro também inflou a equipe do Qatar. País rico pela exploração de petróleo, foi buscar levantadores de peso búlgaros e corredores quenianos para representá-lo. Angel Popov, do levantamento de peso, por exemplo, chegou à Grécia atendendo pelo nome de Asaad Said Saif Asaad. A estratégia, porém, ainda não rendeu pódio.


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