São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2000

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FUTEBOL

Contra fatos há argumentos

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

No futebol brasileiro, progressivamente houve aumento do número de faltas e da violência. Na quinta-feira, Grêmio e Ponte Preta cometeram 74 faltas. A média está em torno de 55 por partida. Recorde mundial.
Não há mais faltas porque não existe mais tempo e espaço.
Fato absurdo.
Na Copa João Havelange, o limite para a suspensão do jogador passou de três para cinco cartões amarelos.
Outro fato absurdo.
As estatísticas mostram que os times que fazem mais faltas têm mais chances de vencer.
Triste fato.
As equipes que cometem mais faltas são as mais modestas individualmente. Também é fato.
Os treinadores pensam somente em ganhar. Não importam os meios. É fato.
A falta de punição aos jogadores e às equipes e a permissão da regra facilitam a vitória dos times mais faltosos. Mais um fato.
Todos os times e técnicos brasileiros (há exceção?) adotam o estilo de parar as jogadas. É fato.
Contra fatos, há argumentos.
Esse estilo legal, "vitorioso" e aético retirou a alegria e beleza do espetáculo. Também é fato.
Os jogadores brasileiros confundem desarmar com fazer faltas. Não sabem se antecipar. Atropelam o adversário.
Quando atuam no exterior ou na seleção brasileira, sentem-se inibidos. Mais um fato.
A preocupação excessiva em parar as jogadas também inibe a criatividade. Em vez de jogar no próprio acerto, atuam no erro do outro time. Outro fato.
No fritar dos ovos, a postura legal facilita a vitória, mas destrói o futebol. Fato preocupante.
O futebol brasileiro não acompanhou a tendência mundial de respeitar o adversário. Confundimos garra e marcação com violência. Mais um fato.
O cronista esportivo não pode ser conivente com essa situação. Nosso olhar tem de ser crítico e de valorização da beleza do espetáculo.
Não podemos ter o olhar utilitarista do técnico que quer ganhar de qualquer jeito. Até cuspindo no adversário.
Por causa desses e de outros fatos, o futebol piorou.
O fato é inquestionável.

 

Enquanto a seleção brasileira não tem tática, elenco e time definidos, Argentina, França, Holanda, Itália, Espanha e outras seleções já estão praticamente definidas para a próxima Copa.
A Argentina é a equipe mais ofensiva do mundo. Em casa ou fora, como no último jogo contra o Chile, pressiona o adversário com o mesmo desenho tático, independentemente dos jogadores escalados.
O time joga com três zagueiros (varia o que sobra), outra linha de três armadores e com um meia na ligação entre o meio-campo e os três atacantes. Desses, são dois pelas laterais, atuando como os antigos pontas, e um fixo pelo meio.
Nenhuma outra seleção atua assim. As que jogam com três zagueiros utilizam tradicionais laterais na função de alas.
A Argentina coloca armadores nessa função. As jogadas ofensivas, pelas laterais, são feitas pelos atacantes ou pontas.
Os três armadores participam das jogadas ofensivas. Quando a equipe ataca, somente os três zagueiros ficam em seu campo. São sete no ataque.
Para os técnicos e apaixonados pelos números, seria um 3-3-1-3. Na verdade, o desenho tático só existe quando os jogadores estão estáticos antes do chute inicial.
Quando a bola rola, os jogadores não param de correr, para o desespero dos técnicos. Estão vivos. Tudo o que foi planejado fica em segundo plano.
O mistério, o imponderável e a individualidade assumem o comando da partida.
A seleção brasileira também precisa inovar. Qualquer adversário sabe que os laterais vão apoiar e os volantes marcar.
Na Europa, Cafu, Júnior e Serginho atuam na função de alas e não de laterais. Antônio Carlos e Roque Júnior jogam no esquema com três zagueiros. Na seleção, sentem dificuldades.
O esquema com dois zagueiros, dois laterais, dois armadores defensivos, dois ofensivos e dois atacantes está muito simétrico, manjado e burocrático.
Leão precisa sacudir a equipe. Anarquizá-la, para confundir o adversário.
Além das estratégias argentinas e brasileiras, pode-se atuar de inúmeras maneiras: com três zagueiros e dois alas; um volante e três meias; com pontas; três, quatro ou cinco atacantes, como queria o Matinas Suzuki; um na defesa e dez no ataque, como sonha o Chico Buarque e de outras formas.
Não sei qual é o melhor esquema. Todos têm virtudes e defeitos. Prefiro o que vence e brilha.
Viva a diferença! Abaixo à mesmice.


E-mail tostao.folha@uol.com.br


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